- Em virtude da sua baixa emissão de carbono e de aplicabilidade em indústrias com alto consumo energético, o hidrogênio verde é uma das principais apostas do mercado
- No Brasil, empresas listadas na Bolsa têm investido nesta solução com o objetivo de conquistar espaço neste mercado que segue em ascensão
- Apesar do potencial, os analistas apontam que a solução do H2V ainda enfrenta alguns desafios, como o alto custo de produção
O ponta pé inicial já foi dado. Em janeiro deste ano, a EDP Brasil (ENBR3) lançou o projeto-piloto da sua usina de produção de hidrogênio verde (H2V) no município de São Gonçalo do Amarante, no Ceará, após investir R$ 42 milhões. No entanto, essa iniciativa não é a única do mercado brasileiro. Outras companhias, como a Unigel e a Raízen (RAIZ4), seguem de “olho” na demanda que o H2V pode conquistar nos próximos anos.
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Chamado de “combustível do futuro”, o hidrogênio verde tem sido visto como uma das apostas de soluções de baixo carbono encontradas pelo mercado devido a sua aplicabilidade em indústrias com alto consumo energético. Quando o assunto é energia limpa, o H2V ganha relevância e as projeções apontam para uma demanda expressiva ao longo dos próximos anos.
Já na ótica do investidor, a temática pode representar retornos financeiros atrativos à medida que as projeções das companhias produtoras desse combustível apontem para um crescimento de receita no longo prazo. De acordo com uma pesquisa da McKinsey & Company, consultoria empresarial norte-americana, o H2V deve criar uma oportunidade de investimento de US$ 200 bilhões no mercado brasileiro em 20 anos (2020 – 2040).
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O alto volume de recursos no País se deve a uma posição geográfica vantajosa do Brasil em relação a outros mercados, como Chile e Estados Unidos. Por essa razão, o País pode se tornar um dos líderes mundiais na produção de hidrogênio verde. A estimativa é que, em 2040, a demanda por hidrogênio verde movimente no mercado brasileiro entre US$ 15 bilhões e US$ 20 bilhões. Desse total, cerca de R$ 12 bilhões de toneladas devem vir do mercado doméstico, enquanto o restante da Europa e dos Estados Unidos.
“Estruturas como o Polo Petroquímico de Camaçari (BA), o Porto do Pecém (CE) e o Porto de Açu (RJ) possibilitam a implantação de hubs de produção e exportação de hidrogênio verde, com distância de embarque relativamente próxima aos portos europeus”, afirma Paulo Alveranga, CEO da thyssenkrupp para a América do Sul. A companhia é uma das responsáveis pelo fornecimento de tecnologia para a produção de hidrogênio verde no mundo.
Apesar das projeções atrativas para o combustível do futuro, a demanda e a produção enfrentam alguns desafios, sendo o maior o custo de produção. “Atualmente, as empresas gastam em torno de US$ 5 a US$ 6 para produzir um kg de hidrogênio verde por meio de energia renovável, enquanto o custo para produzir hidrogênio verde por meio meio de combustível fóssil fica em torno de US$ 1 a US$ 3″, afirma Maria Paula Cantusion, head de ESG da equipe de research do Santander. O outro entrave é a logística para a exportação.
No entanto, há algumas saídas para “driblar” essas barreiras. Uma delas está na “taxação de carbono” que segue sendo defendida por alguns governos, em especial, os da Europa. Por lá, os países membros da União Europeia (UE) propõem o mecanismo de ajuste de fronteira de carbono (CBAM) que consiste na cobrança em cima de pegada de carbono do processo produtivos de alguns bens importados. Neste caso, o hidrogênio verde produzido a partir de energia renovável segue mais competitivo.
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No Brasil, ainda não há políticas semelhantes que possam trazer algum benefício para esse mercado. Por outro lado, Paulo Leme, sócio do Dias Carneiro Advogados, acredita que, no curto prazo, o mercado doméstico deve ter um plano de metas que possa incluir incentivos fiscais voltado para a produção e utilização do combustível “verde”.
“O governo pode estabelecer que 50% do hidrogênio utilizado no Brasil deve ser verde, por exemplo. Isso é uma meta. Então, o mercado vai ter um direcionamento mais definido para alcançar essas metas”, cita Leme.
De olho na demanda futura
Os desafios não intimidam as companhias que decidiram apostar na produção de H2V. De olho na demanda que deve surgir nos próximos anos, as empresas seguem colocando em práticas os projetos voltados para a produção em larga escala do novo combustível. Em janeiro deste ano, a EDP Brasil lançou o seu projeto-piloto de produção de hidrogênio verde no Porto do Pecém, em São Gonçalo do Amarante, no Ceará. O investimento para essa empreitada foi de R$ 42 milhões.
“O Ceará reúne características estratégicas para protagonizar o processo de introdução do hidrogênio verde no País, seja pelo operacional solar e eólico (mecanismo fundamental para a produção do gás de forma sustentável) seja por sua localização e oferta de infraestrutura para o escoamento desse produto ao mercado internacional”, disse João Marques da Cruz, CEO da EDP no Brasil, em evento de inauguração da unidade.
O protótipo possui uma usina solar com capacidade de 3 megawatts pico (MWp) para a produção do gás a partir de energia renovável e um módulo eletrolisador para a produção do combustível. A meta da companhia é concluir todo o seu projeto em junho de 2024 para que a geração de H2V possa ser de larga escala. “O nosso foco é aprimorar o processo de geração, avaliar modelos de negócio, expandir a produção e estabelecer parcerias estratégicas com diferentes segmentos da indústria que podem utilizar o gás”, destacou.
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A Unigel também está nesta corrida. Segundo a agência Reuters, a empresa anunciou que irá investir US$ 1,5 bilhão em seu complexo na Bahia para a produção do combustível. Em julho do ano passado, a companhia fechou um contrato com thyssenkrupp. O projeto ficará localizado no Polo Industrial de Camaçari, na Bahia. Nesta primeira fase, a unidade terá a capacidade de produzir 10 mil toneladas/ano e de 60 mil toneladas/ano de amônia verde (estado líquido do H2V).
A previsão é quadruplicar essa produção até 2025. No entanto, a companhia estuda opções de levantar recursos que possam viabilizar o aumento da produção para esse patamar. Uma das alternativas citadas por Luiz Felipe Fustaino, diretor executivo da Unigel, em entrevista à Reuters no mês de janeiro, era por meio de um IPO (oferta pública de ações).
Onde investir?
Os aportes realizados pelas companhias para a construção de usinas, além das projeções para a demanda futura desse combustível, sinalizam uma oportunidade ao investidor. De acordo com a XP, além da EDP Brasil, as ações da Raízen (RAIZ4) e da AES Brasil (AESB3) podem ser uma alternativa interessante para quem busca se posicionar nas melhores empresas alinhadas a esse investimento. Na visão dos analistas da corretora, esses papéis lideram as iniciativas voltadas para a produção do H2V no País.
“Apesar de seu recente IPO (2021), a Raízen permanece como um dos poucos nomes que permite aos investidores uma exposição ao processo de transição energética em curso a nível mundial. Através do seu negócio de distribuição de combustíveis ainda é responsável pela maior parte dos resultados da empresa”, informaram os analistas em relatório publicado em 24 de janeiro.
Já em relação a AES Brasil (AESB3), a XP destaca que a companhia também segue interessada nos estudos para a construção de uma usina de hidrogênio verde no complexo do Pecém, no Ceará. “A empresa pretende usar o terminal cearense para escoar sua produção principalmente para países europeus e, dessa forma, contribuir com seu objetivo de descarbonizar a matriz energética mundial”, diz outro trecho do relatório.
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Outras companhias também devem ser impactadas indiretamente com esses investimentos. Como a produção de hidrogênio verde exige matriz energética renovável, como a solar e eólica, Cantusion acredita que as ações da Cesp (CESP6), Ômega (MEGA3), Aeris (AERI3) e Weg (WEGE3) podem se beneficiar desse movimento e, por isso, devem estar no radar dos investidores.
No entanto, os aportes não devem ser baseados apenas nos números das projeções. É preciso ficar atento aos desdobramentos do mercado, em especial, no campo político em relação aos possíveis incentivos fiscais e planos de metas. “Como em toda tecnologia em fase inicial de apresentação, esta incerteza na viabilidade financeira dos projetos é um dos maiores riscos que um investidor deve avaliar”, diz Rafael Campos, gestor de portfólio da Vox Capital. O alerta serve tanto para as ações das companhias, quanto para os fundos posicionados nesta tecnologia.
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