A Azul está próxima de assinar um acordo com a controladora da Gol. A medida prevê a fusão entre Azul (AZUL4) e Gol (GOLL4), diz reportagem do Valor Econômico publicada na noite desta quarta-feira (8). Analistas do mercado financeiro divergem sobre o quão positiva essa fusão seria para as duas empresas.
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Procuradas pela reportagem, a Azul e a Gol disseram que não vai comentar o assunto. Conforme o jornal, o modelo que está sendo negociado na fusão é de uma corporation, ou seja, sem um controlador definido. As duas marcas continuariam a ser utilizadas, como no caso da Avianca e Gol. Outra possibilidade seria a formação de uma joint venture.
Por ora, o que se tem de oficial é um memorando de entendimento, o qual é um contrato preliminar para alinhar as expectativas dos negociadores. Felipe Sant’ Anna, especialista em mercado da mesa proprietária Star Desk, comenta que a fusão é mais positiva para a Gol por estar em uma situação de recuperação judicial. Ele lembra que a Azul atravessou essa fase de recuperação judicial na pandemia, mas que conseguiu se reestruturar.
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“Infelizmente o setor aéreo é muito instável, visto que a receita é em reais por operarem no Brasil e as despesas são em dólar, com exceção da folha de pagamento. Outro ponto é que os órgãos reguladores dificilmente vão aprovar a fusão, visto que uma única companhia seria dona da maioria da malha aérea brasileira”, aponta Sant’ Anna.
Na visão de Artur Horta, especialista da GTF Capital, a fusão entre as empresas aéreas é positiva para as duas, visto que elas teriam uma grande malha aérea e um potencial de crescimento de receitas. Já Max Mustrangi, especialista em reestruturação de empresa e CEO da Excellance, o investidor deve tomar muito cuidado. Isso porque ambas as companhias não estão em uma boa situação financeira e a fusão pode impressionar o mercado com números exuberantes.
“Com a fusão, teremos uma empresa com mais ativos. Assim, fica mais fácil para o mercado ‘vender’ essa notícia como algo positivo para os investidores. No entanto, as pessoas esquecem que o endividamento também soma, ou seja, os problemas das empresas vão continuar. Então, o investidor deve tomar cuidado”, afirma Mustrangi. A dívida da Azul encerrou o terceiro trimestre de 2024 em R$ 30,2 bilhões, enquanto a Gol encerrou o período com uma dívida bruta de R$ 29,4 bilhões. Somando ambas as dívidas, a empresa teria um endividamento de R$ 59,6 bilhões.
Sobreposição de rotas é um fator importante na fusão entre Azul e Gol
Analistas da Genial Investimentos destacaram que, em conversas com a Azul em 2024, eles levantaram a questão da sobreposição de rotas, o que pode ser a primeira pequena barreira a ser superada. Os especialistas afirmam que, embora as rotas das duas companhias não sejam as mesmas, muitas vezes operam em aeroportos próximos ou em regiões adjacentes.
Os analistas comentam que AZUL4 tem uma presença significativa em aeroportos secundários, enquanto a GOLL4 opera em aeroportos principais. No entanto, esses aeroportos servem frequentemente às mesmas áreas metropolitanas ou regiões geográficas, criando uma sobreposição indireta de rotas. A equipe aponta ainda que essa sobreposição pode aumentar dependendo do raio de atuação considerado para cada aeroporto.
“Se incluirmos destinos próximos ou adjacentes, a sobreposição de rotas entre Azul e Gol se torna mais evidente. Em 2023, a Gol possuía cerca de 38% do market-share no Rio de Janeiro, sendo 40% no Santos Dumont e 34% no Galeão. Enquanto em São Paulo, essa fatia representava 36% da capacidade, sendo 31% em Guarulhos e 43% em Congonhas. Em comparação, a presença da Azul era de apenas 19% no Rio e 9% em São Paulo, sendo 6% no Galeão, 25% no Santos Dumont, 11% em Congonhas e 7% em Guarulhos”, dizem Ygor Bastos e Nicollas Thisted, que assinam o relatório da Genial.
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Já os especialistas do BTG Pactual ponderam que essa sobreposição de rotas é mínima. Eles afirmam que a Gol se concentra mais em Congonhas, Santos Dumont e Brasília (os principais hubs corporativos do País), enquanto a Azul estende a maioria de sua linha pelo interior. “Portanto, a combinação das rotas pode criar ganhos de conectividade. Além disso, há valor em expandir o programa de milhagem e criar ofertas combinadas para passageiros frequentes”, dizem Lucas Marquiori e Fernanda Recchia, que assinam o relatório do BTG.
Analistas da Ágora Investimentos e Bradesco BBI lembram que, para a fusão acontecer, o primeiro passo seria a Gol sair da recuperação judicial nos EUA, conhecida como chapter 11. Em novembro, a empresa disse que tinha fechado um acordo para sair da recuperação judicial e estimava sua saída de vez em abril de 2025.
“Caso a companhia continue em recuperação judicial, a Azul precisa aguardar os procedimentos legais para apresentar uma proposta a todos os credores. Os preços atuais das ações da GOL e da Azul não afetam as negociações, pois não representam o valor justo de suas operações”, apontam Victor Mizusaki do Bradesco BBI, Wellington Lourenço e Larissa Monte da Ágora Investimentos.
Empresa sem controlador seria positivo para investidor pessoa física
Um consenso entre os analistas é que a falta de um controlador, com a empresa sendo uma corporation, é o melhor para o investidor pessoa física. Para Horta, da GTF Capital, os controladores das duas empresas mostraram que não conseguiram ter uma boa administração em relação ao cenário turbulento da economia brasileira.
“Sendo assim, os acionistas em geral terão poder para guiar a empresa, ao invés de apenas uma pessoa, que pode estar com conflito de interesses e outras coisas. Por isso, esse modelo é melhor para o investidor pessoa física, visto que ele terá voz ativa na companhia”, argumenta Horta.
Já Max Mustrangi, da Excellance, revela que esse não é um modelo que deu certo no Brasil nos últimos anos. Ele reforça o caso do Grupo Casas Bahia, que após ficar sem um controlador, entrou em uma situação financeira complicada e hoje passa por uma reestruturação em busca de voltar a dar lucro.
O investidor deve comprar as ações da Azul e da Gol?
A maioria dos analistas possui uma clara preferência pela Azul, enquanto outros dizem que o investidor não deve ter nenhum dos ativos pela difícil situação das duas empresas. Segundo Horta, como a fusão entre Azul e Gol está encaminhada, é indiferente ter qualquer uma das duas ações, visto que ambas as companhias vão virar uma só. No entanto, enquanto a fusão não se concretiza, ele prefere a ação da Azul, simplesmente pelo fato dela ter mais liquidez, ser mais fácil de vender no mercado.
No caso da Ágora e do Bradesco BBI, a recomendação é de compra para Azul, com preço-alvo de R$ 20 para o fim de 2025, uma possível alta de 375,1% na comparação com o fechamento de quarta-feira (8), quando a ação encerrou o pregão a R$ 4,21. Em relação à ação da Gol, a recomendação é de venda com preço-alvo de R$ 0,90, queda de 41,9%.
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A Genial Investimentos é mais cautelosa. Os analistas possuem recomendação neutra para a Azul, com preço-alvo de R$ 17,00, salto de 303% em relação ao fechamento de quarta-feira (8). Já para a Gol a recomendação é de venda, com preço-alvo de R$ 1, queda de 35,48% na comparação com o fechamento de quarta-feira.
Felipe Sant’ Anna, da Star Desk, diz que o investidor deve ficar de fora do setor aéreo, visto que ambas as empresas são arriscadas e podem trazer prejuízos significativos. Além disso, com base nas preferências de todos os analistas, que recomendam venda para a Gol, o investidor deve tomar cuidado com a empresa que deve surgir após a fusão entre Azul (AZUL4) e Gol (GOLL4), visto que metade dela será a Gol. Sendo assim, o ideal é tomar cuidado com o ativo e investir na companhia se o perfil for de grande apetite ao risco.