“Golpes estão levando consumidores de volta ao varejo físico na Black Friday”, diz CEO do Reclame Aqui
Sofisticação das fraudes digitais aumenta a cautela do público e pressiona o e-commerce em meio à disputa por vendas em uma das datas mais importantes do varejo
Edu Neves - Diretor Executivo da plataforma Reclame AQUI desde 2009. (Imagem - Assessoria)
Às vésperas da Black Friday, o varejo brasileiro se movimenta para uma das datas mais importantes do ano em um ambiente marcado por mudanças no comportamento de consumo. Nos últimos anos, indicadores do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostraram uma recuperação gradual de 4,7% nas vendas presenciais em categorias como vestuário e bens duráveis, impulsionada pela volta do fluxo às lojas e por uma normalização pós-pandemia que reposicionou parte do varejo físico. No digital, o movimento é diferente: o e-commerce continua relevante, mas cresce em ritmo mais moderado após o avanço acelerado observado nos anos de isolamento.
Enquanto esses dois canais tentam encontrar seu novo ponto de equilíbrio, os consumidores brasileiros ponderam as dores e as delícias de comprar no conforto do próprio lar, graças a um fator decisivo que envolve as decisões: a insegurança. O ambiente digital vive um período de alta exposição a golpes e fraudes, especialmente em momentos de grande procura por ofertas.
Um levantamento recente do Reclame Aqui aponta que 63% dos consumidores afirmam ter dificuldade para identificar fraudes criadas com ferramentas de inteligência artificial, o que aumenta o risco de cair em páginas falsas e links maliciosos. Essa percepção se intensifica às portas da Black Friday, quando criminosos costumam simular promoções e imitar comunicações oficiais para capturar vítimas desatentas.
Há também um traço comum nos relatos que chegam às plataformas de reputação e órgãos de defesa do consumidor: a sensação de vulnerabilidade aumentou, e isso muda a forma como parte do público enxerga a compra online. Reclamações envolvendo ofertas inexistentes, sites falsos e fraudes ligadas a grandes datas promocionais cresceram ao longo do ano e, segundo especialistas, a tendência de aumento se mantém. Em uma conjuntura de renda apertada e juros ainda elevados, a cautela prevalece. Para a esmagadora maioria dos consumidores, errar custa caro.
Esse ambiente tem impacto direto nas estratégias do varejo, especialmente no comércio virtual, que depende de confiança e previsibilidade para converter tráfego em vendas. Quando o consumidor hesita, o carrinho não fecha. Para as companhias, isso significa margens pressionadas, custos mais altos e a necessidade de investimentos mais robustos em segurança e transparência.
Para entender como esse cenário deve influenciar a Black Friday e por que a confiança é tão relevante na jornada de compra, o E-Investidor conversou com Edu Neves, CEO do Reclame AQUI. Ele explica como os golpes evoluíram, o que isso significa para varejistas e consumidores e como reduzir riscos em um dos períodos mais lucrativos, e mais delicados, do calendário comercial.
E-Investidor — O Reclame AQUI tem observado uma mudança clara no comportamento do consumidor para esta Black Friday?
Edu Neves — Sim. Há uma ansiedade maior do que a dos últimos anos. O consumidor quer aproveitar ofertas, mas se sente exposto, porque sabe que há golpes rondando de todos os lados. E, como ele está financeiramente pressionado, a dor de perder dinheiro pesa muito mais. É um cenário que deixa todo mundo em alerta e abre espaço para golpes extremamente convincentes, com sites e vídeos quase idênticos aos das grandes marcas. Isso desorganiza a jornada e aumenta o risco.
Por que os golpes deste ano parecem muito mais difíceis de identificar? O que mudou?
A sofisticação. Os fraudadores evoluíram. Eles usam tecnologias que replicam a comunicação oficial das empresas com uma fidelidade assustadora. A pessoa recebe um link por WhatsApp, SMS ou e-mail e, por estar esperando ofertas, cruza mentalmente as informações e acredita. Golpe tem sempre pressa e usa justamente esse momento de alta expectativa para agir. O consumidor está mais atento, mas a velocidade da inovação criminosa ainda é maior.
Esse ambiente de insegurança digital está fazendo o consumidor voltar para a loja física?
Está, e de forma muito clara. Quando o digital fica arriscado, parte do público migra para o físico. A pessoa vai à loja “para não cair em golpe”. Abre mão da conveniência para ter segurança. Isso tem impacto direto no e-commerce, porque reduz conversão e aumenta a desconfiança. Quando a confiança cai, o carrinho não fecha. É um movimento temporário, mas relevante, e mostra que o varejo físico recupera força sempre que o ambiente digital fica turbulento.
O que varejo e consumidor podem fazer para reduzir risco e aumentar a confiança durante a Black Friday?
Do lado das empresas, comunicação clara é fundamental. O varejista precisa dizer por quais canais falará, quais ofertas são reais e quais mensagens nunca serão enviadas. Isso cria um padrão. Quando surge algo fora desse padrão, o consumidor já sabe que é fraude. Para o consumidor, o básico segue valendo: não clicar em links de desconhecidos, confirmar ofertas no site oficial, desconfiar de urgências e pesquisar no Reclame Aqui. A diferença é que, hoje, esse cuidado não é opcional. É a única forma de manter segurança num ambiente de risco elevado.
Quais são as dicas de ouro para comprar bem na Black Friday, seja no online ou na loja física?
A principal dica é planejar. O consumidor precisa decidir o que quer antes do dia 28. Quando a pessoa chega na Black Friday sem lista, acaba comprando por impulso e se expõe muito mais ao risco de golpe, especialmente no online. A segunda dica é pesquisar histórico de preço. Vemos todos os anos casos de maquiagem de desconto. É importante saber quanto aquele item custava antes para entender se a promoção é real. Também recomendo checar a reputação da empresa, tanto para quem compra online quanto para quem vai à loja física, porque isso ajuda a evitar problemas com troca, garantia e pós-venda. A última dica é desconfiar de ofertas boas demais: nenhum produto de marca some 70% de preço do dia para a noite. Se parece milagre, provavelmente é golpe.