Sem dividendos pagos em 2026? CEO da Taurus abre o jogo sobre proventos, taxação e estratégia de retomada
Com tarifas de Trump mais brandas, entre 10% e 20%, a Taurus poderia respirar melhor e retomar a forte geração de caixa, mas ainda precisa de tempo para reorganizar a casa
Salesio Nuhs, CEO da Taurus (TASA4). (Foto: Divulgação/ Taurus)
“Eu tenho uma característica: não desisto nunca”, me disse recentemente Salesio Nuhs, CEO da Taurus, em um papo para a coluna Dividendo à Vista. A Taurus (TASA4) enfrenta sua própria tempestade perfeita com a taxação de 50% anunciada por Donald Trump sobre produtos brasileiros, que atinge diretamente as armas. Em 2024, a companhia também sofreu com as enchentes no Rio Grande do Sul.
A empresa já viveu uma longa reestruturação entre 2018 e 2021, quando zerou dívidas. Em 2022, celebrou essa virada com proventos recordes e a promessa de dividendos trimestrais, promessa que acompanhei de perto, mas que nunca se concretizou. Não houve pagamentos trimestrais reais em 2023 e 2024, embora 2025 tenha trazido alguma recorrência em maio, julho e setembro.
Para 2026, anúncios de proventos estão garantidos, mas sem compromisso de pagamento no mesmo ano.
“A nossa ideia é continuar distribuindo 35% do lucro líquido em proventos. Não vamos mudar a política nem o payout, mas o pagamento efetivo vai depender do caixa da companhia”, explicou Nuhs.
Traduzindo: distribui, não nega, paga quando puder. E isso pode significar meses de espera após os balanços trimestrais. Se o caixa apertar, parte dos dividendos pode ser pago apenas em 2027. Diante de tantos choques externos, analistas avaliam que reduzir frequência de proventos e manter o mínimo exigido faz sentido para um negócio cíclico. A entrevista foi direta. O CEO detalhou a estratégia para recuperar rentabilidade e não fugiu de assuntos espinhosos como os dividendos. Como sempre, vamos ao que interessa, sem anestesia.
Dividendo não é prioridade
Em uma entrevista tudo fala, mas são as frases que ficam. E uma que Nuhs repetiu foi “Uma das características da Taurus é tomar decisões rápidas e se adequar às realidades, sejam positivas ou negativas”. Resume bem o momento da empresa.
Salesio já tinha planos A, B e C para as tarifas de Trump, até a possibilidade de levar a produção aos Estados Unidos. Por isso, a ausência de um plano para antecipar proventos ou pagamentos recorrentes em 2026 não parece descuido, mas falta de prioridade. Dividendos não estão no topo da lista da Taurus.
Sobre o payout (porcentagem de lucro líquido distribuído aos acionistas) de 35%, o CEO segue resistente a mudar. Para ele, a taxação é uma fase passageira e não muda o fato de a Taurus ser “uma forte geradora de caixa”, o que não justificaria levar ao Conselho uma revisão da política.
Em 2026, a companhia deve repetir a dinâmica de Engie (EGIE3) e Cemig (CMIG4): anuncia proventos, mas demora para pagar. “Não estou dizendo que vou pagar logo após a divulgação dos resultados, eu posso pagar mais na frente ou em 2027, a depender do caixa”.
Para quem conhece Salesio Nuhs, preservar caixa e dívida sempre foi obsessão, nenhuma surpresa, para quem lidou com tempos de vacas magras. Ele admite que pode pagar proventos ainda em 2026 se houver espaço. A redução das tarifas pode gerar créditos tributários, há cerca de R$ 300 milhões em ICMS acumulado no Rio Grande do Sul e um financiamento do BNDES que também pode ajudar. “A Taurus não precisa fazer mais investimentos. Sem compromissos maiores, a possibilidade de pagar dividendos é grande”, afirmou.
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A empresa ainda tem dois terrenos em Porto Alegre que funcionam como seguro para momentos críticos. E como diria uma fonte, ninguém fala algo ao jornalista por acaso. Se o CEO ventilou a chance de anunciar e não pagar, o investidor não deve se iludir com cenários otimistas.
Dividendos trimestrais
Sobre os dividendos trimestrais, a pergunta era inevitável. Será que a Taurus desistiu do sonho? A dúvida cresce porque um de seus principais acionistas, Luiz Barsi Filho, o Rei dos Dividendos e dono de 8,39% da empresa, é defensor ferrenho de pagamentos trimestrais.
Segundo o CEO, a meta segue viva, mas a cicatriz da taxação de Trump empurrou o plano. A retomada dos pagamentos trimestrais ficou para 2027, quando a empresa espera um ambiente mais favorável.
Perguntei também se a Taurus ainda é empresa de dividendos ou voltou a ser tese de reestruturação. Nuhs diz que continua atraente para quem busca crescimento com proventos, a tal empresa de crescidendos. “A Taurus está muito barata. Existe algo momentâneo por conta da taxação americana, mas a saúde financeira e a competitividade são boas”, afirmou.
Antecipação de proventos
Enquanto várias empresas correm para antecipar proventos e evitar a tributação de 10% acima de R$ 50 mil, a Taurus não tem plano de pagamento antecipado em 2025. Segundo Nuhs, o CFO e uma consultoria avaliam os lucros retidos, mas mesmo que haja espaço, o máximo que pode ocorrer este ano é a declaração. O pagamento ficaria para 2026 ou depois. “Certamente não vamos pagar este ano”, disse.
Pela regra, quem anunciar dividendos até 31 de dezembro de 2025 escapa do imposto e pode pagar até 2028.
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Dividendos extraordinários estão fora do radar. O CEO prefere esperar o balanço do 4TRI para medir o caixa. Sobre ampliar o uso de juros sobre capital próprio, Nuhs afirmou que o modelo está em estudo. A empresa mantém estratégia híbrida entre dividendos, JCP e recompras.
Orange, colabore!
Sobre a taxação de 50%, Nuhs afirma que nada está deixado ao acaso. A Taurus tem plano A, B, C e D e contratou uma consultoria de lobby para dialogar com o governo Trump. A próxima reunião com a Casa Branca será em 3 de dezembro.
O CEO está otimista e acredita que as tarifas podem ser isentas ou reduzidas. Disse que uma taxa de 10% seria administrável, já que a empresa repassou 7% aos clientes. “Com 20% fica mais difícil, mas ainda dá para equilibrar, transferindo a montagem aos EUA”, avaliou. Mantendo a margem bruta de 31%, a operação segue de pé e pode gerar melhores resultados.
A Taurus também preparou o pior cenário. “Se as taxas de 50% perdurassem para sempre vamos montar e fabricar peças nos Estados Unidos”, afirmou, embora prefira manter a operação principal no Brasil. Pistolas de menor margem, como a família G com preço de US$ 300 a US$ 400, seriam produzidas e montadas lá. Itens de maior margem, como revólveres, seriam produzidos no Brasil e montados nos EUA. O mercado civil americano, que representa 80% do nicho, não pode ser substituído facilmente.
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Nuhs acredita que até o fim de 2025 pode surgir alguma novidade positiva sobre tarifas.
Novos mercados
A Taurus busca espaço no mercado militar em Índia e Turquia. Após perder a licitação de 425 mil fuzis na Índia, segue na disputa por 70 mil armas, cerca de US$ 30 milhões, que podem reforçar o balanço entre 2026 e 2027. A Índia, segundo Nuhs, é um pilar de médio e longo prazo.
A compra da fabricante turca Mertsav está quase fechada. “Mesmo com resultado positivo, só se concretiza em 2026”, disse o CEO, que viaja em 2 de dezembro para avançar no acordo. Ele projeta que o mercado militar pode superar 10% da receita nos próximos cinco anos.
Na base da sinceridade…
Enquanto Nuhs está otimista, analistas seguem cautelosos. Carlos Herrera, da Condor Insider, destaca reação rápida às tarifas, demanda reprimida no Brasil e expansão militar. “Provavelmente fecham 2025 com lucro”. Mas alerta para a falta de visibilidade nos dividendos. “Não existe clareza se vai ter pagamento.” Ele defende que a Taurus deve focar em crescimento e dívida baixa e vê dividendos trimestrais como desnecessários e arriscados para a empresa.
Bruno Oliveira, do Vida de Acionista, é mais crítico. Para ele, pagamentos demorados como Engie e Cemig vão frustrar o investidor. “O CEO não deu garantia de pagamentos em 2026, que podem ir para 2027. O pagamento trimestral foi cancelado. Mais uma vez condições melhores de remuneração ao investidor são postergadas”, afirmou.
Vamos ser sinceros, jacarezada. A Taurus precisa priorizar caixa e rentabilidade. Dividendos ficam em segundo plano. Para quem tem estômago de Luiz Barsi, TASA4 pode ser pimentinha barata para o longo prazo. Para iniciantes, melhor observar. A tese hoje é de retomada, não de renda. E o CEO já deixou isso bem claro, não adianta se iludir.