Mente sã em bolso são

Ana Paula Hornos é psicóloga clínica, autora e comunicadora. Como especialista no despertar do potencial humano, do individual ao coletivo, dedica-se a ajudar pessoas na busca do bem-estar integral, unindo propósito, carreira, saúde financeira e atitudes conscientes para melhores resultados. Professora, mestre em psicologia e engenheira pela USP, com MBA em finanças pelo INSPER e especializações pela FGV e IMD, possui mais de 20 anos de experiência como executiva e empresária. Foi diretora de grandes empresas nacionais como o Grupo Pão de Açúcar e membro de Conselho de Administração da Essencis Ambiental. No E-Investidor, fala sobre finanças, comportamento, vida profissional e atitude ESG.

@anapaulahornos

Escreve às segundas-feiras, a cada 15 dias.

Ana Paula Hornos

Sexo, dinheiro e poder: o que o caso Unisa ensina sobre saúde mental

As imagens de alunos da Unisa se espalharam amplamente nos últimos dias, mostrando todo um sistema de misoginia e de adoecimento mental que existe na nossa sociedade.

Caso em faculdade de medicina expõe misoginia (Foto: Wutzkoh/Envato)
  • Um grupo de estudantes do sexo masculino do curso de medicina da UNISA ficaram seminus e simularam uma sessão de masturbação coletiva enquanto assistiam a uma partida de vôlei feminino.
  • A instituição de ensino optou por impor a punição mais severa e expulsar os estudantes envolvidos.
  • O fato ocorrido levanta pontos que chamam a atenção e provocam tristeza e preocupação, do ponto de vista psicossocial, no olhar sobre jovens.
  • Os alunos de medicina não somente expuseram publicamente seus órgãos sexuais, mas todo um sistema de misoginia e de adoecimento mental ainda existente na nossa sociedade atual.

Mais um grande alerta para sinais e sintomas de adoecimento na relação entre sexo, dinheiro e poder foi disparado esta semana, curiosamente entre alunos de medicina.

Um grupo de estudantes do sexo masculino do curso de medicina da UNISA ficaram seminus e simularam uma sessão de masturbação coletiva enquanto assistiam a uma partida de vôlei feminino durante um torneio universitário em São Carlos. As imagens se espalharam amplamente nos últimos dias nas redes sociais.

A instituição de ensino optou por impor a punição mais severa e expulsar os estudantes envolvidos.

O Ministério das Mulheres publicou nota de repúdio sobre o comportamento dos estudantes: “Romper séculos de uma cultura misógina é uma tarefa constante que exige um olhar atento para todos os tipos de violência de gênero. Atitudes como a dos alunos de medicina da UNISA jamais podem ser normalizadas, elas devem ser combatidas com o rigor da lei”.

A misoginia pode ser amplificada nos contextos em que o dinheiro e o poder se encontram. Por exemplo, em certas indústrias ou setores em que a desigualdade de gênero persiste, indivíduos com poder financeiro podem perpetuar práticas discriminatórias ou sexistas. Isso pode incluir a disparidade salarial de gênero, a sub-representação das mulheres em cargos de liderança e até mesmo o assédio sexual no local de trabalho.

Jamie Fiore Higgins ex-executiva do mercado financeiro, que já foi nomeada uma das mulheres mais influentes do ano pelo Financial Times, conta em seu livro “Bully Market: My Story Of Money And Misogyny At Goldman Sachs” (Mercado de Bullying: Minha história com o dinheiro e a misoginia no Goldman Sachs, em tradução livre) como sua alegria em conseguir o emprego no banco se transformou em decepção e pesadelo por ter encontrado ambiente dominado pela misoginia e sexismo: “Era uma atmosfera de hipermasculinidade alimentada por dinheiro e poder”.

Adoecimento na relação entre sexo, dinheiro e poder no caso Unisa

O fato ocorrido levanta pontos que chamam a atenção e provocam tristeza e preocupação, do ponto de vista psicossocial, no olhar sobre jovens:

  1. É surpreendente que, em pleno século XXI, no Brasil e entre a nova geração, homens ainda objetifiquem a figura feminina e banalizem sua relação com a mulher.
  2. O comportamento sexual agressivo tal qual ocorrido é reflexo de uma manifestação disfuncional de poder. Aponta para uma incapacidade em estabelecer relacionamentos sociais adequados e de não saber lidar com a própria raiva, agressividade e sexualidade.
  3. Demonstra falha na escolha profissional e no sistema de recompensa do indivíduo. Supõe-se que um médico esteja disposto a ajudar e a cuidar de pessoas em estado de grande vulnerabilidade física. Como confiar em um profissional incapaz de respeitar o corpo feminino?
  4. Indivíduos que são motivados apenas por poder, status e dinheiro em suas escolhas profissionais são comumente dotados de baixa autoestima e movidos por comportamentos impulsivos. É muito triste ver alunos que estudaram vários anos para passar em um dos vestibulares mais difíceis e em uma das faculdades mais caras do país comprometerem suas carreiras em ato de tamanha agressividade e imaturidade coletiva.
  5. Segue o jogo… foi a reação das meninas, de seguirem com o jogo de vôlei, mesmo com o ato inaceitável ocorrendo ao redor. Mulheres, infelizmente, aprendem socialmente a se calar diante do inaceitável, para sobreviverem em uma sociedade ainda dominada pela misoginia e pelo sexismo.

No meu artigo sobre as declarações sexistas do deputado estadual Arthur do Val (Podemos-SP), conhecido como Mamãe Falei, em 2022, em áudio compartilhado com um grupo de amigos, trouxe a debate a exacerbação disfuncional do uso do poder relativo ao dinheiro e ao sexo.

Poder, prazer e segurança são atributos humanos positivos quando usados para o empoderamento, felicidade, preservação e proteção da espécie. São positivos quando envolvem olhar empático com outros indivíduos, perante seus sentimentos, com respeito à dignidade da condição humana.

Os alunos de medicina não somente expuseram publicamente seus órgãos sexuais, mas todo um sistema de misoginia e de adoecimento mental ainda existente na nossa sociedade atual.