“Que possamos ser lembrados aqui de nossas mais elevadas aspirações, e inspirados a trazer nosso amor e serviço ao altar da humanidade. Que saibamos mais uma vez que não somos seres isolados, mas conectados, em mistério e milagre, ao universo, a esta comunidade e entre si”. – Anônimo, original em inglês
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Em setembro deste ano, durante o Congresso da ABVCAP (Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital), tive a honra de entrevistar Dasho Tshering Tobgay, ex-primeiro-ministro do Butão.
Político, ambientalista e defensor da cultura butanês, ele foi responsável por estabelecer o Partido Democrático Popular como o primeiro partido político registrado no Butão e continua a atuar como seu presidente. Defensor da Felicidade Interna Bruta, ele falou sobre preservação ambiental, mudanças climáticas, pobreza, democracia, liderança iluminada e felicidade.
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“A maior diferença entre o Butão e os outros países é que, para nós, a Felicidade Interna Bruta (FIB) é mais importante que o PIB. Reconhecemos que o crescimento econômico é importante, mas sustentabilidade e bem-estar também são características de um país potente” – contou Tobgay.
No Butão, até políticas públicas precisam passar pelo crivo de uma comissão que avalia se elas contribuirão ou não para a Felicidade Interna Bruta. É um conceito que procura levar em conta não somente avanço econômico, medido pelo Produto Interno Bruto (PIB), mas um conjunto bem mais amplo de variáveis.
O Butão é uma monarquia constitucional democrática desde 2008, quando realizou a sua primeira eleição geral. O rei é “o chefe de Estado, protetor de todas as religiões, e supremo comandante chefe das forças armadas e das milícias”. Na Constituição, o rei é o defensor de ‘Chhoe-Sid’, ou valores religiosos e políticos de paz e prosperidade; ele é o guardião do Estado-nação e permanece no comando do Butão após a transição democrática.
O país está localizado no sul da Ásia, no extremo leste dos Himalaias. Faz fronteira ao norte com a China e ao sul, leste e oeste com Índia e Nepal. Tem uma população de menos de 800 mil habitantes.
O índice de “Felicidade Interna Bruta” (“FIB”) foi criado após pesquisas nacionais realizadas em 2010, 2015 e 2022 sobre o nível de felicidade da população. O indicador leva em conta o bem-estar psicológico da população, saúde pública, educação, cultura, meio ambiente, governança pública e padrão de vida, além da maneira como os cidadãos empregam seu tempo livre e o quão ativa é a vida em comunidade.
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No início da minha entrevista, eu disse que gostaria de começar falando sobre compaixão, mas como estávamos num evento sobre investimentos, eu temia escutar que compaixão não paga a conta. Perguntei o que ele diria sobre isso.
Togbay respondeu falando que, para qualquer iniciativa dar certo, é preciso haver equilíbrio entre três atributos: sabedoria, coragem e compaixão. Sabedoria e coragem somente, sem compaixão, podem gerar muito estrago pela falta de preocupação e cuidado com os outros.
Apenas com sabedoria e compaixão podemos ficar estagnados por falta de coragem para executar. E mesmo com compaixão e coragem, sem sabedoria, não chegaremos a lugar nenhum.
Tobgay trouxe o conceito para o universo corporativo e lembrou que as empresas ganham mais quando os funcionários estão mais felizes, uma vez que se tornam mais comprometidos. Mas, tanto no Butão quando em uma grande empresa, felicidade requer trabalho duro. Por isso, é primordial o olhar para o outro, seja para os trabalhadores de uma empresa ou para uma população, e entender o que os torna mais ou menos felizes.
O FIB passou a ser adotado por outros países e recebeu o apoio da ONU por meio do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). O índice também influenciou, nos últimos anos, a criação e a estruturação de “departamentos de felicidade” em diversas empresas do mundo.
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“O que importa mais para um país é o seu povo. E o povo não precisa ser rico para ser feliz. Promovendo o progresso social, com educação e saúde, a preservação do meio ambiente e a cultura local, um governo consegue atingir seu objetivo principal, que é fazer o seu povo feliz”, ressalta Tobgay.
Ele foi sincero ao explicar que, mesmo com toda ênfase que o Butão dá ao tema da felicidade, não existe mágica. “Para deixar claro: o Butão não atingiu isso. Temos um longo caminho”, disse. “Somos um dos países mais pobres do mundo, o PIB é de US$2,5 bilhões. Mas, no que tange a corrupção, governança, paz, estabilidade e liberdade da imprensa, aparecemos bem ranqueados. Nosso maior desafio é a economia”.
O Butão enfrenta o desafio de crescer, já que a economia não dá conta de atender os jovens – atualmente, 22% estão sem emprego. A maior fonte de receita vem da exportação de energia hidrelétrica para a Índia e de minerais. Uma parte menor vem do turismo, da indústria têxtil, da produção de alimentos e da saúde.
Dentro da agenda política da Felicidade Interna Bruta, a proteção ao meio ambiente é fundamental para o bem-estar de sua população. O Butão é um dos poucos países no mundo negativo em emissões de gás de efeito estufa. Mais de 70% do país está coberto de florestas e 50% do território é protegido por lei.
Esta grande quantidade de cobertura de florestas fez com que o Butão se tornasse um sumidouro de carbono – o que significa que absorve mais dióxido de carbono do que produz. O país absorve cerca de sete milhões de toneladas de dióxido de carbono anualmente e produz apenas cerca de dois milhões de toneladas.
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Além disso, o Butão também exporta a maior parte da energia hidroelétrica que gera a partir dos seus rios. Isto neutraliza a contribuição do país para as emissões de carbono em milhões de toneladas por ano.
Perguntei sobre o “Third Pole” (O Terceiro Polo) e o que nós, brasileiros, temos a ver com isso, já que estamos tão longe. Tobgay respondeu que precisamos ter compaixão com as próximas gerações.
Ele falou sobre uma reunião que o presidente das Maldivas fez em 2009, no fundo do mar. A ideia era chamar a atenção para o nível do mar que, com o aquecimento global, pode deixar as Maldivas debaixo da água.
Pouco tempo depois, o Primeiro-Ministro do Nepal fez uma reunião nos Himalaias para mostrar para o mundo que o gelo está mesmo derretendo.
A região do Himalaia Hindu Kush é o terceiro maior repositório de gelo do mundo, depois dos Polos Norte e Sul – se as atuais taxas de derretimento continuarem, dois terços dos seus glaciares poderão desaparecer até ao final deste século. O que acontecerá se os glaciares derreterem? E o que nós temos a ver com isso?
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Tobgay diz que um potencial conflito ou instabilidade política por falta de água em uma região com 1,7 bilhões de pessoas e cercada por três potencias nucleares – China, Índia e Paquistão -, é grave o suficiente e afeta a todos nós. As últimas pesquisas sobre o derretimento das camadas de gelo nessa região mostram que os dados são assustadores.
Temos que pensar na transição climática. Se não for por compaixão, que seja por sobrevivência.
Meu artigo dessa semana já estava quase pronto quando aconteceu o ataque do grupo terrorista Hamas a Israel. Ver tamanho sofrimento em pessoas inocentes dos dois lados dói demais e me faz lembrar mais uma vez que não somos seres isolados, estamos todos conectados.
A dor dessas pessoas chega aos nossos corações. Rezo para que encontremos um caminho de paz.