- A elevação do gasto do governo piora as expectativas inflacionárias e leva a uma perda de eficiência da política monetária
- Mesmo com os juros futuros subindo fortemente no Brasil, o dólar subiu bem frente ao real
- A performance do S&P 500 dos últimos anos é convidativa para investimento nos EUA
Tem circulado nas redes sociais uma tabela do tesouro direto de um título prefixado (vencimento 2031) pagando 12% a.a. Há muitas pessoas espantadas com o retorno deste papel. Porém, para nossos clientes e leitores, este yield não é nenhuma novidade. Ao longo de várias colunas anteriores, alertamos para a piora do cenário macroeconômico, principalmente pelo lado fiscal, tornando este prêmio perfeitamente possível.
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O retorno de 12% ao ano reflete uma média geométrica das expectativas diárias da Selic até 2031, mais um prêmio de risco projetado pelo mercado. A elevação do yield de 10,5%, em fevereiro, para 12% em junho decorre tanto de um cenário pior para Selic quanto de uma elevação do prêmio de alongamento da dívida pública federal.
A deterioração fiscal traz duplo impacto para taxa de juros. Primeiro, a elevação do gasto do governo piora as expectativas inflacionárias e leva a uma perda de eficiência da política monetária. Consequentemente, o Banco Central adota uma política de juros mais restritiva por conta dos riscos inflacionários. Anteriormente, falava-se em Selic de até 8,5% a.a para o final de 2024; agora, as projeções giram em torno de 10% a.a. O aumento da projeção decorre de cortes menos intensos na taxa básica de juros. Segundo, a piora fiscal eleva o risco de o governo não honrar a sua dívida. Nesse cenário, os investidores pedem um prêmio maior para financiar o governo.
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Para dificultar ainda mais o cenário, os juros nos EUA não devem ceder tão cedo. É interessante notar que mesmo com os juros futuros subindo fortemente no Brasil, o que aumenta a distância para as taxas da renda fixa americanas, o dólar subiu bem frente ao real. Colaborou também para a depreciação do real a piora na balança de pagamentos. Em abril, o déficit em transações correntes foi acima do consenso de mercado (US$2,5 bilhões contra US$1,10 bi de projeção) e o investimento estrangeiro direto foi pior que o esperado (US$3,9 bilhões contra US$4,8 bilhões).
De acordo com a teoria econômica, um aumento do diferencial de juros entre Brasil e EUA tenderia a apreciar o real frente ao dólar, e não o contrário. O movimento de alta do dólar, mesmo com os juros futuros subindo no Brasil, aliado à menor entrada de investimento direto no país, só reforça o cenário de que a piora no preço dos ativos doméstico se deve muito mais a fatores internos do que externos.
Não é para menos, nosso déficit nominal já chegou no nível da pandemia (quase R$1 trilhão de reais), sem ter ocorrido nenhuma crise mundial da covid-19. Para piorar, as despesas obrigatórias vinculadas ao salário mínimo não param de crescer, e a dívida bruta segue em trajetória ascendente (76% do PIB em abril). Como se não bastasse, não existe nenhuma medida de ajuste de despesa; somente aquelas focadas no aumento da arrecadação.
O problema das medidas focadas na arrecadação é que elas são fortemente dependentes de crescimento econômico. E aí também temos fontes de preocupação. O desastre do Rio Grande do Sul deve tirar 0,4 p.p. do PIB (embora o relatório Focus tenha negligenciado este efeito). Na prática, isso significa menos renda e menos arrecadação para o governo. O resultado do PIB só não vai ser pior devido à recuperação no mercado de trabalho.
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É por conta deste risco fiscal, que nós da MSX Invest defendemos há tanto tempo uma maior diversificação global, a fim de reduzir o risco sistêmico em relação ao Brasil. Além disso, a performance do S&P 500 dos últimos anos é convidativa para investimento nos EUA, seja pelo menor risco ou pelo maior retorno.
O que chama atenção nos EUA é o desempenho das ações mesmo com os juros elevados por lá. Alguns analistas alegam que o S&P 500 é puxado basicamente pelas grandes empresas de tecnologia. Não é bem verdade. JP Morgan e GE, entre outras, são exemplos de empresas tradicionais que valorizaram 40% e 90% respectivamente de um ano para cá.
Apesar do cenário mais benigno para os riscos inflacionários, o Fed sabe que a inflação é traiçoeira e a economia americana é robusta, principalmente do lado do emprego e do consumo. Por conta disso, o banco central americano age com muita cautela na política monetária, deixando a grande dúvida de quando os juros começaram a cair de fato nos EUA. Independentemente da dúvida, algo é certo: no momento que isso ocorrer, haverá outro rally na bolsa americana.