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Vitor Miziara é sócio da Performa Ideias, empresa de análise de mercado. Atua desde 2008 no mercado financeiro com experiência em gestoras, assessoria, análises e mais. Além de empreendedor, atua como investidor ativo em empresas e no ramo imobiliário, sempre em busca de valorização e renda passiva. Entusiasta do mercado, ele discorre sobre cenários e investimentos, sem evitar assuntos polêmicos e críticas abertas.

Escreve quinzenalmente, às terças-feiras.

Vitor Miziara

O que aprender com a lira turca, o peso argentino e o debate sobre juros no Brasil

Em um mundo economicamente interdependente, a queda de um pode servir de lição para todos

Taxas de juros reduzidas podem trazer a tão temida inflação de volta. (Foto: Envato Elements)
  • A lira turca atingiu a sua mínima histórica na segunda-feira (29). O epicentro da crise da Turquia encontra-se na política monetária heterodoxa adotada pelo presidente reeleito
  • Nossa vizinha Argentina está passando por uma situação econômica similar, adotando políticas monetárias semelhantes para controlar a inflação
  • A economia brasileira, embora distinta da Turquia e da Argentina em muitos aspectos, compartilha com elas a classificação de mercado emergente

Na segunda-feira (29), a lira turca atingiu a sua mínima histórica, caindo para 20,077 por dólar. A crise no país é uma consequência da gestão de duas décadas do agora reeleito presidente, Recep Tayyip Erdogan. O epicentro da crise encontra-se na política monetária heterodoxa adotada por Erdogan, que acredita que altas taxas de juros são inflacionárias, uma posição que contraria o consenso econômico convencional de que juros elevados ajudam a conter a inflação.

Essa crença levou a um ciclo de redução das taxas de juros, o que diminuiu a atratividade para os investidores e gerou uma fuga de capitais. Como resultado, a inflação disparou, causando estragos na economia e diminuindo o poder de compra dos cidadãos.

A combinação de fuga de investidores e inflação elevada resultou em uma desvalorização da moeda que já caiu 90% nas últimas décadas. Vale lembrar que o Banco Central na Turquia não é independente e, portanto, segue à risca as diretrizes impostas pelo presidente.

Não precisamos ir muito longe para ver os resultados dessa mesma política. Nossa vizinha Argentina está passando por uma situação econômica similar, adotando políticas monetárias semelhantes para controlar a inflação. Para entender a situação atual da Argentina, é útil olhar para o seu passado econômico. No início do século XX, a Argentina era uma das dez economias mais prósperas do mundo, em grande parte graças à sua rica agricultura e à exportação de commodities.

No entanto, a partir da década de 1930, o país adotou políticas de substituição de importações, buscando tornar-se autossuficiente em uma variedade de setores industriais. Apesar de algum sucesso inicial, essas políticas, aliadas a uma série de regimes políticos instáveis e à implementação de políticas econômicas intervencionistas, levaram a uma série de crises econômicas.

Nos últimos anos, essas crises se intensificaram após a implementação de políticas semelhantes àquelas adotadas na Turquia, com controles sobre a produção e as exportações, e resistência em aumentar as taxas de juros para controlar a inflação. O resultado tem sido consistentemente o mesmo: queda da moeda, inflação alta e diminuição da produção.

Seria natural pensar que a queda da lira turca deveria servir como um aviso de que políticas econômicas não convencionais, quando mal implementadas, podem resultar em instabilidade econômica e desvalorização da moeda. No entanto, essa não parece ser a lição aprendida.

No Brasil, críticas ao Banco Central independente são comuns entre os partidos de esquerda. Eles defendem juros mais baixos para impulsionar o crescimento econômico, mas parecem desconsiderar que taxas de juros reduzidas podem trazer a tão temida inflação de volta. Além disso, taxas de juros mais baixas podem desestimular investidores estrangeiros, o que pode levar à retirada de capital do País e, consequentemente, à desvalorização da nossa moeda.

A economia brasileira, embora distinta da Turquia e da Argentina em muitos aspectos, compartilha com elas a classificação de mercado emergente. Isso significa que todos são considerados de alto risco e alta recompensa para os investidores.

Para o Brasil, as lições estão claras: a necessidade de manter políticas econômicas estáveis, a importância de atrair e reter investimentos estrangeiros e a essencialidade de controlar a inflação. Afinal, em um mundo economicamente interdependente, a queda de um pode servir de lição para todos.