Mas em algum ponto entre os mercados conturbados e as mudanças nas conversas sobre saúde mental, a perspectiva de Caldbeck mudou. Em 2016, ele demitiu aproximadamente 15% de sua equipe de 45 pessoas na empresa de tecnologia financeira CircleUp e começou a chorar. Agora, ele diz compartilhar seus sentimentos com os colegas de forma mais explícita. Ele também às vezes luta para encontrar o meio-termo entre a hesitação do executivo reservado e o perigo de falar demais.
“Houve um tempo em que eu chegava no trabalho e, em uma reunião, enquanto nos acomodávamos e alguém perguntava como havia sido meu fim de semana, eu dizia ‘bem, eu tive uma discussão difícil com minha esposa’”, disse Caldbeck, 43 anos, que antes era o CEO da CircleUp. “Todo mundo ficava de queixo caído. Percebi que estava falando demais. Isso não era apropriado. Não é assim que devemos demonstrar vulnerabilidade no trabalho.”
Os CEOs há muito estudam como dar boas e más notícias. Eles treinaram a si mesmos para apresentar grandes ideias e derrubar as medíocres. Agora eles precisam aprender uma nova habilidade: a arte de ser vulnerável. A inteligência emocional chegou ao topo das listas de manuais de gestão, como “A coragem para liderar”, de Brené Brown, cujos livros sobre vulnerabilidade venderam bem mais de um milhão de cópias. Na Escola de Negócios de Stanford, a disciplina optativa mais popular há anos é a de dinâmica interpessoal, mais conhecida como “sentimental”.
“As pessoas nos negócios são encorajadas a deixar os sentimentos em casa”, disse Carole Robin, coautora de “Connect” (Conecte-se, em tradução livre), que costumava ministrar a disciplina “sentimental”. ”Há uma geração de líderes agora – aqueles que podem ser os verdadeiros líderes promissores do futuro – que descobriram ser, de fato, quase impossível inspirar realmente as pessoas sem demonstrar sentimentos.”
Por isso, conforme as empresas lidam com um cenário econômico desafiador, os executivos estão correndo para deixar claro aos funcionários que eles não são apenas engravatados sem coração. São humanos, com sentimentos, os quais estão compartilhando no Twitter, com lembranças e em reuniões com todos os funcionários. Mas os profissionais que trabalham para eles nem sempre estão se beneficiando dos resultados de todo essa partilha. E, em alguns casos, estão se sentindo pressionados a responder aos chefes, abrindo mão da própria privacidade.
“Informação demais pode levar a mais vulnerabilidade do que você deseja”, disse Carole, que chamou atenção para a diferença entre a vulnerabilidade apropriada e inadequada no local de trabalho.
Braden Wallake recentemente demitiu dois de seus 17 funcionários da HyperSocial, empresa de vendas e marketing que comanda. Então ele foi ao LinkedIn para publicar o que estava pensando. “Esta será a coisa mais vulnerável que eu já compartilhei”, escreveu ele.
Wallake, 32 anos, sempre teve tendência à vulnerabilidade, uma estratégia de liderança que ele atribui ao apresentador de podcast Joe Rogan. Ele organiza uma “reunião de vitórias” semanal na qual os funcionários falam das conquistas em suas vidas profissionais e pessoais. Ele viajou pelos Estados Unidos estacionando sua van em algumas das calçadas de seus funcionários (inclusive, há várias semanas, na de um dos trabalhadores que acabara de demitir).
Quando ele começou a chorar, momentos depois de demitir dois trabalhadores, nem passou por sua cabeça esconder aquela reação emotiva. Então tirou uma selfie chorando para publicar no LinkedIn. “Só quero que as pessoas vejam que nem todo CEO por aí tem coração de pedra”, escreveu Wallake. “Sei que não é profissional dizer aos meus funcionários que os amo. Mas, do fundo do meu coração, espero que eles saibam o quanto os amo.”
A repercussão foi imediata. O post gerou mais de 10 mil comentários, muitos observando que Wallake havia destacado a própria dor em um momento no qual seus funcionários estavam sofrendo.
“Essa vulnerabilidade de ‘vocês não sabem como é difícil para mim demiti-los’ é algo que as pessoas precisam parar de demonstrar, por favor”, disse Edward Sullivan, coach executivo e coautor de “Leading With Heart” (Liderando com o coração, em tradução livre).
Nancy Rothbard, professora da Wharton School, da Universidade da Pensilvânia, que estudou as emoções no local de trabalho, disse que sua pesquisa apontou para uma expectativa crescente de que as pessoas tragam seus “eus completos” para o emprego, motivada por tecnologias que confundem as fronteiras entre trabalho e vida pessoal. Pesquisas indicam que as pessoas tendem a preferir separar suas vidas profissionais e pessoais em vez de uni-las. Mas muitas vezes elas sentem que não têm opção.
Julie Brosnan, que trabalha no setor de comunicações em Washington, lembra de se preparar para reuniões matinais com sua chefe em um emprego anterior nas quais surgiam perguntas como: o que você fez ontem à noite? O que fez no fim de semana passado? Depois a chefe falava sobre as brigas na família, o marido e o amante.
Os gestores de Julie se referiam à equipe como “família”. O problema de um profissional era o problema de toda a equipe. Julie estava constantemente lidando com perguntas a respeito de seus filhos, vida familiar e o que fazia quando estava de folga.
“Quando tinha alguma folga programada, todos perguntavam coisas como ‘para onde você vai na sexta-feira?’”, lembrou. “Se eu respondesse com, por exemplo ‘vou ao dentista’, eles diziam “e o que você vai fazer lá?’ Tipo, não faço ideia!”
É um equilíbrio delicado. Muitos executivos se sentem aliviados com o fato de as empresas que comandam não terem os ambientes sufocantes aos quais se acostumaram no início de suas carreiras.
Andy Dunn, por exemplo, que cofundou a empresa de roupas masculinas Bonobos e agora dirige a Pumpkin Pie, uma startup de aplicativos sociais, recentemente reuniu seus funcionários em uma videochamada para contar a eles sobre seu diagnóstico de transtorno bipolar, que é tema de um livro lançado por ele este ano, “Burn Rate” (Taxa de queima, em tradução livre).
“Assim que comecei a falar, eu meio que compartilhei demais”, disse. Ele saiu da videochamada e enviou imediatamente uma mensagem por Slack para seu diretor de tecnologia perguntando se a conversa havia sido um “desastre”.
Entretanto, Dunn descobriu que sua própria vulnerabilidade provocou desabafos emocionados de seus funcionários. Uma pessoa disse a ele que ela estava se sentindo só naquela fase atual de sua vida. “Ela estaria me dizendo essas coisas em um momento diferente? Não sei”, disse Dunn, acrescentando que sente que sua equipe se beneficia dessa abertura.
O CEO do aplicativo de namoro Hinge, Justin McLeod, lembra do alívio que sentiu ao ser completamente direto com sua equipe quando a empresa estava reavaliando seu modelo de negócios em 2016, enquanto enfrentava a concorrência feroz do Tinder. McLeod demitiu metade dos funcionários, por isso sabia que não podia impedir o restante da equipe de encarar a crise.
“Você até pode pôr panos quentes, mas isso faz com que as pessoas tenham a sensação de que não podem confiar na chefia”, disse ele.
O alvoroço na economia este ano apresentou um novo conjunto de desafios emocionais para os líderes empresariais. Ariane Goldman, fundadora da startup Hatch, que vende roupas para grávidas, tentou encontrar um equilíbrio entre proteger sua equipe de suas próprias ansiedades e, ao mesmo tempo, ser sincera em relação às desacelerações no mercado.
“É algo positivo de verdade para sua equipe que ela entenda o seu ponto de vista”, disse ela. “Sou uma CEO e fundadora, não apenas uma pessoa de fora que veio para lidar com uma crise, por isso levo essa bagagem comigo na hora de tomar decisões.”
E com o mercado de trabalho aquecido, algumas pessoas estão percebendo que podem procurar ambientes de trabalho onde se sentem mais confortáveis e podem deixar para trás os chefes que não respeitam limites.
Julie, por exemplo, agora tem um grupo de mensagens com amigos para desabafar as frustrações sobre os limites no local de trabalho. Alguns acham que os colegas pedem que se abram demais, outros se sentem muito distantes dos companheiros de equipe, principalmente quando interagem com eles sobretudo por meio de videochamadas. Agora Julie, que recentemente começou a trabalhar em um novo emprego, finalmente encontrou um lugar onde se sente confortável.
“Não há qualquer expectativa quanto a mostrar fotos do meu filho ou falar a respeito do que fiz durante minha folga”, disse ela. “Nós não nos pressionamos, mas estamos abertos e receptivos a ouvir uns aos outros caso alguém esteja passando por um momento difícil.”
Tradução Romina Cácia