Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é quem fiscaliza o mercado de investimentos brasileiro. (Foto: Adobe Stock)
Os superintendentes da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgaram nesta terça-feira (8) uma carta aberta para manifestar publicamente uma “preocupação com os rumos do sistema financeiro nacional e com a necessária valorização institucional” da autarquia. O documento, que vem sendo divulgado nas redes sociais, contém 20 assinaturas – 18 superintendentes além da chefia da Assessoria de Análise Econômica, Gestão de Riscos e Integridade e do auditor-chefe.
A carta aberta da CVM, uma autarquia ligada ao Ministério da Fazenda, é endereçada a investidores e à sociedade, mas principalmente ao governo e ao Congresso Nacional. Segundo os diretores, o órgão hoje lida com desafios estruturais no quadro de pessoas, cargos e funções graças a limites de orçamento. E não é por falta de arrecadação, destaca o documento.
“Em 2024, por exemplo, foram destinados à CVM apenas 27% do total arrecadado com a Taxa de Fiscalização dos Mercados de Títulos e Valores Mobiliários, tributo vinculado que tem como fato gerador o poder de polícia legalmente atribuído à Autarquia”, diz a carta. Dos R$ 1,1 bilhão arrecadados, R$ 296 milhões teriam sido destinados ao financiamento das atividades da CVM. “Em outras palavras, só no ano passado, o crescimento substancial do mercado regulado resultou em superávit de mais de R$ 800 milhões ao caixa da União, sendo mais uma evidência do grande descasamento entre o desafio regulatório atual e a disponibilidade de recursos para o desempenho das atribuições legais da Autarquia.”
Não é a primeira vez que a necessidade de fortalecimento da instituição vem a público. Em dezembro de 2024, associações como Anbima e Ancord assinaram em conjunto com outras entidades do mercado uma carta ressaltando que a CVM vem lidando com desafios relacionados à disponibilidade de recursos humanos e financeiros para acompanhar o crescimento do mercado de capitais brasileiro nos últimos anos.
O número de participantes supervisionados passou de 55 mil para 90 mil entre 2019 e 2024. No mesmo período, o patrimônio do indústria de fundos foi de R$ 5,5 trilhões para R$ 9,4 tri.
“A limitação orçamentária e a ausência de um modelo de financiamento que assegure a sustentabilidade das operações limitam a capacidade da CVM de implementar inovações, modernizar processos, atrair e reter talentos”, disseram as organizações à época.
Um lugar na mesa de discussão em Brasília
Na carta aberta, os superintendentes da CVM também reivindicam por um lugar à mesa na discussão sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65/2023, atualmente em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que visa estabelecer um novo regime jurídico para o Banco Central, incluindo autonomia técnica, operacional e orçamentária. Na prática, a PEC transforma o BC em uma empresa pública para garantir, segundo os autores do texto, a previsão constitucional da autonomia que foi concedida à instituição em 2021.
Os executivos da CVM defendem que esta é uma oportunidade de repensar o modelo do Sistema Financeiro Nacional como um todo. Por isso, a presença da autarquia na discussão seria “imprescindível”.
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“Reformas estruturais devem ser conduzidas com base em diálogo qualificado entre todos os órgãos envolvidos, garantindo a preservação dos ganhos institucionais acumulados ao longo das últimas décadas. O momento exige, portanto, responsabilidade, compromisso com o interesse público e respeito às conquistas regulatórias do país”, diz a carta.
Os superintendentes também demostraram preocupação com uma possível perda de poder da autarquia e a continuidade da independência decisória da instituição. A carta defende a presença de pelo menos um servidor de carreira técnica da autarquia na composição do Colegiado.
Desde dezembro, o Colegiado da CVM opera com um integrante a menos, desde a saída do ex-diretor Daniel Maeda, que era servidor técnico da autarquia. Esta reportagem do Estadão mostra que, desde então, a vaga aberta alimenta especulações nos bastidores. A indicação e futura nomeação cabem ao presidente da República e, segundo apurou o jornal, a lista de cotados vai de nomes de mercado a outros ligados ao governo.
“É fundamental que a memória institucional e a vivência cotidiana da regulação estejam representadas. Adicionalmente, temos acompanhado com atenção e muita preocupação notícias que indicam movimentos em curso envolvendo revisão no perímetro regulatório da CVM para atribuir a outros órgãos competências historicamente desempenhadas pela Autarquia, como no caso dos fundos de investimento”, ressalta o texto.
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“Reconhecemos a importância da atuação coordenada entre os diversos órgãos do Sistema Financeiro Nacional e entendemos que a modernização do arcabouço regulatório deve ocorrer de forma colaborativa, com respeito às competências legais e ao histórico técnico de cada instituição”, afirma o documento.