

A indústria de fundos multimercados não vai mais voltar a ser o que um dia já foi em termos de representatividade na carteira do investidor. O que não significa que o segmento não possa voltar a crescer. Para sobreviver, no entanto, os gestores vão precisar se mostrar mais competitivos, não só contra o CDI, que costuma ser utilizado como benchmark da classe, mas contra outras propostas de investimento. A avaliação é de Walter Maciel, CEO da AZ Quest, gestora com R$ 36,4 bilhões em ativos sob gestão, que conseguiu expandir os negócios no ano passado apesar da turbulência macro.
A sangria no mercado não terminou. Depois de 2024 ter sido o pior ano em níveis de resgates, os multimercados já viram uma saída líquida de R$ 43,8 bilhões no primeiro trimestre de 2025, segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Além das mudanças nos fundos exclusivos, que eram um motor no segmento e desde 2023 passaram a ser taxados com “come-cotas”, há ainda um problema de performance. Boa parte dos gestores brasileiros não consegue superar o CDI mesmo em janelas de longo prazo e viu os investidores migrarem para ativos de renda fixa em meio à alta de juros.
O executivo atribui a pior janela da história para o segmento a esse combo de fatores, que inclui ainda um cenário global adverso, com oscilações importantes de juros no mundo, mas também certa inércia dos gestores em rever as posições da carteira.
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“A cobrança de come-cotas nos exclusivos, apesar de parecer que não tem um peso, tirou um volume gigantesco da indústria. O gestor brasileiro vai ter de se adaptar à nova situação e ser competitivo, não só com retorno acima do CDI, mas acima dos fundos de crédito, de infraestrutura, fundos de ações”, diz ele. “Em volume total, os multimercados ainda vão crescer mais. Mas nunca mais vão ter o mesmo pedaço da pizza que tiveram no passado.”
O caminho das pedras vai ser encontrar uma abordagem temática e apostar nela – e, assim, gerar um alfa suficiente para conquistar de novo o investidor brasileiro. Essa estratégia já é muito adotada na gestão de renda variável no exterior e que tende a ganhar mais espaço por aqui. “Quem no Brasil arrebentou de ganhar dinheiro com o Milei, na Argentina, ou pegou a porrada das sete magníficas nos Estados Unidos e trouxe isso como retorno de cota para o investidor?”, questiona Maciel. Segundo ele, daqui para frente o jogo ficou mais sofisticado e as estratégias que muitos gestores macro adotavam para entregar retorno ao investidor no passado não serão mais suficientes.
Diversificar para crescer
Da cadeira de CEO, mas afastado da gestão direta de um fundo ou outro, uma posição que não é muito comum nas assets brasileiras, em que geralmente quem lidera também faz a administração de uma ou mais carteiras, Maciel explica como fez a AZ Quest crescer em 50% seus ativos sob gestão em 2024. No centro dessa expansão está a diversificação de produtos para além do tradicional macro – movimento que virou tendência no mercado graças ao momento ruim dos multimercados. Hoje, a casa opera 10 estratégias diferentes.
Gestoras grandes, com capilaridade suficiente para se movimentar, têm diversificado a prateleira de produtos oferecidos, dando foco especial aos segmentos que estão indo bem em termos de captação. Não é raro ver notícias de casas menores e times pequenos, mas especializados sendo adquiridos, assim como o lançamento de novos ativos isentos ou ligados a crédito privado também tem aparecido mais. É uma estratégia multiproduto, que diversifica os modelos de negócio e ajuda a balancear a conta final em janelas de crise em alguma linha específica.
Quem já fazia isso há mais tempo está conseguindo colher os frutos mesmo em meio aos resgates da indústria. A estratégia macro, a primeira a ser lançada pela ainda Quest em 2001, corresponde a apenas R$ 1,9 bilhão dos R$ 36,4 bi de PL administrado pela gestora atualmente. O carro-chefe hoje é o crédito privado, com R$ 26,2 bi, seguido pela previdência, com R$ 13,9 bi.
Maciel conta que a diversificação começou na marra, em um momento de crise que tem semelhanças com a janela atual, mas que, à época, rendeu uma alergia emocional ao executivo e zerou a remuneração de dividendos dos sócios da AZ Quest por um ano. Em 2008, a casa tinha um dos maiores fundos multimercados do País, seu principal produto com R$ 3,5 bilhões em gestão. Com a crise do subprime, viu o patrimônio derreter a R$ 500 milhões. Boa parte dessa saída tinha a ver com outro problema: 85% do dinheiro vinha de cinco clientes principais, fundos de fundos administrados pelos grandes bancos que resgataram os recursos por causa da volatilidade.
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“85% do dinheiro da gestora estava em macro e o fundo deu zero naquele ano; o que não era ruim no auge da crise do subprime, só que CDBs pagavam 13% e o investidor migrou. A mesma coisa acontece agora com os multimercados”, conta o CEO. “Naquele 2008, em um único dia, um fundo de fundo resgatou R$ 1 bi – com um só botão, um único cliente levou isso tudo embora. Parecido com o que aconteceu com a indústria depois da mudança dos fundos exclusivos.”
Depois, em 2011, a saída de uma parte da equipe levou embora bons gestores, acendendo o alerta de que era preciso diversificar também o time de profissionais. Desde então, a máxima passou a ser não depender apenas de um único pilar. “Foi preciso diversificar o negócio e a prateleira de produtos, pulverizar a base de clientes e criar uma equipe muito forte, mas que trabalhe para o todo”, resume Maciel.