

O Ibovespa, principal indicador de desempenho das ações brasileiras negociadas na B3, apresentou um desempenho positivo em março, acumulando valorização de 6,08% e alcançando 130 mil pontos, não superando, dessa forma, a leitura de agosto passado quando avançou 6,54% e estabeleceu a mais recente máxima histórica, na casa de 137 mil pontos. No ano, a alta já soma 8,29%, após o índice tocar sua mínima anual de 118.222 pontos. A partir desse nível, houve uma recuperação consistente, puxada pelo forte apetite comprador, levando o índice a testar pontos de resistência e atingir a máxima do ano em 133.904 pontos na última semana.
Esse desempenho do Ibovespa chama ainda mais atenção porque os principais índices americanos seguiram na direção oposta, com quedas acentuadas, muito próximas de 7% no campo negativo. Em março, o S&P 500 registrou uma queda de 5,75%, a maior queda mensal desde setembro de 2022, quando caiu 9,3%. O Nasdaq perdeu 8,21% no mês, enquanto o Dow Jones recuou 4,20%.
A recuperação do mercado brasileiro contrasta com a pressão enfrentada por Wall Street, resultado de uma combinação de fatores internos e externos que favorecem o apetite por ativos locais. “Acreditamos que esse movimento de valorização do Ibovespa é reflexo de uma migração de investimentos dos Estados Unidos para outras geografias, como o Brasil, devido às incertezas relacionadas às políticas comerciais implementadas até agora pelo presidente americano, Donald Trump”, diz o diretor de investimentos da Nau Capital, Mauricio Valadares.
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Apesar do movimento recente, o índice da bolsa brasileira encontra limitações para manter a trajetória de alta no curto prazo, segundo especialistas. O patamar de 133.904 pontos tem funcionado como uma barreira, e o afastamento das médias móveis sugere a chance de uma correção antes de novas tentativas de avanço. O mercado observa de perto o comportamento do índice, já que a consolidação em torno desses níveis pode indicar tanto um acúmulo de força compradora quanto uma perda de fôlego.
No gráfico semanal, o índice da B3 mantém uma movimentação ascendente desde que iniciou a recuperação em 118.222 pontos. Após três semanas consecutivas de valorização, o índice fechou a última semana com leve baixa de 0,33%, formando um padrão gráfico que sugere indecisão entre compradores e vendedores. Caso consiga superar a máxima de 133.904 pontos, pode buscar a máxima histórica de 137.469 pontos, com projeções mais longas em 139.500 e 145.000 pontos. Uma queda abaixo de 130.990 pontos, porém, poderia abrir espaço para um movimento corretivo mais forte, com suporte nas médias móveis entre 127.900 e 125.365 pontos, conforme analistas financeiros.
No gráfico diário desta segunda-feira (31), o Ibovespa seguiu com tendência de alta, sustentado por médias móveis inclinadas para cima. Após alcançar a máxima do ano, passou a apresentar movimentação lateral, que pode indicar tanto um preparo para uma nova tentativa de rompimento quanto uma perda de força. Se o índice romper os 133.900 pontos, o movimento de alta pode ganhar ritmo, buscando novos alvos em 139.000 e 142.520 pontos. Por outro lado, a perda do suporte em 129.535 pontos poderia ampliar o movimento vendedor, levando o índice a regiões de suporte mais baixas, incluindo a mínima do ano.
Até o dia 25 de março, o Brasil registrou uma entrada líquida de recursos superior a R$ 4 bilhões, destacando os investidores estrangeiros como os principais motores da valorização do Ibovespa no curto prazo. Eles continuam representando mais de 50% do volume negociado na bolsa, conforme dados da B3.
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“Como os investidores em geral estão cientes que os papéis da bolsa estão baratos, eles compram na medida que percebem que o ciclo da alta de juros [atualmente em 14,25%] está chegando no final. Ainda não sabemos exatamente quando o Banco Central vai parar de subir juros, mas sabemos que cada dia que passa, está mais próximo”, analisa o superintendente de renda variável da SulAmérica Investimentos, Gilberto Nagai.
Nesta segunda, o Ibovespa retrocedeu à casa dos 130 mil pontos nesta primeira sessão da semana, com a cautela externa em torno da quarta-feira, 2 de abril, tratada como o “Dia da Libertação” pelo governo Trump, em referência às tarifas recíprocas prometidas nos Estados Unidos para a data. Aqui, o índice da B3 chegou a recuperar a marca dos 131 mil no meio da tarde, sem força para sustentá-la no fechamento, em baixa de 1,25%, a 130.259,54 pontos. Hoje, oscilou dos 130.114,96 aos 131.900,92 pontos, saindo de abertura em nível quase idêntico ao da máxima, então a 131.900,00.
Com o desempenho desta segunda-feira, o Ibovespa limitou o ganho de março a 6,08%, não superando, dessa forma, a leitura de agosto passado, quando avançou 6,54% e estabeleceu a mais recente máxima histórica, na casa de 137 mil pontos. Até sexta-feira, o índice da B3, em alta superior a 7%, parecia a caminho de seu melhor desempenho desde novembro de 2023, com ganho de 12,54% naquele mês.
Setores e recomendações
Felipe Paletta, estrategista da EQI Research, observa que as empresas do Ibovespa chamadas de cíclicas domésticas — especialmente do setor de consumo e do setor imobiliário — tiveram um desempenho muito positivo em março. Normalmente, diz ele, essas empresas são mais sensíveis à dinâmica da atividade econômica, e essa performance indica uma percepção de melhora no ambiente de investimentos por parte dos investidores.
“Eu atribuo isso a dois componentes principais. O primeiro componente — que eu considero menos relevante nesse momento — é uma leitura de que os investidores já começam a projetar uma dinâmica para 2026 em diante, principalmente para os negócios que estão listados na bolsa”, diz ele. “O segundo componente — que, na minha visão, é muito mais importante — é uma rotação global de capital para países emergentes. Isso está claramente acontecendo, e quando a gente olha o Ibovespa em relação a outros mercados emergentes, como México, Chile e China, a gente observa um desempenho bastante positivo neste ano, acompanhando essa mesma dinâmica global”, acrescenta.
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Magazine Luiza (MGLU3), com alta de +42,22% no mês, Minerva (BEEF3), que avançou +43,31%, JBS (JBSS3), +33,88%, Cogna Educação (COGN3), +35,95%, e Vamos (VAMO3), com ganhos de +13,80%, figuraram entre as empresas que mais subiram, impulsionadas pelo movimento comprador observado ao longo do mês, segundo dados do Ibovespa. Em alguns casos, o desempenho positivo também foi influenciado pela divulgação de resultados financeiros que agradaram o mercado.
Os papéis líquidos que costumam ser preferência dos investidores estrangeiros por conta da maior liquidez e da sólida presença no mercado também tiveram um bom desempenho em março. Ações como B3 (B3SA3), que acumulou ganhos de +16,73%, Localiza (RENT3), +19,54%, Assaí (ASAI3), +12,41%, Lojas Renner (LREN3), +8,23%, e Itaú (ITUB4), +8,10%, apresentaram valorização expressiva, acompanhando o movimento de recuperação do Ibovespa e atraindo fluxo comprador do exterior.
Por outro lado, algumas companhias enfrentaram quedas expressivas no período. Natura (NTCO3), com queda de 22,78,% Azul (AZUL4), com baixa de 14,95%, e Marcopolo (POMO4), com recuo de 16,94%, lideraram as baixas do mês. No caso da Natura, o mercado reagiu negativamente à queda da margem bruta, que ficou abaixo do esperado devido a uma mudança no mix de produtos. A percepção de que a empresa precisará manter promoções agressivas para sustentar a competitividade também pesou sobre os papéis.
Já a Azul viu suas ações caírem em meio a rumores sobre uma possível oferta de capital, o que gerou preocupações adicionais em um contexto de alta do dólar e aumento da concorrência.
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A Marcopolo, por sua vez, registrou queda na produção de ônibus em relação ao ano passado, o que levantou dúvidas sobre o ritmo de crescimento da empresa em um ambiente econômico que tende a desacelerar este ano. O desempenho negativo acabou sinalizando a expectativa de menor demanda no mercado interno, trazendo cautela aos investidores. “Em geral, as empresas que subiram menos que o Ibovespa foram as empresas mais defensivas. E, no caso dessas empresas listadas, a expectativa de resultados futuros foi um pouco revisada para baixo”, explica Nagai.
Completam as maiores baixas em março do Ibovespa a Suzano (SUZB3), -6,27%, Weg (WEGE3), 6,45%, Cemig (CMIG4), 6,30%, e Azzas (AZZA3), 5,77%.
Ele lembra que os bancos, em geral, entregaram bons resultados em março. Empresas de distribuição de energia elétrica e empresas no setor de academia de ginástica apresentaram resultados consistentes e devem continuar performando em abril. Já Paletta aponta que a Prio (PRIO3) segue com perspectivas positivas devido à expansão da capacidade produtiva nos próximos anos. A empresa, segundo ele, vem mantendo margens elevadas e registrando queda no custo de extração (lifting cost), o que abre espaço para valorização adicional. Para o analista, a Eletrobras (ELET3), por sua vez, enfrenta aumento de risco político com a nomeação de Guido Mantega para o conselho, mas mantém uma operação estável, com estoque para venda de energia e preços historicamente altos, fortalecendo uma visão otimista para os próximos dois anos.
A Alupar (ALUP11), conforme Paletta, está colhendo os frutos da retomada dos shoppings, com indicadores operacionais que já superam os níveis anteriores à pandemia, enquanto o desconto atual nos ativos segue atraente frente a negociações recentes de ativos similares. Já a JBS continua chamando atenção pela combinação de margens crescentes e fluxo de caixa forte, somados à expectativa de dupla listagem nos Estados Unidos, que pode ampliar a visibilidade e atrair novos investidores.
Ibovespa em abril
Abril se aproxima com uma série de eventos que podem moldar as perspectivas econômicas tanto interna quanto externamente. No Brasil, especialistas dizem que a atenção está voltada principalmente para a evolução da inflação, que terá papel decisivo na possível queda das taxas de juros. A inflação será fundamental para determinar se o mercado brasileiro seguirá uma tendência de alívio nas taxas, o que poderia impactar diretamente a dinâmica econômica. Abril também marca o início do ciclo de assembleias de empresas, um momento importante para que investidores e analistas acompanhem possíveis novidades no desempenho de setores-chave da economia.
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No cenário político, o Brasil permanece em um momento de incertezas, com debates em torno da reforma tributária e questões relacionadas à aprovação do governo Lula e ao julgamento de Bolsonaro, eventos que podem trazer volatilidade aos mercados. A movimentação política tende a influenciar o comportamento dos investidores, que monitoram de perto a evolução desses processos, uma vez que qualquer mudança no ambiente político pode repercutir nas expectativas econômicas do país.
No plano internacional, um dos eventos mais aguardados é o Dia da Libertação anunciado por Donald Trump para esta quarta-feira (2), quando o presidente dos Estados Unidos promete impor tarifas recíprocas, dólar por dólar, às nações que já cobram impostos sobre produtos americanos. “Essa iniciativa marca um movimento mais agressivo na tentativa de reformular o sistema de comércio global, o que pode afetar diretamente a economia global. Embora Trump defenda que essa estratégia quer reverter a globalização e criar empregos nos Estados Unidos, o impacto sobre os consumidores americanos pode ser maior, elevando os preços e afetando o poder de compra das famílias em um momento de maior aperto econômico”, diz o mestre em finanças pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e especialista em economia e política internacional, Paulo Godoi Filho.
Essas políticas comerciais, conforme Filho, já tiveram efeitos profundos nos mercados financeiros, com perdas bilionárias, como demonstrado pela queda de 700 pontos no Dow Jones Industrial Average na sexta-feira (28). A postura agressiva de Trump também tem gerado fricções com aliados dos Estados Unidos, desafiando alianças internacionais que sustentam o sistema econômico global. “À medida que o prazo de implementação das novas tarifas se aproxima, a falta de clareza nas políticas e as expectativas contraditórias podem aumentar ainda mais a insegurança nos mercados. A promessa de que algumas nações ou indústrias poderiam ser isentas das tarifas, por exemplo, cria mais incerteza, prejudicando ainda mais a confiança necessária para uma recuperação econômica estável”, explica Filho.
Ao mesmo tempo, os estímulos econômicos da China começam a surtir efeito, e o país demonstra sinais de recuperação econômica. A aceleração do crescimento chinês, visível através de indicadores como o índice de mercado de ações CSI 300, traz uma perspectiva positiva para o mercado global, incluindo o Brasil, que se beneficia de uma maior demanda por commodities e da recuperação econômica global, favorecendo o Ibovespa.
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Pouco otimista, Mauricio Valadares, diretor de investimentos da Nau Capital, avalia que o movimento positivo observado no Ibovespa em março não deve se manter ao longo dos próximos meses. “A expectativa é de um crescimento econômico menor neste ano em comparação aos últimos três anos, sugerindo que o desempenho do índice até o final do ano pode enfrentar obstáculos, contrastando com o resultado recente”, pontua.