- Antes da pandemia de Covid-19, a China registrava um crescimento econômico inigualável - uma expansão financiada principalmente por investimentos no setor imobiliário
- Com a desaceleração desse “motor” após a crise sanitária, o país que é o principal mercado de empresas como a Vale (VALE3), está longe da performance de outrora
- A meta de crescimento para 2024, por exemplo, é de “apenas” 5%, um nível modesto dado o histórico. Para atingir esse percentual, o Banco Central da China (PBOC, na sigla em inglês) precisou lançar um “mega” pacote de estímulos econômicos
Antes da pandemia de Covid-19, a China registrava um crescimento econômico inigualável. Ano contra ano, há pelo menos duas décadas a gigante asiática emendava avanços de quase dois dígitos no Produto Interno Bruto (PIB) – uma expansão financiada principalmente por investimentos no setor imobiliário. Com a desaceleração desse “motor” após a crise sanitária, o país que é o principal mercado de empresas como a Vale (VALE3), está longe da performance de outrora.
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A meta de crescimento para 2024, por exemplo, é de “apenas” 5%, um nível modesto dado o histórico. Para atingir esse percentual, o Banco Central da China (PBOC,) precisou lançar um mega pacote de estímulos econômicos.
Divulgadas na última terça-feira (24), as novas medidas econômicas da China incluem permitir que bancos concedam mais crédito para a população, por meio da diminuição dos depósitos compulsórios, além de redução dos juros dos empréstimos imobiliários, redução da entrada mínima para aquisição de imóveis e novos instrumentos no mercado financeiro. Tudo isto em uma tentativa de reanimar o mercado e o setor imobiliário, bastante fragilizado.
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Renato Chanes, analista da Ágora Investimentos, explica que a China costumava investir 16% do PIB na construção civil. Isto fez a oferta de imóveis aumentar muito mais do que a capacidade real de absorver aqueles empreendimentos.
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“A demanda não acompanhou o ritmo da oferta, por causa da renda da população ser mais baixa. A China é um país rico, de população pobre”, afirma o especialista. “O resultado foi o aumento do ‘estoque imobiliário’ e, quando as construtoras não conseguiam mais vender imóveis, a bolha estourou.”
A novidade fez as ações chinesas terem a maior alta semanal desde 2008.
Pacote econômico chinês pode não ser suficiente
Apesar de ser uma notícia positiva no curto prazo, a leitura é de que o novo pacote não deve devolver à China o ritmo de crescimento do passado. Thiago de Aragão, diretor de estratégia da Arko Advice, ressalta que a economia chinesa se tornou um “paradoxo”, já que ao mesmo tempo que ainda é um propulsor importante para o crescimento global, está passando por um momento de grande fragilidade.
“O mercado imobiliário, que foi um dos pilares do crescimento chinês nas últimas décadas, está em crise e isso afeta toda a cadeia produtiva, especialmente materiais básicos como aço e minério de ferro. Além disso, há uma preocupação grande com a desaceleração do consumo interno e a falta de confiança das empresas e famílias para gastar e investir”, afirma Aragão.
Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, também vê uma dúvida razoável sobre a eficácia das iniciativas do Governo. Para ele, o país tem problemas estruturais, que não serão solucionados no curto prazo, como o encolhimento da população e os hábitos dos chineses em relação ao consumo. “A China tem uma população que poupa muito e desconfia do Governo. Uma população que acredita que os governantes estão tentando fazer com que eles gastem mais, que eles consumam mais e (mesmo com os estímulos) isso não tem acontecido. Fora o setor imobiliário, que está extremamente colapsado”, afirma.
Vale e siderúrgicas são beneficiadas, mas no curto prazo
Depois do anúncio do pacote chinês, os preços futuros do minério de ferro e os papéis da Vale (VALE3) saltaram na Bolsa. A VALE3 acumulou alta de 11,5% na semana passada, passando de R$ 57,35 para R$ 63,96, enquanto a commodity subiu 10% no período – e já começou a semana batendo recordes. Somente na madrugada desta segunda-feira (30), o minério subiu 10,7%.
Essa valorização acontece em função da expectativa de que, com os novos estímulos, a China cresça e consequentemente demande mais minério de ferro. Vale lembrar que o país é o principal importador dos insumos extraídos pela mineradora.
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As ações siderúrgicas, como Gerdau (GGBR4), CSN (CSNA3) e Usiminas (USIM5), também saltaram 5,26%, 19% e 6,12%, respectivamente, segundo dados levantados por Einar Rivero, sócio-fundador da Elos Ayta. Para estas, entretanto, o efeito positivo é mais colateral, já que a China não representa o principal mercado dessas companhias. Ainda assim, com o país asiático demandando mais minério e produzindo mais aço, os preços das commodities acabam sendo elevados em cadeia. “Ou seja, maior demanda na China pode ajudar o preço do aço, que é definido globalmente, a subir”, afirma Chanes, da Ágora.
Entretanto, esse impulso positivo nas metálicas deve se restringir ao curto prazo. Por ora, a Ágora Investimentos mantém recomendação de compra para Vale (VALE3), com preço-alvo de R$ 77. A indicação vem devido à sazonalidade positiva para as mineradoras, tanto em função do pacote de estímulos da China, quanto à proximidade do final do ano, que costuma ser um período de maior crescimento da produção de aço e de consumo de minério.
Contudo, a “top pick” da Ágora é a Gerdau, com preço-alvo de R$ 25. A empresa deve continuar a ser beneficiada pelo aumento de demanda por aço vindo do programa “Minha Casa, Minha Vida”, do Governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). As demandas do mercado americano, onde possui produções de aço, também trazem boas perspectivas.
“Os últimos atos que foram aprovados nos Estados Unidos, como a Lei da Redução da Inflação (que prevê investimentos ‘verdes’ em vários setores, como energia renovável) e o Chips Act (lei para fortalecer a indústria de semicondutores), acabam demandando bastante material. Vai ter bastante obra para transformar a economia americana em uma economia mais verde”, diz Chanes.
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Vale e Gerdau também são as principais recomendações da Genial Investimentos no setor de mineração e siderurgia, com preços-alvos de R$ 78,50 e R$ 23,40, respectivamente.
Metálicas possuem desafios maiores do que as incertezas na China
Já para o longo prazo, há muitas reticências em relação às metálicas, especialmente no que diz respeito à mineração. Chanes alerta que entre o final de 2025 e meados de 2026, a mineradora australiana BHP deve iniciar o projeto na mina Simandou, na Guiné. A partir desse depósito, a expectativa é de que a empresa desague pelo menos 100 milhões de minério por ano no mercado. Uma quantidade “abissal”, segundo o analista da Ágora.
“Como a oferta vai crescer de forma significativa, a tendência é de que os preços (do minério de ferro) sejam estruturalmente mais baixos ao longo dos próximos anos”, diz Chanes. “Fora isso, tem todo o debate de descarbonização. Obter ferro a partir da queima do minério de ferro é uma questão poluente, exige ligar altos fornos e emite muito CO2.”
Aragão, diretor de estratégia da Arko Advice, também vê um futuro difícil para o setor. Com as novas necessidades geradas pela transição energética, essas empresas precisarão se adaptar às novas demandas de metais mais “verdes”, como cobre e níquel, essenciais para baterias e energias renováveis. “Então, apesar da euforia de curto prazo, eu ficaria de olho nessas tendências mais de longo prazo”, ressalta o especialista.
Já para Cruz, da RB, a própria guerra comercial no mundo dificulta as atividades. No começo de setembro, por exemplo, saíram notícias de que siderúrgicas americanas estavam pedindo tarifas de importação sobre o aço brasileiro. “Eu vejo que o setor de mineração e siderurgia na bolsa não está com um cenário tão favorável”, afirma.