Após oito pregões seguidos de queda, em que acumulou desvalorização de 4,40%, o dólar subiu na sessão desta quarta-feira (30), mas manteve-se abaixo da linha de R$ 5,70. Dados mais fracos de atividade na China e nos EUA derrubaram preços de commodities, abalando divisas emergentes, em especial as latino-americanas. A moeda encerrou a última sessão de abril com alta de 0,82%, a R$ 5,6766.
Em abril, o dólar caiu 0,50%, o que leva as perdas do ano a 8,15%.
Do lado externo, o dólar perdeu força em abril no mercado global, o que beneficiou o real e outras moedas de países emergentes. O índice DXY, que mede o desempenho da moeda americana frente a uma cesta de moedas fortes, registrou queda superior a 4% em abril. Parte desse enfraquecimento é atribuída à avaliação de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) pode manter os juros inalterados por um período mais longo, em meio a sinais de moderação no crescimento da economia dos Estados Unidos. Com isso, investidores se sentiram mais confortáveis em buscar oportunidades fora do mercado americano, direcionando recursos para regiões com retornos mais atrativos.
Além disso, a diminuição das tensões comerciais entre Estados Unidos e China estimulou o apetite por ativos de risco. O arrefecimento do clima entre as duas potências globais abriu espaço para uma maior movimentação de capital em direção a países em desenvolvimento, ajudando a sustentar a demanda por moedas como o real. No Brasil, os dados de inflação em linha com o esperado e a continuidade do superávit da balança comercial contribuíram para reforçar essa tendência.
Embora o movimento de valorização do real tenha sido influenciado majoritariamente por fatores externos, o comportamento do governo brasileiro também foi monitorado de perto pelos investidores. A adoção de uma comunicação mais técnica em relação à política fiscal ajudou a reduzir a volatilidade do câmbio, ainda que persista uma cautela generalizada com o ambiente político. A combinação de juros reais elevados, equilíbrio comercial positivo e um discurso fiscal menos agressivo criou um ambiente mais favorável para a moeda brasileira no mês.
Investidores devem ficar de olho nos juros nos EUA
A política monetária dos Estados Unidos segue como um dos principais motores para o comportamento do dólar frente ao real. Arthur Barbosa, analista da Aware Investments, lembra que, neste ano, o Fed tem mantido uma abordagem cautelosa, evitando qualquer indicação concreta de cortes na taxa de juros, atualmente no intervalo de 4,25% a 4,50%. O presidente do Fed, Jerome Powell, tem reiterado a necessidade de observar com atenção os dados econômicos antes de qualquer mudança na condução da política monetária. Com isso, o dólar permanece sustentado, especialmente diante da possibilidade de uma inflação mais persistente que o previsto.
No curto prazo, qualquer dado que aponte para uma economia americana mais aquecida tende a provocar ajustes rápidos nos mercados, com os investidores retirando recursos de países emergentes, como o Brasil. Dados de inflação e emprego nos Estados Unidos são acompanhados de perto por analistas e operadores por funcionarem como gatilhos imediatos para o movimento do dólar. A simples sinalização de que o Fed pode adiar cortes ou até cogitar novas altas já é suficiente para alterar o fluxo de capitais e pressionar moedas como o real.
Embora o dólar siga beneficiado pelo conservadorismo do Fed, outros elementos vêm favorecendo a moeda brasileira. A expectativa de aumento na taxa básica de juros no Brasil amplia o diferencial entre as economias, o que atrai investidores estrangeiros em busca de retornos mais altos. “A expectativa é de uma ou duas elevações adicionais na taxa Selic, com projeções apontando que a taxa básica possa chegar a até 15%, marcando o fim do atual ciclo de alta. Esse aumento no diferencial de juros entre as duas economias torna o Brasil mais atrativo para investidores estrangeiros, favorecendo o ingresso de capital externo e contribuindo para a valorização do real”, diz Barbosa.
Meta fiscal sob escrutínio mantém pressão sobre o câmbio
O debate sobre a política fiscal adotada pelo governo federal tem ganhado força nos últimos meses e se tornou um dos principais fatores de atenção entre investidores que acompanham o comportamento do câmbio. A meta para 2025, que prevê déficit zero com uma margem de tolerância de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), foi reafirmada pela equipe econômica, mas o mercado ainda avalia com cautela a viabilidade do cumprimento desse objetivo.
Há uma percepção mais construtiva – embora não consensual entre analistas – sobre as contas públicas brasileiras. São favorecidas por declarações recentes de membros do governo com tom mais técnico e comprometido com o controle fiscal.
A mais recente edição do Boletim Focus projeta um déficit de –0,60% do PIB no próximo ano, alimentando dúvidas sobre a capacidade do governo de manter o compromisso fiscal. Com isso, qualquer sinalização que indique mudanças nessa trajetória pode afetar a confiança dos agentes econômicos e provocar uma reação imediata na cotação do dólar. O mercado deve voltar suas atenções nos próximos dias à divulgação do resultado primário de março e à evolução da relação dívida/PIB, dois dados considerados estratégicos para medir a saúde das contas públicas.
A tramitação de medidas no Congresso ligadas ao novo arcabouço fiscal, à regulamentação da reforma tributária e à busca por fontes adicionais de receita também permanece no radar dos investidores. O comportamento da moeda americana frente ao real tem sido influenciado diretamente por essas discussões, sobretudo em momentos de tensão política ou indefinição sobre a governabilidade.
Para Mariana Conegero, especialista em investimentos e sócia da The Hill Capital, a percepção de risco pode aumentar de forma acelerada caso haja sinais de flexibilização da meta estabelecida. “Se o governo sinalizar uma flexibilização da meta ou maior tolerância com déficits, o mercado vai reagir e o dólar também. Qualquer ruído envolvendo a autonomia do Banco Central, aumento de gastos fora do teto ou desentendimentos entre Executivo e Congresso pode gerar incerteza e fuga de capital. O investidor estrangeiro ainda vê o Brasil como uma aposta de risco elevado – por isso, qualquer instabilidade política pesa”, afirma.
O Banco Central pode intervir no mercado cambial para garantir a estabilidade e evitar momentos de volatilidade excessiva, utilizando instrumentos como a venda direta de dólares das reservas internacionais, empréstimos em moeda estrangeira e swaps cambiais, segundo João Duarte, especialista em câmbio da One Investimentos. Em maio, eventos relevantes como a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, prevista para a próxima semana, podem influenciar o câmbio.
O resultado mais provável, segundo o painel de probabilidades, é de elevação da Selic entre 0,25 e 0,50 ponto percentual. Caso o Banco Central opte por uma decisão fora dessas expectativas, isso pode gerar movimentos mais acentuados na moeda e levar a novas intervenções. “Embora o cenário atual não exija atuação constante, eventuais episódios de estresse no mercado ou deterioração do ambiente externo podem levar o BC a intervir, com o objetivo de preservar a estabilidade financeira e cambial”, explica Duarte. “A primeira atuação do BC ocorreu em janeiro, e não descarto novas rodadas se a volatilidade aumentar agora em maio”, completa Conegero.
Projeções do câmbio para maio
As projeções para o dólar apontam para um mês marcado por oscilações dentro de uma faixa relativamente ampla. Segundo dados da Bloomberg de terça-feira (29), a expectativa é de que a moeda norte-americana fique entre R$ 5,4550 e R$ 5,9205 até o fim do mês, com 74,2% de probabilidade de se manter dentro dessa banda, considerando um desvio padrão.
Especialistas dizem que as estimativas para o câmbio variam de R$ 5,60 a R$ 5,70 em maio, com possibilidade de alta caso fatores externos se agravem. A recente queda do dólar no fim de abril, quando a moeda encerrou o mês em R$ 5,63, foi interpretada por parte do mercado como um movimento mais técnico, ligado à atuação de investidores e ajustes pontuais, do que uma mudança sustentada nos fundamentos.
“A tensão fiscal segue no radar, e o diferencial de juros entre Brasil e Estados Unidos está menor do que no ano passado. Por isso, minha leitura é de que o dólar tende a continuar volátil, com resistência forte abaixo de R$ 5,50. Para quem tem exposição cambial, este é um bom momento para avaliar proteções”, avalia Conegero.
No Boletim Focus, a estimativa para a taxa de câmbio no fim de 2025 foi mantida em R$ 5,90. Para o fim de 2026, houve uma leve revisão para baixo, de R$ 5,96 para R$ 5,95, o que indica que o mercado ainda vê poucos motivos para uma valorização duradoura do real nos próximos dois anos.