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CVM diz que Barsi negociou quantidades ‘atípicas’ de ações da Unipar

Órgão alega que ele usou informações privilegiadas para comprar ações da fabricante de petroquímicos Unipar

CVM diz que Barsi negociou quantidades ‘atípicas’ de ações da Unipar
Luiz Barsi Filho, o Warren Buffett brasileiro (Foto: Alex Silva/Estadão Conteúdo)
  • Após a abertura do PAS pela CVM ser revelada pela imprensa, no último dia 16, Barsi afirmou, em nota, que a investigação ainda é um “procedimento de apuração” e ressaltou que tem “plena convicção que nada de errado foi praticado
  • Segundo o termo de acusação, no curso das investigações, foram identificadas grandes operações de compra por parte de Barsi em 28 de maio de 2021
  • Para sustentar a atipicidade das operações, a CVM diz que as compras daquele dia foram as primeiras feitas pelo investidor em quase um ano - o movimento anterior tinha sido registrado em 1 de junho de 2020

Ao acusar Luiz Barsi, maior investidor pessoa física da B3, de usar informações privilegiadas para comprar ações da fabricante de petroquímicos Unipar, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o órgão regulador do mercado, destacou que, na operação em questão, foi adquirida uma quantidade “bem superior” à média negociada pelo acusado em papéis da companhia, a 11ª maior compra diária já realizada por ele.

Para obter essa média e comparar, a CVM levantou todas as negociações de Barsi com papéis da Unipar de janeiro de 2015 a meados de 2021, segundo o termo de acusação, ao qual o Estadão/Broadcast teve acesso, após pedir vistas do processo administrativo sancionador (PAS). Procurado pelo E-Investidor, Barsi nega todas as acusações.

Após a abertura do PAS pela CVM ser revelada pela imprensa, no último dia 16, Barsi afirmou, em nota, que a investigação ainda é um “procedimento de apuração” e ressaltou que tem “plena convicção que nada de errado foi praticado”. “Estou e sempre estive à disposição das autoridades, cujo procedimento corre na esfera administrativa e ainda está em fase inicial”, diz a nota, publicada nas redes sociais da filha de Barsi, Louise Barsi.

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A investigação, iniciada a partir de movimentações tidas como atípicas nas negociações das ações da Unipar, se debruça sobre operações feitas antes da divulgação de um fato relevante pela companhia em 2 de junho de 2021. No documento, a Unipar informou ter celebrado com a Compass Minerals um acordo de confidencialidade para “analisar informações para uma possível operação” entre as duas empresas.

O fato relevante foi divulgado à noite, após o jornal “Valor Econômico” ter informado, naquele dia, que a Unipar estaria perto de fechar com a Compass Minerals a compra de uma fábrica de cloro-soda, por R$ 300 milhões. Com a notícia, a ação ON (ordinária, com direito a voto) subiu 12,73% naquele pregão, para R$ 73,14. O papel preferencial (PN, sem direito a voto) subiu 11,76%, para R$ 78,12.

Ao analisar a evolução das cotações em torno da data da revelação da possível aquisição da fábrica, a CVM avalia que “o mercado reagiu positivamente à informação” e ressalta que, apesar disso, “as oscilações atípicas de preços e quantidades negociadas” em ações da Unipar começaram alguns dias antes, a partir de 27 de maio, conforme parecer técnico anexado ao processo sancionador.

Daí a suspeita de que a negociação para comprar a fábrica tenha sido utilizada como informação privilegiada, o que justificou a continuidade das investigações.

Antes mesmo da divulgação do fato relevante sobre as negociações em torno da compra da fábrica, a B3 já havia identificado as oscilações atípicas e pediu explicações à Unipar. Em 1º de junho de 2021, a empresa divulgou comunicado ao mercado para responder à B3, informando que “após inquirir os seus administradores e acionistas controladores, com o objetivo de averiguar se estes têm conhecimento de informações que deveriam ser divulgadas ao mercado, informa que não tem conhecimento de nenhum fato ou ato relevante que possa ter justificado a oscilação de referidas ações nos pregões acima mencionados”.

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Segundo o termo de acusação, no curso das investigações, foram identificadas grandes operações de compra por parte de Barsi, em 28 de maio de 2021. Para sustentar a atipicidade das operações, a CVM diz que as compras daquele dia foram as primeiras feitas pelo investidor em quase um ano – o movimento anterior tinha sido registrado em 1 de junho de 2020. Além disso, “o volume negociado de posse de informação privilegiada foi bem superior a sua média histórica desde 2015”. Entre 1º de janeiro de 2015 e 28 de maio de 2021, as compras da última data representam “o 11º maior volume diário negociado até então pelo administrador”, diz o termo de acusação.

Na nota divulgada logo após a revelação da existência do processo, Barsi ressalta que as operações feitas por ele na ocasião “ocorreram FORA (sic) do período de silêncio” e, portanto, são “lícitas, como previsto pela Resolução da CVM nº 44/21”. Além disso, argumentou o investidor, os valores envolvidos são “extremamente imateriais” na comparação tanto com sua participação na empresa quanto com o volume médio diário negociado. Por fim, alegou Barsi na nota, “foram operações EXCLUSIVAMENTE (sic) de compra, como sempre preconizei, portanto, sem evidência de qualquer venda ou lucro auferido”.

Para reforçar o posicionamento de que não houve qualquer irregularidade nas operações, Barsi ressaltou sua estratégia de investimentos, renomada no mercado, de manter posições de longo prazo, com foco no recebimento de dividendos.

“Sou acionista cativo da companhia há mais de 10 anos, além de atuar como conselheiro de administração. Como todos publicamente sabem, minha carteira é formada por décadas de investimento em bolsa de valores, sempre com um viés de compra para proporcionar uma renda financeira através dos dividendos. Em outras palavras, não tenho ativos de curto prazo, muito menos com o propósito direto de me beneficiar da rápida valoração de qualquer ativo, já que raramente vendo minhas posições”, diz a nota de Barsi.

Na defesa prévia incluída no termo de acusação, o investidor destaca ainda que as compras de 28 de maio de 2021 foram feitas em seguida à divulgação, no dia anterior, de aviso aos acionistas da Unipar sobre a distribuição de dividendos. Conforme o aviso, a companhia pagaria R$ 250 milhões referentes à distribuição antecipada de dividendos do exercício de 2021. Fariam jus aos dividendos os acionistas que tivessem os papéis em 1º de junho de 2021.

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“É de conhecimento geral do mercado e desta Autarquia que distribuição de dividendos é um dos principais direcionamentos estratégicos que tenho levado em consideração na composição do meu portfólio de investimentos nos últimos 50 anos. Este é o único motivo pelo qual os negócios do dia 28 de maio foram realizados e como se observa, foi a única movimentação realizada em todo mês de maio e, portanto, totalmente desconexa das informações contidas no Fato Relevante de 2 de Junho de 2021”, diz a defesa prévia de Barsi.

Segundo o termo de acusação, a CVM refutou o argumento. Para o órgão regulador, é “notório que a distribuição dos dividendos, em regra, não tem o condão de impactar as cotações dos ativos”. Por sua vez, a compra da fábrica revelada pela imprensa e tratada no fato relevante de 2 de junho de 2021 seria “capaz de impactar o fluxo de caixa futuro da companhia e, portanto, a cotação dos papéis de sua emissão e a decisão de negociar esses papéis”. Em ofício à CVM, a Unipar informou que, na qualidade de membro do conselho de administração e acionista, Barsi foi informado das negociações sobre a compra da fábrica em novembro de 2020 – portanto, para a acusação, o investidor detinha a informação privilegiada.

A CVM também refutou o argumento de Barsi de que, como as operações foram apenas de compra, sem venda subsequente, não obteve qualquer lucro nas negociações. Para a acusação, a jurisprudência dos julgamentos de processos administrativos semelhantes pelo órgão regulador indica que o sucesso em obter lucro na operação não é condição necessária para caracterizar o uso de informação privilegiada. Ou seja, bastaria a intenção de obter a vantagem, realizando a operação de posse da informação privilegiada, para caracterizar a irregularidade.

Além disso, para a acusação da CVM, se Barsi deixasse para comprar as ações no pregão seguinte ao que foi marcado pela revelação da negociação para comprar a fábrica, o valor despendido por ele seria maior, o que “demonstra uma vantagem financeira com o uso indevido de informação privilegiada”.

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