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A fusão e a queda de uma montadora americana de carros elétricos

Empresa era vista como promissora por Trump, mas o antigo ex-executivo do Goldman Sachs provou o contrário

A fusão e a queda de uma montadora americana de carros elétricos
Foto: Carlo Allegri/Reuters
  • Lordstown passou a ter suas ações negociadas na Bolsa em outubro por meio de uma fusão com a empresa de aquisição com fins especiais, pertencente a Hamamoto, a DiamondPeak Holdings
  • Os pequenos investidores começaram a acumular ações da Lordstown após a fusão, atraídos pela onda em torno dos veículos elétricos
  • Agora a Lordstown está em dificuldades. Os órgãos reguladores investigam se o seu fundador, Steve Burns, que se demitiu do cargo de diretor executivo em junho, exagerou as declarações sobre encomendas dos seus veículos

(Matthew Goldstein e Emily Flitter, The New York Times) – O tempo estava se esgotando para David Hamamoto. Era o mês de junho de 2020 e Hamamoto, antigo executivo do Goldman Sachs que depois passou a investir em imóveis, estava em busca de uma companhia para abrir seu capital por meio de uma fusão com sua empresa de fachada, conhecidas como SPACs (Companhias com Propósito Específico de Aquisição, em português) muito populares nos Estados Unidos.

Ele levantou US$ 250 milhões junto a investidores importantes de Wall Street, incluindo a BlackRock, empresa de gestão de ativos, e passou mais de um ano examinando outros 100 alvos potenciais. Se não conseguisse fechar um acordo em breve, teria de devolver o dinheiro.

Então, nove meses antes do prazo, os banqueiros do Goldman ofereceram a Hamamoto uma possibilidade sedutora: uma fusão com a Lordstown Motors, uma fábrica incipiente de caminhões elétricos que o ex-presidente Donald Trump elogiou como uma salvadora de empregos. Rapidamente foi realizada a fusão e em seguida veio a debacle que colocou duas das maiores forças do mundo financeiro em rota de colisão.

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A Lordstown passou a ter suas ações negociadas na Bolsa em outubro por meio de uma fusão com a empresa de aquisição com fins especiais, pertencente a Hamamoto, a DiamondPeak Holdings. Uma inovação em Wall Street, essas empresas denominadas SPACs, muito em moda, levantaram mais de US$ 190 bilhões de investidores desde o início de 2020, segundo a SPACInsider. Ao mesmo tempo, os pequenos investidores se tornaram uma força poderosa nos mercados, levando a um aumento dos preços das ações de empresas como GameStop e também das ações dessas SPACs, que são extremamente especulativas e apresentam riscos financeiros.

E com a Lordstown essas forças acabaram colidindo, deixando clara as desigualdades entre Wall Street e Main Street. Os pequenos investidores começaram a acumular ações da Lordstown após a fusão, atraídos pela onda em torno dos veículos elétricos. Foi exatamente quando a BlackRock e outros grandes investidores de Wall Street, que haviam comprado no início, antes da fusão, ações a um preço barato, começaram a vender parte das suas participações.

Agora a Lordstown está em dificuldades. Os órgãos reguladores investigam se o seu fundador, Steve Burns, que se demitiu do cargo de diretor executivo em junho, exagerou as declarações sobre encomendas dos seus veículos. A pressão sobre Hamamoto aumentou. A companhia gastou centenas de milhões de dólares em dinheiro. O preço das suas ações despencou de US$ 31 para US$ 9. Os investidores estão processando a empresa, e um deles é George Troicky, de 70 anos de idade, que perdeu US$ 864.201 de investimento feito, segundo a ação coletiva em curso.

E a Lordstown nem começou a produzir seu primeiro caminhão.

A presunção de um comprador

Nascido no Havaí, Hamamoto começou sua carreira no Goldman Sachs, onde ajudou a gerir as empresas de investimento imobiliário do banco, conhecidas como fundos Whitehall Street. E se tornou um dos mais jovens sócios do Goldman antes de fundar seu próprio negócio em 1997. Hamamoto, 61 anos, adquiriu ou operou hotéis, prédios de escritórios e casas de repouso, e acabou se unindo a outros para fundar uma empresa de investimento imobiliário, a NorthStar Investment.

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Stephen Cummings, que conhece Hamamoto há 15 anos e participou da diretoria de uma das empresas dele, disse que o investidor “foi bem-sucedido porque é uma pessoa inteligente, criativa e muito confiável” e sempre atuou em benefício dos interesses de todos os seus acionistas.

Em 2017, a NorthStar fez uma fusão com a Colony Capital, empresa administrada pelo aliado de Trump, Thomas J. Barrack Jr., criando uma empresa com US$ 58 bilhões de ativos. Hamamoto deixou a companhia no ano seguinte, vendendo suas ações no valor de US$ 27 milhões.

No início de 2019 fundou a sua SPAC, a DiamondPeak, com a intenção de fundir a empresa com uma companhia imobiliária. Na época em que a Goldman indicou a Lordstown para ele, a equipe de Hamamoto havia perdido várias outras oportunidades, segundo uma pessoa familiarizada com o assunto.

Ele estava ansioso para fechar um acordo.

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Junto com membros da sua equipe e executivos do Goldman, Hamamoto fez pelo menos duas visitas à fábrica da Lordstown em Lordstown, Ohio, para se encontrar com Burns, em junho de 2020, de acordo com documentos em mãos dos órgãos reguladores. A empresa também compartilhou informações adicionais sobre ela própria com a Diamond Peak.

Como tinha pouco conhecimento de veículos elétricos, ele contratou a McKinsey para avaliar se a tecnologia que a Lordstown havia licenciado de outros poderia ser reunida para a fabricação de um caminhão elétrico. A consultora informou que a tecnologia era viável e o acordo foi firmado em questão de semanas.

Promessas não cumpridas

Burns, que se imaginava o próximo Elon Musk, era conhecido como uma pessoa persuasiva, hiperbólica, disseram funcionários da Lordstwon.

No lançamento do caminhão Endurance, em 25 de junho de 2020, com a participação de Hamamoto e executivos do Goldman, Burns teria dito que a empresa já tinha 20 mil promessas de compra do seu caminhão e pretendia começar a produzir o veículo no verão de 2021. Em novembro Burns afirmou que havia 50 mil encomendas “sérias” e em janeiro esse número subiu para 100 mil.

Embora ele tivesse dirigido uma empresa de capital aberto, a startup de carros elétricos Workhorse Group, sua atuação ali foi irregular. Burns, 62 anos, deixou a Workhorse em fevereiro de 2019 para ir para a Lordstown, deixando para trás anos de prejuízos e uma empresa que produziu apenas algumas centenas de veículos. Na Workhorse ele com frequência apregoava a viabilidade de um helicóptero híbrido elétrico chamado Surefly – que nunca provou ser viável comercialmente.

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Nem Hamamoto e nem seus representantes conversaram com os executivos da Workhorse sobre a gestão de Burns ou o que o levou a se demitir repentinamente e mais tarde abrir a fábrica de Ohio. A General Motors vendeu sua fábrica para Burns em novembro de 2019 por US$ 20 milhões, suscitando elogios de Trump ao fundador da Lordstown.

Erik Gordon, professor de administração de empresas na Universidade de Michigan, disse que Hamamoto tinha obrigação de checar todos os aspectos da Lordstown antes de fechar o acordo, incluindo a capacidade de Burns de administrar uma grande companhia com ações negociadas em Bolsa.

“Boa tecnologia não é suficiente”, afirmou Gordon. “Dar a Hamamoto adornos para checar a tecnologia, mas não checar quem está no comando é uma falha incrível em termos de uma diligência prévia”, Um representante de Hamamoto declarou que “a DiamondPeak fez uma extensa averiguação da Lordstown”.

No início de agosto, notícias da fusão da DiamondPeak e a Lordstown levaram a uma alta de 20% das ações das SPACs. Pequenos investidores, que se tornaram negociantes ativos no mercado acionário nos últimos anos, estavam entre aqueles impulsionando a alta dos preços.

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Um deles era Maximilian Lawrence, artista e professor do ensino médio na Filadélfia. Lawrence, 46 anos, disse que acreditava que a Lordstown teria sucesso por causa do apoio implícito da GM – que até então havia investido US$ 75 milhões na empresa – e ele a mantinha como “ativo de longo prazo” em sua carteira.

No final de setembro, Burns exibiu um protótipo do caminhão Endurance na Casa Branca – num evento do qual Trump participou. Entre outubro – quando a companhia começou a negociar na NASDAQ, com o ticker RIDE, e o mês de março, o valor de suas ações continuou a subir.

Com as ações da Lordstown sendo negociadas a US$ 18 em novembro, George Troicky, investidor independente de Cleveland, aderiu com entusiasmo e continuou a comprar ações nos meses seguintes. Troicky, que perdeu quase US$ 1 milhão dos seus investimentos, declarou na ação que moveu contra a empresa que baseou sua decisão “na minha própria pesquisa de informações publicamente disponíveis”. Recentemente um juiz federal aprovou Troicky como principal demandante na ação coletiva em curso.

Venda de ações

Ao mesmo tempo, alguns investidores iniciais e executivos da Lordstown aproveitaram a oportunidade para vender suas ações. BlackRock, que originalmente tinha pouco mais de 2% da empresa combinada, tinha 1% em março. Millennium Management, empresa de fundos de hedge, e a Fidelity, companhia de fundos mútuos, também reduziram suas participações.

Em fevereiro, o presidente da Lordstown e seu antigo diretor financeiro estavam entre os que venderam US$ 8 milhões em ações. Alguns meses antes outros familiarizados com a empresa também venderam US$ 3 milhões de ações. Uma comissão especial da diretoria da Lordstown examinou as vendas de ações e disse não ter encontrado nada impróprio.

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Também em fevereiro, a Comissão de Valores Mobiliários (SEC) iniciou uma investigação da Lordstown com relação a declarações feitas por Burns sobre perspectivas de venda da companhia. Recentemente, promotores federais em Manhattan começaram sua própria investigação.

Burns e outro executivo do alto escalão da empresa renunciaram depois que a diretoria começou a investigar as declarações da empresa sobre encomendas de caminhões. Duas pessoas conhecedoras do assunto disseram que Burns já estava avaliando um novo empreendimento.

Hamamoto continua na Lordstown, mas criou uma nova empresa de fachada na qual o grupo BlackRock novamente é investidor.

 

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