- A pane, que tirou do ar por 7 horas o WhatsApp, Instagram e Facebook, fez desabar as ações da empresa de Mark Zuckerberg na Nasdaq
- No médio e longo prazo, o 'apagão digital' não deve ter reflexos nos papéis
- Entretanto, os especialistas consultados pelo E-Investidor divergem sobre as perspectivas para a gigante da tecnologia
Eram por volta das 13h da última segunda-feira (4), quando as mensagens enviadas pelo WhatsApp pararam de ser entregues entre os usuários do aplicativo de mensagens instantâneas. Imediatamente, o Instagram passou a não carregar mais as fotos ou stories e, quem correu para o ‘Face’ com alguma esperança de se manter conectado, percebeu que a plataforma também não estava funcionando.
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Longe de ser uma pane rápida, como ocorreu em outras ocasiões, as redes sociais ligadas ao famoso Mark Zuckerberg ficaram sete horas fora do ar no mundo todo. O assunto entrou no ‘trend topic’ do Twitter, uma das plataformas concorrentes e que continuou em pé durante o apagão digital. Na Nasdaq, os papéis do Facebook (FB) desabaram 4,89% durante o pregão, aos US$ 326,23, o que representou uma perda de US$ 7 bilhões (R$ 38 bilhões) na fortuna do empresário.
Inicialmente, os temores de um ataque hacker ou de um roubo de dados preocuparam os investidores. Contudo, logo a situação foi esclarecida. “Na verdade foi um problema no servidor interno do Facebook. Alguma coisa no back-end deles ou no roteador fez com que o endereço desaparecesse por algumas horas”, afirma Pedro Bertelli, analista de investimentos da Geo Capital, gestora especializada em ações globais.
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Mesmo não sendo aparentemente algo grave, a falha incomodou usuários do mundo todo, principalmente aqueles que utilizam as redes para trabalhar – uma base que foi expandida a partir da maior adoção do home office durante a pandemia. O Procon de São Paulo chegou a notificar o WhatsApp pela ‘prestação deficiente dos serviços’.
Se por um lado, a queda dos apps provocou temores e um certo nível de caos, por outro mostra a força do Facebook (enquanto empresa) e justifica o apelido de ‘big tech’.“Pensando como investidores e no longo prazo, isso demonstra o poder que a empresa tem no dia a dia das pessoas e quão importante ele é em várias interações sociais que temos, seja nas redes, ou na parte de pagamentos, que eles estão começando a entrar agora, ou em business”, afirma Bertelli.
Para o médio e longo prazos, os efeitos dessa ‘pane’ nas ações do Facebook devem ser bem diminutos. “Um impacto pequeno, para não dizer nenhum”, afirma Bertelli. Essa também é a visão de Rodrigo Lima, analista de investimentos e editor de conteúdo da Stake, corretora internacional.
“O mercado se comporta um pouco como se estivesse em uma ‘briga de bar’, ou seja, bate primeiro e pergunta depois. Não é como se o Facebook, por conta daquela falha, tivesse se tornado uma empresa 6% pior, que foi o nível que ela chegou a cair no pregão de segunda-feira, e depois fechou em baixa de 4,8%”, afirma Lima. “A grande questão é que o Facebook não passa por um momento fácil, por uma série de fatores.” Mas o futuro da gigante fundada por Zuckerberg não é unanimidade entre os analistas.
‘Too big’ para surpreender
De acordo com o balanço do segundo trimestre de 2021, o Facebook tem uma base de usuários ativos mensais de 2,9 bilhões. No planeta Terra, a população total estimada é de 7,7 bilhões, o que significa que a companhia tem pouco espaço a conquistar.
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“Eles não conseguem expandir, não tem como prometer alcançar 7 bilhões de usuários aos investidores”, afirma Lima, da Stake. “O que eles tem que tentar é aumentar a recorrência desses usuários e fontes das receitas, mas ultimamente o Facebook está passando por uma série de escrutínios regulatórios no mundo todo.”
As big techs chinesas, por exemplo, estão sofrendo forte intervenção regulatória de Pequim, que teme perder o controle sobre os dados da população. Aliás, as informações dos usuários são um dos pontos que geram discussão em países do mundo todo sobre a atuação das empresas de tecnologia’. Também no início da semana, por exemplo, foi descoberto que hackers vinham anunciando a venda de 1,5 bilhão de dados de usuários em um fórum, segundo dados do site Privacy Affairs.
Recentemente, uma ex-gerente de produtos do Facebook, Frances Haugen, vazou dados internos da empresa para a imprensa internacional. Segundo ela, a companhia de tecnologia sabia de danos psicológicos causados pelo uso das redes sociais, além de propositalmente demorar para restringir a disseminação de fake news e discursos de ódio entre seus usuários. O objetivo seria economizar dinheiro.
“Por mais que o ocidente não pense em ter uma regulação extremamente proibitiva como na China, há uma série de escândalos. E mesmo sem escândalos, o poder dessas big techs em questão de acesso, censura à informação e dispersão de fake news, preocupa não só os governos, mas os civis”, explica Lima. “Isso não significa que devamos banir o Facebook, mas com certeza a empresa passará por algum escrutínio regulatório.”
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Esses empecilhos podem ser observados no caixa, de mais de US$ 64 bilhões. Geralmente, as companhias de tecnologia reinvestem este capital de maneira agressiva, visando crescimento. Para Lima, esse caixa parado transmite ao mercado que a empresa de Zuckerberg não sabe qual o caminho para crescer.
“O que o Facebook vai fazer com esse dinheiro? Não irá conseguir comprar empresas como o TikTok, que é um dos maiores concorrentes e vem crescendo vertiginosamente no mundo todo”, afirma o analista da Stake. “Eles até tentaram atacar por outras tangentes, mas até agora nada muito promissor.”
Nos últimos meses, o Facebook tentou monetizar o WhatsApp, criar a Libra, criptomoeda da rede social, além do óculos de realidade virtual. Todas as iniciativas ainda não se consolidaram no mercado. Agora, a novidade é o óculos que filma e grava stories, mas que já estaria enfrentando algumas barreiras regulatórias.
“Os órgãos de regulação europeus não estão gostando do fato de as pessoas serem gravadas sem que consigam perceber isso”, explica Lima. “Enfim, não acredito que a queda dos serviços por si irá afetar a empresa no longo prazo, mas foi ruim, e eles vão ter que rebolar para retomar a credibilidade de que ainda podem crescer e aumentar a geração de caixa.”
‘Too big’ para decepcionar
Já para Bertelli, da Geo Capital, o Facebook é o tipo de companhia que é grande demais para desandar. Mesmo face os desafios em torno da regulação e polêmicas sobre o uso de dados, a companhia seria tão consolidadora que dificilmente perderá um grande share no mercado.
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“Aqui na Geo acompanhamos a empresa há quase sete anos e muitas vezes teve essa discussão sobre a privacidade de dados. Já teve processos em que o órgão regulador americano tentou processar o Facebook, a empresa já foi multada e agora tem um ruído muito grande em relação a esse testemunho (da ex-funcionária)”, afirma Bertelli.
O analista da Geo explica que, apesar desses embates relacionados a como o Facebook trata os dados dos usuários, o fato é que a empresa investe bilhões de dólares em segurança e se move em direção a ser mais transparentes nos processos.“Uma das que mais investe em segurança no mundo”, afirma Bertelli. “A opinião que temos é que ela é uma excelente empresa e que, do médio para o longo prazo, estamos bem confiantes com a capacidade do Mark de entregar um bom trabalho.”
Arthur Siqueira, sócio e analista de investimentos da Geo Capital, ressalta que as big techs surfaram bons resultados durante a pandemia com a digitalização das economias, com o aumento do gasto com propaganda via mídias sociais. “A medida que essas empresas vão ficando muito grandes, agregando pessoas e criando um efeito de rede, elas vão retroalimentando suas vantagens competitivas. Então eu olharia para aquelas empresas que estão construindo negócios que daqui a cinco anos serão ainda mais relevantes”, explica.
Um desses negócios inovadores seria a própria forma de oferecer serviços de marketing digital criada pelo Facebook, com os anúncios patrocinados e demais ferramentas. “Está trazendo para a economia digital muitas empresas que antes não conseguiam pagar esse marketing pelos meios tradicionais”, explica Siqueira. “E agora, pela rede social conseguem fazer marketing de forma bem direcionada e precisa. O Facebook está criando um business em que eles são os donos.”
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Empresas como Alphabet (dona do Google, Youtube e Android) e Microsoft, também estariam criando novos mercados. No caso da empresa de Bill Gates, o diferencial está na criação de toda uma infraestrutura de TI, antes reservado a quem tinha muito capital, e que agora pode ser utilizada por usuários comuns. Para Siqueira, construindo novos negócios, essas big techs têm maior probabilidade de serem donas dos mercados daqui a cinco anos.
Na visão de Lima, da Stake, o investidor tem que estar de olho nos ativos e analisar a questão da ‘outperformance’, ou seja, qual deles tratá maiores resultados que a média do mercado. “O investidor tem que se questionar: o que o Facebook pode fazer para continuar crescendo? Eu acho que o Facebook deve performar melhor que as demais companhias de tecnologia, de agora para o futuro? Caso não (acredite nisso), você compra um ETF de tecnologia e assim captura os crescimentos das empresas de tech. Se você não achar que o Facebook vai performar melhor que Google, Amazon ou Netflix, não há razão para investir.”