O movimento ocorre após o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ao lado do Ministro da Educação, Camilo Santana, assinar na segunda-feira (19) o Decreto nº 12.456/2025, que regulamenta a Nova Política de Educação a Distância (EAD) no Brasil. Entre as regras atualizadas, uma determina que os cursos de Medicina, Direito, Enfermagem, Odontologia e Psicologia deverão ser ofertados exclusivamente no formato presencial.
Em relatório, o BTG Pactual avalia que uma mudança de impacto envolve a forma de distribuição do conteúdo EAD: 80% das atividades poderão ser on-line (assíncronas), 10% deverão ser presenciais e 10% obrigatoriamente síncronas (ao vivo). “Essa última exigência não existia anteriormente, o que deve aumentar os custos com docentes para as instituições”, destaca o banco.
Na avaliação do banco, o novo marco regulatório também provavelmente proibirá o uso de plataformas white-label (terceirizadas), já que todo o conteúdo deverá ser produzido internamente pelas instituições e não por empresas terceiras. “Instituições menores, que já representam uma minoria no segmento de ensino a distância, provavelmente enfrentarão dificuldades para manter sua presença no setor”, afirma.
As novas regras serão implementadas de forma gradual, com as instituições tendo até dois anos para aplicar totalmente as mudanças. Os estudantes atualmente matriculados em cursos EAD poderão continuar seguindo as regras atuais.
Como as novas regras de EAD afetam o setor?
De acordo com o BTG, apesar de as mudanças já serem aguardadas e do período de transição para a implementação total, o novo marco regulatório tende a ser negativo para o setor. “Ele aumenta os custos com docentes em um segmento que historicamente tem dificuldades para repassar a inflação de custos nas mensalidades. É evidente que as instituições mais expostas ao EAD deverão ser mais impactadas do que as demais”, afirma.
Acillo Marinello, sócio-fundador da Essentia Consulting, reflete que os alunos podem perder o interesse pelos cursos devido à obrigatoriedade de fazer aulas presenciais. “Alguns alunos buscam EAD justamente porque não têm condições de fazer uma aula presencial devido a questões pessoais. Como parte das aulas vão ter que ser num espaço físico, a medida também corre o risco de excluir possíveis alunos que vivem em regiões sem polos presenciais disponíveis”, alerta.
A XP Investimentos, por sua vez, entende que a definição do novo marco regulatório é um passo importante para abrir caminho para que as empresas de educação definam suas estratégias daqui para frente, eliminando uma incerteza relevante no setor. A corretora enxerga, porém, que as mudanças anunciadas tendem a elevar os custos e também a limitar a oferta de cursos novos e já existentes. “Um período de transição de dois anos deve permitir que as empresas façam os ajustes necessários de forma mais gradual”, pondera.
Qual empresa de educação pode se salvar?
Segundo o BTG, as companhias listadas na Bolsa possuem uma fatia de mercado relativamente maior no segmento EAD do que no presencial. Segundo os cálculos do banco, as empresas detêm atualmente 32% de participação no mercado de cursos presenciais, contra 67% no EAD. “Como resultado, além dos maiores custos, instituições com forte presença no EAD poderão enfrentar dificuldades para manter parte de sua base de alunos ao longo do tempo”, avalia.
Por outro lado, para instituições com baixa exposição ao segmento EAD, como a Ânima, o BTG acredita que as mudanças podem ser limitadas e até beneficiar a empresa em termos relativos. “Esperamos calcular os impactos com mais precisão assim que compreendermos melhor o novo marco regulatório junto às companhias”, diz.
Ângelo Belitardo, gestor da Hike Capital, concorda que a Ânima aparece como a empresa mais preparada para esse novo cenário regulatório. “Sua operação é baseada em cursos presenciais de alto valor agregado, com destaque para Medicina, que representa uma fatia relevante da receita e da estratégia de longo prazo da companhia. Como a empresa já vinha apostando em um modelo premium e de menor escala no EAD, ela se posiciona agora de forma vantajosa frente aos concorrentes que precisarão revisar seus modelos operacionais”, pontua.
O gestor ressalta que a ANIM3 é também a sua ação favorita para o setor, pois a companhia vem passando por um processo consistente de desalavancagem, o que melhora significativamente seu perfil de risco. “Apesar disso, o preço atual das ações ainda não reflete essa melhora substancial na estrutura de capital”, afirma.
Humberto Aillon, especialista na FIPECAFI, diz que, em certa proporção, todas as empresas listadas na B3 terão impacto em seus resultados, mas como a Ânima possui uma base menor no EAD em relação às demais, provavelmente será menos afetada no curto prazo. “Avaliando a representatividade de receitas e expectativa futura de geração de caixa no segmento, minha opinião pessoal é de que a Ânima está melhor posicionada seguida pela Cogna e em terceiro pela Yduqs. A capilaridade de atuação no Brasil e também a diversificação com cursos em diversas áreas e o mix entre presencial e on-line são alguns dos diferenciais da escolha”, destaca.
Marinello, da Essentia Consulting, enxerga que, além da Ânima, a Ser Educacional (SEER3) também deve ser menos afetada pelas mudanças regulatórias. “Essas empresas têm menor dependência do EAD. Isso, neste momento, é um trunfo, porque essas companhias já têm mais estrutura para receber os alunos do EAD”, diz.
Do lado das empresas de educação mais impactadas, a XP ressalta que, dentro da sua cobertura, a Cogna é a empresa mais exposta às novas restrições aplicadas a cursos EAD. A corretora, no entanto, mantém recomendação de compra, justificando que a companhia possui flexibilidade para ajustar suas operações, e o período de transição deve suavizar os impactos negativos nos resultados.