Aquisição de carro pelo CNPJ pode gerar economia de até 21%, mas exige uso exclusivo empresarial e documentação rigorosa para evitar riscos fiscais (Foto: Adobe Stock)
Comprar um carro pode parecer uma decisão simples, mas a escolha entre adquiri-lo em nome da pessoa física (PF) ou dapessoa jurídica (PJ) pode mudar completamente a conta final. Mais do que definir quem será o proprietário do veículo, essa decisão traz impactos financeiros, tributários e até de governança empresarial.
Um estudo recente da planejadora financeira Paula Bazzo, CFP, realizado em 2025, mostra que, em determinados cenários, a diferença pode chegar a mais de R$ 78 mil em 5 anos.
Como foi feita a simulação
Na simulação, foram adotadas algumas premissas básicas: o veículo teria um valor inicial de R$ 200 mil, com depreciação estimada em 60% no período, ou seja, após cinco anos, valeria 40% do preço de compra. A entrada no financiamento corresponderia a 30% do valor total, e os custos de manutenção, seguro, Imposto sobre Propriedades de Veículos Automotores (IPVA), licenciamento e juros foram mantidos em parâmetros médios de mercado.
Para o caso da PJ, o regime tributário considerado foi o Lucro Real, justamente para avaliar o potencial de dedução e aproveitamento de créditos fiscais.
Existe diferença de preço entre PJ e PF?
Quando uma pessoa física adquire o veículo, o custo total tende a ser mais elevado, já que não há possibilidade de desconto na compra nem de dedução de despesas.
Os gastos incluem o valor cheio de aquisição, o pagamento de IPVA, que em São Paulo (SP) corresponde a 4% do valor do carro, manutenção, seguro, taxas obrigatórias de licenciamento, encargos do financiamento e a perda de valor decorrente da depreciação.
No caso da pessoa jurídica, há algumas diferenças significativas.
Empresas costumam ter acesso a condições mais vantajosas na compra, com descontos que podem variar de 2% a 30% sobre o valor de tabela, dependendo do modelo e do volume de veículos adquiridos.
Para a simulação, considerou-se um desconto de 15%. Isso reduz tanto o preço de compra quanto o montante financiado.
Além disso, empresas tributadas pelo Lucro Real podem se creditar do Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sobre a aquisição do bem e também lançar depreciação fiscal de 20% ao ano, durante cinco anos, o que diminui a base de cálculo de impostos como o Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Publicidade
Gastos como combustível, manutenção e seguro também podem ser contabilizados como despesas dedutíveis.
O resultado foi o seguinte, o custo líquido da compra por pessoa física foi estimado em aproximadamente R$ 377,8 mil ao longo de cinco anos.
Já para a pessoa jurídica, o custo caiu para R$ 299,5 mil, o que representa uma economia de R$ 78,2 mil, ou 21% no período.
A diferença se explica principalmente pelo desconto na compra, pela depreciação fiscal e pelo crédito de PIS/Cofins.
A tabela abaixo resume esses resultados:
Publicidade
Posso usar o carro da empresa para uso pessoal?
Apesar das vantagens, especialistas alertam que é preciso seguir regras. A educadora financeira Daiane Alves ressalta que “todos os bens da empresa devem ser utilizados estritamente para fins empresariais, esse é um princípio contábil que, se descumprido, pode ser penalizado em caso de uma fiscalização”.
Segundo ela, há muitas organizações que disponibilizam veículos a colaboradores, seja em razão de altos cargos de liderança, seja por atividades específicas, como funções comerciais ou de manutenção.
Nesses casos, explica Alves, é fundamental que tudo esteja devidamente documentado via contrato, especificando a finalidade da utilização e a forma de tratamento das despesas, pois o carro é um ativo da empresa e não deve se misturar ao patrimônio da pessoa física.
Ela reforça que não há como determinar um limite único em relação aos custos do veículo ligados à empresa, já que tudo depende do ramo e da organização. A educadora afirma:
Sempre que um colaborador for utilizar o carro da empresa de forma integral é preciso ter um contrato com todas as regras de utilização, bem como os comprovantes das despesas.
Ela ainda acrescenta: “Em caso de uma fiscalização será mais fácil comprovar a finalidade da utilização do veículo e as despesas incorridas”, alerta a especialista.
Fique de olho na Receita!
É importante destacar que, embora a economia seja significativa, a Receita Federal exige que o veículo adquirido pela empresa esteja ligado à atividade empresarial.
Publicidade
O uso pessoal ou misto pode trazer riscos relevantes.
Nesse caso, as despesas podem ser glosadas, ou seja, desconsideradas pela Receita, e a utilização do carro pode ser interpretada como distribuição disfarçada de lucros ou remuneração indireta, sujeita à tributação de Imposto de Renda e contribuição previdenciária.
Além disso, podem ser aplicadas multas e cobranças retroativas de tributos.
Nesse contexto, Alves lembra que o regime tributário da empresa é determinante para aproveitar deduções.
Publicidade
“Em alguns tipos de negócios ter um meio de transporte próprio da empresa se faz necessário, pois acaba fazendo parte do negócio, como por exemplo empresas de prestação de serviço que precisam prestar suporte ou manutenção, ou mesmo áreas como a comercial e de suporte ao cliente”, explica.
Para outras empresas, complementa, pode ser mais vantajoso optar pelo reembolsode custos aos colaboradores que usam o próprio carro, seja por quilometragem, seja pela comprovação das despesas.
A compra em nome da pessoa física apresenta a vantagem da simplicidade: não há burocracia contábil, o uso do carro é irrestrito e o bem não se mistura ao patrimônio da empresa, ficando protegido em caso de problemas financeiros da PJ.
Por outro lado, o custo total é mais alto e não existem benefícios fiscais.
Já a compra em nome da pessoa jurídica permite economias relevantes, principalmente para empresas no Lucro Real, além da possibilidade de condições de financiamento mais vantajosas.
Publicidade
Mas exige maior controle contábil, documentação clara do uso empresarial e cuidado para não caracterizar desvio de finalidade.
Por fim, Daiane Alves chama a atenção para outro aspecto: os riscos em caso de dívidas.
“Em situações de inadimplência, os bens da empresa podem ser penhorados para quitar total ou parcialmente dívidas a credores. Os veículos, por sua liquidez, costumam ser penhorados de forma rápida, já que se convertem em dinheiro facilmente”, afirma.
Ela ressalta que medidas preventivas, como a separação clara entre bens da empresa e do sócio, são fundamentais para evitar que o patrimônio pessoal seja comprometido em execuções futuras. Ela conclui:
A análise dos riscos deve ser feita antes mesmo da abertura do CNPJ, pois com a orientação correta é possível proteger os bens pessoais em relação às dívidas da empresa.
Ou seja, comprar um carro pelo CNPJ pode trazer ganhos expressivos de até 21% em cinco anos, mas os benefícios só se consolidam se o veículo for de fato usado na atividade empresarial, se houver controles documentais adequados e uma governança bem estruturada.