O dólar disparou no mercado doméstico de câmbio na sessão desta quinta-feira (10) e fechou no maior nível desde julho após fala do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva crítica ao teto de gastos e dúvidas sobre a confecção da PEC de Transição deflagrem temores de mudança do arcabouço fiscal.
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Com oscilação de quase 17 centavos entre a mínima (R$ 5,2454) e a máxima (R$ 5,4148), a moeda americana encerrou a sessão em alta de 4,14%, cotada a R$ 5,3966 – maior valor de fechamento desde 22 de julho de 2022 (R$ 5,4988) e maior alta porcentual desde 16 de março de 2020, dia em que foi decretada situação de emergência na cidade de São Paulo em razão da pandemia de covid-19.
O real não apenas amargou, de longe, o pior desempenho entre as divisas globais nesta quinta-feira como foi a única moeda relevante, ao lado do peso argentino, a perder valor frente ao dólar. O índice DXY – que mede o desempenho da moeda americana frente a seis divisa fortes – caiu mais de 2%, aproximando-se do limiar dos 108,000 pontos.
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Analistas e operadores ressaltaram que, não fosse o ambiente de forte apetite ao risco no exterior, o dólar poderia ter ido muito mais longe no mercado doméstico, quiçá superando o nível de R$ 5,50. “Não esperava tanta trapalhada tão rápido. Tenho o receio de que o dólar vá para R$ 6,00. Fim de ano já é ruim com remessas. O céu é o limite”, afirma um gestor de recursos, que pediu anonimato.
A degringolada do real começou pela manhã, com o dólar superando 5,34, em alta superior a 3%, na primeira meia hora de negócios. Parte do mau humor vinha de fora com a expectativa pela divulgação índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) nos EUA em outubro. Parte se devia à indefinição sobre a configuração da chamada PEC da Transição.
Havia rumores de que a equipe de transição de governo trabalhava com a possibilidade de excluir despesas do Auxílio Brasil (que voltará a se chamar Bolsa Família) definitivamente da regra do teto. A alta de 0,59% do IPCA de outubro, acima do teto de Projeções Broadcast (+0,54%), contribuía para a postura defensiva dos agentes.
Um dos pilares de sustentação da alta da moeda americana ruiu quando o CPI de outubro, em especial o núcleo, veio abaixo das expectativas. O dólar passou a cair em bloco no exterior e as taxas dos Treasuries mergulharam, aliviando as pressões sobre a taxa de câmbio doméstica, que chegou a se situar abaixo de R$ 5,30. Investidores assimilavam a perspectiva de uma ação menos agressiva do Federal Reserve, com redução do ritmo de alta da taxa básica americana em dezembro e juro terminal não tão elevado.
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O caldo voltou a entornar à medida que o mercado absorvia fala do presidente eleito. Quem esperava uma guinada de Lula ao centro se decepcionou com o tom similar ao da campanha eleitoral. Eis uma lista das perguntas do petista: “Por que as pessoas são levadas a sofrerem por conta de garantir a tal da estabilidade fiscal desse País? Por que toda hora as pessoas falam que é preciso cortar gastos, que é preciso fazer superávit, que é preciso fazer teto de gastos? Por que as mesmas pessoas que discutem teto de gastos com seriedade não discutem a questão social neste País?”.
Gasto social, disse Lula, tem de ser visto como investimento. Ele indagou também por que o País tem metas de inflação e não de crescimento. O presidente até temperou sua fala com a lembrança de seu primeiro mandato e o alerta de que é preciso garantir uma política fiscal “séria” para pagar juros da dívida. Nada capaz de anular a percepção de que o novo governo está disposto a mudar as regras do jogo fiscal.
“Agora está um frenesi de gastos, mas ninguém falou de onde vai vir o dinheiro ou de cortes. Só se escuta esse lado”, afirma o head da Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, ressaltando que, levando em conta a baixa do índice DXY, a depreciação do real foi muito aguda. “Ninguém sabe quando vai ser o ‘waiver’ fiscal, o que vai ficar fora e dentro do teto. E se o que ficar fora vai ser apenas por um período ou para sempre”.
As palavras do presidente levaram a uma degringolada adicional dos ativos domésticos. O dólar superou de novo os R$ 5,35 no início da tarde, nível em ao redor do qual orbitou até que o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin anunciou novos integrantes da equipe de transição, com o ex-ministro Guido Mantega no time de Orçamento e Planejamento. Foi a senha para uma corrida compradora ainda mais intensa no mercado de câmbio, que levou o dólar a superar sucessivas máximas e correr até o nível de R$ 5,4148 (+4,14%).
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Já se sabia que o Mantega participaria do time, mas seu lugar ainda era uma incógnita. Lula planeja recriar o ministério do Planejamento e o nome de Mantega na equipe de transição é visto como prenúncio de um perfil desenvolvimentista à frente da Pasta.