- Salário mínimo do início do Plano Real é menor que o valor pago pelo Bolsa Família hoje
- Economistas dizem que a melhora do salário mínimo foi um programa de distribuição de renda iniciado em 2003
- Economistas reforçam que o salário mínimo atual ainda é muito baixo, mas que, se for elevado repentinamente, pode causar desequilíbrios econômicos
O salário mínimo de 2024 compra quase duas vezes mais que o de julho de 1994, mostra levantamento feito pelo E-Investidor com base em dados do Banco Central. O salário mínimo no início do plano real era de R$ 64,79. Em caso de correção desse salário pela inflação do real medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o salário mínimo deveria ser de apenas R$ 523,52 em 2024.
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No período, o real teve uma desvalorização de 708%. Contudo, em vez de o salário mínimo ser de apenas R$ 523,52 com o reajuste inflacionário, ele está em R$ 1.412 em 2024. A cifra equivale a um salário 169,7% maior que os R$ 523,23. Os números foram retirados da calculadora do cidadão do Banco Central.
Para Pedro Afonso Gomes, presidente do Conselho Regional de Economia do Estado de São Paulo (Corecon-SP), o salário mínimo de 1994 era muito baixo em relação a outras economias. Ele diz que, na época, o salário mínimo era equivalente a US$ 64,79. Isso porque, com o lançamento do plano real, R$ 1 era equivalente a US$ 1. “A partir de 2003 passamos a ter uma escalada do salário mínimo para o ele chegar a US$ 100. Hoje, o salário mínimo em dólar está por volta de US$ 220, acima do que se desejava na época”, diz Gomes.
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Segundo ele, essa medida de valorização do salário mínimo acima da inflação é benéfica para a economia pelo fato de distribuir a renda e girar a economia. “Os mais pobres são aqueles que giram a economia, qualquer aumento que eles recebem eles vão consumir. Eles vão ao mercado, à padaria e isso é o que faz toda a economia ir para frente”, explica.
Na visão de Denis Medina, economista e professor da Faculdade do Comércio, o salário de 1994 tinha um poder de compra muito baixo e pior que o atual. Embora a notícia pareça ser muito positiva, o salário mínimo atual é muito baixo para manter as famílias com padrão de vida saudável.
“O salário mínimo de 1994 era menor do que o Bolsa Família paga hoje, visto que os R$ 64,79 de 1994 são equivalentes aos R$ 523,52 de 2024 e o Bolsa Família hoje deposita R$ 600 para o beneficiário. Ainda assim, o salário mínimo de 2024 é um valor muito baixo para manter uma família em um grande centro urbano do Brasil”, salienta Medina.
Segundo dados do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio Econômicos (DIEESE), o salário mínimo ideal para manter uma família de 4 pessoas, para suprir todas as necessidades, como alimentação, transporte, saúde, educação, habitação e lazer, teria que ser de R$ 6.946,37 ao invés de R$ 1.412,00.
Ou seja, Medina, da Faculdade do Comércio, comenta que o salário mínimo de hoje continua sendo baixo, mas ele também reforça que o salário mínimo do início do plano real, em julho de 1994, era muito pior.
Crescimento do salário mínimo acima do ideal pode gerar inflação
Por outro lado, Paulo Henrique Duarte, economista da Valor Investimentos, ressalva que a correção pelo IPCA pode não ser única a ser realizada. Ele comenta que outro índice utilizado pelo mercado para corrigir a inflação é o Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M). Segundo as contas do economista, o salário mínimo de 1994 corrigido pelo IGP-M é equivalente a R$ 730.
Ainda assim, pelo IGP-M, o salário mínimo atual está 93,4% maior que o valor real do salário mínimo de 1994 em 2024, visto que se fosse feito apenas o repasse inflacionário pelo IGP-M, o salário mínimo atual deveria ser de R$ 730 e não de R$ 1.412. Embora ele veja que essa política seja positiva pela questão da distribuição de renda, ele reforça que aumentar o salário mínimo repentinamente pode ser prejudicial à economia.
Duarte, da Valor Investimentos, lista vários fatores para essa piora da economia. O primeiro seria o crescimento dos gastos do governo, que podem ficar maiores que a arrecadação, devido às pensões e aposentadorias. Nesse caso, o governo tende a emitir títulos de dívidas para conseguir suprir o déficit, ou seja, a dívida do país pode aumentar. Isso já vem acontecendo atualmente, com os gatos do governo acima da arrecadação.
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O segundo fator é o aumento do salário mínimo sem o crescimento da produtividade. Isso pode fazer com que o país tenha uma disparada da inflação, visto que haverá mais dinheiro na economia para consumir a mesma quantidade de produtos. “Para aumentar e melhorar a produtividade, o país precisa investir no aumento de capacitação da população brasileira, seja no ciclo básico com escolas técnicas ou com a melhora da mão de obra com um diploma do ensino superior”, explica Duarte.
Um último ponto é que o aumento do salário mínimo sem o alta da produtividade também pode causar uma elevação de custos para os empresários. Eles também tendem a repassar esse custo para o produto final, o que acaba realimentando a inflação. “Embora seja benéfica, a medida não pode ser tomada sem considerar essas questões, porque de nada adiantaria um salário mínimo de muitos dígitos que não tenha um poder de compra convidativo”, esclarece Duarte.