- Mas o BC pôs o pé no freio, disseram à Reuters quatro fontes do governo com conhecimento do assunto
- Isso deixou o setor financeiro se perguntando se o regulador preferiu apenas evitar dar um sinal negativo às vésperas da estreia da maior estrela das fintechs na bolsa, o Nubank
No tradicional encontro anual da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), no fim do mês passado, representantes da indústria financeira esperavam que o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, anunciasse regras mais rígidas para fintechs. A própria autarquia vinha sinalizando que exigências maiores de capital para grandes bancos digitais e para a operação de contas de pagamento, estavam às portas, após vários meses de consulta pública.
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Mas o BC pôs o pé no freio, disseram à Reuters quatro fontes do governo com conhecimento do assunto. Isso deixou o setor financeiro se perguntando se o regulador preferiu apenas evitar dar um sinal negativo às vésperas da estreia da maior estrela das fintechs na bolsa, o Nubank, ou se foi convencido de que suas novas normativas como desenhadas deixariam um saldo mais negativo em vez de um balanço positivo que poderia ser trazido com a correção de supostas assimetrias regulatórias.
A proposta de elevar exigências de capital para instituições de pagamentos, fruto da consulta pública 78, que poderia alvejar nomes como Nubank, PagSeguro, Stone e Picpay, chegou a ser pautada para o Conselho Monetário Nacional (CMN), última instância de aprovação antes de uma normativa entra em vigor, como publicou a Reuters.
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A norma vinha sendo discutida em meio à crescente grita dos maiores bancos de que a guarida regulatória simplificada já não fazia mais sentido para vários de seus neorivais que já atingiram dezenas de milhões de clientes e passaram a oferecer uma grande variedade de produtos. Para apoiar seu argumento, apresentaram um estudo encomendado à consultoria Oliver Wyman, apontando riscos de uma assimetria regulatória.
Dias antes de divulgar os ajustes, porém, a autarquia acedeu a alertas de que uma dose errada do aperto regulatório, tanto no caso das exigências de capital prudencial quanto na operação de contas de pagamentos, essa alvo da consulta pública 89, poderiam comprometer a evolução de mais fintechs e por a perder o andamento da agenda pró-competição do próprio BC.
“Se errar na dose, o BC pode criar barreiras de entrada e até inviabilizar negócios”, disse Fabiano Camperlingo, presidente da SumUp, especializada em micro e pequenas empresas.
“O BC sabe que tem que subir a régua, mas parece já não saber como fazer sem prejudicar o dinamismo do mercado”, disse à Reuters um diretor de um grande banco digital, que pediu para não ser identificado. “Não dá para ficar remendando a regulação.”
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Segundo fontes a par do assunto com o regulador, o tema segue em deliberação no BC, que decidiu fazer uma calibragem em aspectos prudenciais.
Consultado, o BC afirmou que não comentaria o assunto.
O episódio ilustra a encruzilhada a que chegou o BC na regulação das fintechs após uma década em sua agenda para ampliar a competição bancária e tentar romper a dinâmica de tarifas e juros historicamente altos no Brasil.
Uma das complicações de uma mexida regulatória agora como a pretendida pelo BC no Brasil é que as fintechs – hoje mais de mil — tomaram caminhos muito distintos e usar só o critério de tamanho da base de clientes ou de volume financeiro movimentado, com o BC indicou, poderia criar mais problemas do que soluções, avaliam as fontes do meio digital.
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Alguns neobancos têm apostado em encarar os grandes de frente. Outros preferiram não captar depósitos nem ofertar crédito para escapar de exigências de capital, mas ficaram enormes. Há ainda as plataformas que trabalham com empréstimos, mas sem usar capital próprio, em vez disso buscando recursos no mercado com fundos de recebíveis. Por isso, defendem ficarem livres de um endurecimento das regras de capital.
Em jogo, estão dezenas de bilhões de reais de investidores domésticos e estrangeiros injetados em plataformas de serviços financeiros e que agora, mesmo com pequenos ajustes na regulação, poderiam ver arruinados seus planos ambiciosos.
“Além da guerra principal entre bancos e fintechs, surgiram vários outros embates menores entre os próprios bancos digitais”, disse um executivo de uma grande plataforma digital. “E as conversas estão ficando cada vez mais viscerais.”
Dois chapéus
A situação expõe como a tarefa do BC tornou-se enormemente mais complexa do que apenas mediar uma relação entre grandes e pequenos. Mas ao usar ao mesmo tempo os chapéus de regulador e estimulador de mercado, a autoridade se colocou em crescentes conflitos de interesse.
Ter barrado no ano passado o WhatsApp Pay de estrear no mercado antes do Pix, o sistema instantâneo de pagamentos do próprio regulador, fez o BC alvo de críticas de que operou a favor de si em prejuízo de uma solução de mercado.
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O receio é de que controvérsias como essa ganhem novos contornos com a entrada em vigor de novas fases do open banking, que elevará a concorrência para áreas ainda mais sensíveis do sistema, como crédito e seguros, disse um executivo do setor.
Diante disso, tem crescido dentro e fora do governo a discussão sobre redefinir esferas de atuação do BC definidas pela lei 12.865, eventualmente com cisão de algumas atividades hoje exercidas pelo regulador, como no caso do próprio Pix.
Mas isso não está claro nem para o mercado nem para o governo qual é o melhor caminho.
“Pode chegar num ponto em que talvez tenha que privatizar o que foi criado de pagamento no BC porque fica grande a estrutura para um regulador”, disse uma fonte familiarizada com os assuntos da instituição, revelando que esta hipótese já é discutida no próprio Ministério da Economia.
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Consultado para esta matéria, Nubank e Mercado Pago afirmaram que suas posições sobre esses temas é tratada por meio da Zetta. Criada em março passado para defender os interesses de plataformas digitais de serviços financeiros, a Zetta afirmou em nota que “apoia a proporcionalidade nas normas prudenciais, considerando o porte dos conglomerados”.
A Febraban, em nota, afirmou defender que “competidores de tamanhos iguais se submetam a um mesmo ambiente regulatório” e que assimetrias desmedidas podem distorcer a competição, fragilizar a indústria e o consumidor.