- JBS (JBSS3), maior empresa global de carnes, recebeu ordem de fechar as operações de uma fábrica de carne bovina no estado de Rondônia após uma decisão judicial
- À medida que o vírus se espalha rapidamente pelo campo, está em risco a capacidade do setor de manter a produção de carne bovina
- Problemas crescentes para o Brasil podem ter grandes efeitos globais no suprimento de carne
(Tatiana Freitas /Bloomberg) – À medida que os Estados Unidos começam a sair de sua crise da carne, a rápida disseminação do coronavírus vem ameaçando cada vez mais a produção do Brasil, o maior exportador mundial de carne bovina e frango.
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A JBS SA, maior empresa global de carnes, recebeu ordem para testar todos os funcionários de uma unidade de abate de bovinos no estado de Rondônia após uma decisão judicial. É o primeiro fechamento da indústria da carne bovina no país devido ao surto de coronavírus, inaugurando o que pode ser um novo capítulo da crise da indústria de carne brasileira.
Os primeiros surtos e paralisações de fábricas ocorreram no sul do país, um centro de produção de aves e suínos. Agora, à medida que o vírus se espalha rapidamente pelo campo, põe em risco a capacidade do setor de manter a produção de carne bovina.
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Enquanto isso, a gigante exportadora de frango BRF SA está intensificando as contratações. Seu diretor executivo vem advertindo sobre o risco de ociosidade das linhas de produção e de possíveis ordens de fechamento de plantas pelas autoridades locais à medida que o vírus se espalha.
Esses problemas crescentes para o Brasil podem ter grandes efeitos sobre o suprimento de carne global, especialmente porque a produção ainda está restrita nos Estados Unidos, mesmo agora que algumas instalações começam a reabrir. Os dois países respondem por mais da metade do comércio mundial de carne. Interrupções persistentes na produção podem significar maior direcionamento dos suprimentos para os mercados domésticos, deixando menos produtos para exportação. Os surtos também estão prejudicando a produção nos matadouros europeus, onde mais de 1 mil trabalhadores contraíram a doença.
É certo que, até agora, apenas algumas fábricas fecharam no Brasil e o país ficou livre das grandes interrupções observadas nos Estados Unidos, onde a produção chegou a ficar cerca de 40% abaixo dos níveis normais durante os piores momentos da crise. A indústria sul-americana também está introduzindo um novo conjunto de padrões de segurança para proteger suprimentos e trabalhadores. E os produtores, incluindo JBS, BRF e Marfrig Global Foods SA, estão adotando medidas de segurança mais rigorosas.
Atualmente, apenas duas fábricas estão fechadas: uma de frango da JBS no estado de Santa Catarina e a de bovinos em Rondônia.
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Mas existe a preocupação de que as coisas piorem à medida que o Brasil se tornar o novo epicentro mundial do vírus, chegando ao segundo lugar em número de casos, e a pandemia atingir pequenas cidades do interior. Começaram a aparecer relatos de infecções em frigoríficos, inclusive nos estados do norte.
Na segunda-feira, a Marfrig Global Foods SA disse que 25 trabalhadores de uma fábrica no estado de Mato Grosso deram positivo e pelo menos um morreu. Um juiz do trabalho do estado deu ordem para a empresa aumentar o distanciamento entre os funcionários, uma medida que limitará a capacidade operacional. No estado do Tocantins, 55 trabalhadores da fábrica da Minerva SA, em Araguaína, foram afastados após testarem positivo, informou a empresa na semana passada. A exportadora de carne bovina decidiu testar todos os 730 trabalhadores da unidade em meio a uma rápida expansão do vírus na cidade, segundo o comunicado.
A JBS recebeu ordem de testar todos os funcionários de sua instalação de carne bovina que foi fechada em São Miguel do Guaporé, Rondônia, de acordo com um arquivo compartilhado pelo Ministério Público do Trabalho. O fechamento ocorreu depois que a empresa sofreu paralizações em duas de suas plantas de frango no sul do país. Apenas uma delas permanece fechada.
Em resposta a um pedido de comentário, a JBS disse que a saúde de seus trabalhadores é prioridade e que está adotando protocolos rigorosos para evitar a contaminação por covid-19. A empresa não comentou especificamente a situação da fábrica de São Miguel do Guaporé.
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A fábrica em São Miguel do Guaporé emprega cerca de 950 trabalhadores e tinha 29 casos confirmados de coronavírus em 25 de maio. Isso representa 60% dos casos da cidade de 25 mil habitantes, segundo a promotora de trabalho Helena Romera, que solicitou o fechamento da fábrica.
“Estávamos testemunhando um rápido crescimento dos relatos de coronavírus no município nos últimos dias e percebemos que boa parte deles eram de trabalhadores da JBS”, afirmou ela em entrevista por telefone. “Dada a gravidade da situação, decidimos solicitar o fechamento”.
No mês passado, os surtos de vírus nos matadouros dos Estados Unidos levaram a uma onda de fechamento que ocasionou um excesso de animais no pasto e fez dobrar os preços domésticos de carne suína e bovina no atacado. As plantas começaram a reabrir este mês, seguindo uma ordem executiva do presidente Donald Trump.
Com os casos de vírus aumentando, as operações continuaram limitadas pela ausência de trabalhadores. As taxas de abate de bovinos nos Estados Unidos ainda caíram cerca de 13% em relação a um ano atrás. Quanto aos suínos, a queda foi de 15%. Mesmo que a alta de preços tenha desacelerado, a carne bovina no atacado ainda aumentou cerca de 84% desde o início do ano, e a carne de porco, cerca de 33%.
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A BRF está intensificando as contratações no Brasil para se proteger de questões trabalhistas. A empresa agora planeja contratar 5 mil trabalhadores, sendo que antes eram apenas 2 mil, disse o CEO Lorival Luz, na quarta-feira, em um webinar patrocinado pelo jornal Valor Econômico. Os preços do frango no país podem subir em meio à queda da produção nos próximos meses, disse ele.
Luz também alertou que as autoridades locais podem continuar exigindo o fechamento de fábricas. Todas as plantas da BRF estão em operação no momento, mas a unidade de Lajeado chegou a ser fechada por uma semana no início deste mês, por decisão de um juiz.
A intervenção das autoridades estaduais e locais brasileiras em alguma medida espelha a das americanas. Embora não haja decisões severas que obriguem as fábricas americanas a fechar, os fechamentos começaram a aumentar depois que os governantes intervieram, com o apoio da pressão pública, para interromper as operações em meio aos surtos. Mas esse movimento cessou diante da ordem executiva de Trump para manter as instalações em funcionamento. / Tradução de Renato Prelorentzou.