- Há dois anos, uma bomba fiscal começou a ser armada nas contas públicas e já tem prazo para estourar no colo dos investidores
- Entenda como a armadilha econômica se formou e como deve afetar a Bolsa brasileira nos próximos anos
Há dois anos, uma bomba fiscal começou a ser armada nas contas públicas e já tem prazo para estourar no colo dos investidores. Segundo os especialistas consultados pelo E-Investidor, é possível entender como a armadilha econômica se formou e como deve afetar a Bolsa brasileira nos próximos anos.
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Com a chegada do coronavírus no Brasil, em março 2020, e a consequente necessidade de paralisação de atividades presenciais, o governo instituiu o Auxílio Emergencial de R$ 600 para ajudar as famílias que perderam suas rendas. Na época, por se tratar de uma situação de urgência em função da pandemia, o executivo pôde utilizar recursos fora do teto de gastos para bancar o benefício.
“Quando o governo declara estado de emergência, é possível ultrapassar o valor estipulado pelo teto de gastos, que é advindo da Lei de Responsabilidade Fiscal”, explica Ariane Benedito, economista especialista em mercado de capitais.
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Já no final de 2021, o Auxílio Emergencial chegou ao fim e foi sucedido pelo atual “Auxílio Brasil”, ou seja, se tornou um programa social. Com isso, em vez de temporário, passou a ter caráter permanente a com um pagamento mínimo de R$ 400 aos beneficiários.
Por meio da Emenda Constitucional n.° 123, de julho de 2022, véspera de eleições, o Executivo conseguiu aumentar esse valor para R$ 600. Inicialmente, o incremento de R$ 200 seria repassado de forma excepcional até o fim deste ano.
Tendo em vista a corrida eleitoral, entretanto, não foi surpresa quando ambos os principais candidatos à presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Messias Bolsonaro (PL), prometeram manter os R$ 600 aos participantes do programa caso vencessem às eleições.
“Vencendo Bolsonaro ou Lula, a dúvida era como isso seria pago emergencialmente no ano que vem”, afirma Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos. Porém, a vitória do líder do PT adicionou potência a essa “bomba fiscal”.
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Na visão de Cruz, um eventual segundo mandato do presidente Bolsonaro seria de maior responsabilidade com as contas públicas. O militar da reserva ainda teria dificuldades em pagar o Auxílio Brasil em 2023, mas para os próximos anos, a despesa do programa seria acomodada no orçamento por meio de reformas, desonerações e diminuição do Estado.
Mas o mesmo não seria observado nas sinalizações dadas pelo governo eleito, cuja equipe de transição criou a proposta de emenda à Constituição (PEC da Transição) que, ao ser aprovada, deixou o Auxílio Brasil (que voltará a se chamar Bolsa Família) fora do teto de gastos pelos próximos quatro anos.
“A questão é que (com Bolsonaro) nos anos subsequentes, se encararia isso de forma aberta e responsável. A PEC da Transição não leva sob esse olhar a discussão. O texto fala que, nos próximos quatro anos, não teremos que nos preocupar em como pagar o Auxílio de R$ 600. Além disso, o que o governo deixará de pagar do Auxílio no orçamento poderá ser gasto como quiser. É o dobro do risco fiscal”, afirma Cruz. Essa também é a visão de Jason Vieira, economista chefe da Infinity Asset, e de Benedito, economista.
“A PEC da Transição já é uma enorme bomba fiscal. É uma bomba nuclear fiscal que traz um peso muito grande na perspectiva de crescimento econômico”, diz Vieira.
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“Agora, a grande bomba fiscal deixa de ser só a preocupação de como será colocado o Auxílio dentro do orçamento, mas o impacto da PEC da Transição, que não engloba somente o Auxílio, mas políticas fiscais expansionistas, mais gastos na negociação para que a PEC fosse aprovada”, afirma Benedito.
No Ibovespa
Essa bomba “nuclear” fiscal deve trazer grande volatilidade ao Ibovespa em 2023, principalmente porque ainda existem muitas incertezas sobre a condução econômica do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas ainda não deve estourar. Segundo Benedito, o viés aparentemente mais expansionista do governo Lula III, pode fazer com que o índice surfe cerca de dois anos de crescimento econômico.
Os impactos na economia e na Bolsa serão vistos a partir da segunda metade do mandato, caso não haja controle dos gastos. “Podemos comparar com o governo Dilma Rousseff, que surfou dois anos muito bons, de políticas bem ajustadas, e nos dois últimos anos o castelo de cartas começou a cair. As projeções para o governo que está entrando deve ser a mesma coisa”, diz a especialista.
Em poucas palavras, sem responsabilidade fiscal, se torna muito mais difícil e custoso o controle da inflação. Os juros, portanto, podem seguir mais altos, o que prejudica as empresas. A falta de zelo com as contas públicas também afeta o fluxo de investimentos para a Bolsa brasileira, o que impacta negativamente o Ibovespa, principal índice de ações da B3.
“A questão fiscal é repetitiva no Brasil. Se tem um fiscal mais arriscado, teremos um fluxo menor de investimento estrangeiro pra cá. Aliás, tem a questão do fluxo do próprio investidor interno para fora, ou seja, fundos multimercados preferindo investir externamente”, explica Cruz. “Hoje, já temos empresas com dificuldades na linha financeira dos balanços (por conta dos juros altos). Algumas tem o operacional bom, mas a parte financeira compromete toda a lucratividade da empresa. E isso afeta o Ibovespa.”
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Para Vieira, o cenário mais difícil para investimentos nos próximos anos é claro. “A bomba fiscal deve gerar uma reação ruim dos mercados e de todos os seus ativos.”