Logo no ano em que um vírus avançou pelo mundo e fez com que países paralisassem grande parte das atividades por meses, os investidores estão expressando um otimismo incomum com o mercado financeiro – principalmente o investidor brasileiro. Durante o auge da pandemia, entre fevereiro e junho, a B3 ganhou cerca de 700 mil novos CPFs, um salto de 36%. E a confiança não para por aí.
De acordo com o relatório ‘Estudo De Investidores Globais 2020’, enviado com exclusividade ao E-Investidor pela gestora Schroders Brasil, o investidor brasileiro espera obter um retorno médio anual de 13,3% pelos próximos cinco anos e de pelo menos 10,2% nos próximos 12 meses. A expectativa de rendimento supera a média global, de 10,9% para os cinco anos seguintes e de 8,8% até agosto de 2021. O levantamento ouviu cerca de 23 mil investidores, de 32 locais ao redor do mundo, com intenção de investir pelo menos 10 mil euros nos próximos 12 meses e que fizeram alteram alterações nos investimentos na última década.
Para Daniel Celano, Country Head da Schroders Brasil, essa perspectiva é irreal. “Como os mercados subiram muito nos últimos dois anos, as pessoas projetam que isso deve continuar acontecendo indefinidamente”, diz Celano. De fato, entre janeiro e dezembro de 2019, por exemplo, o Brasil vivia uma fase de otimismo muito grande, com Ibovespa encerrando o ano aos 115 mil pontos após uma valorização de 31,58% nos 12 meses anteriores.
Investidores devem se decepcionar
Na visão de Celano os investidores, principalmente os brasileiros, devem ter suas expectativas de retornos frustradas. “Considerando o juro real de 0,5% (Selic de 2% menos a inflação de 1,5%) no Brasil, acho difícil ter nos próximos 12 meses um retorno nominal de 10%”, afirma. “Nos próximos cinco anos, acreditamos que o retorno para o investidor pode estar mais próximo de 7% a 10%.”
Isso acontece porque os juros não devem subir tão rápido no longo prazo por conta do afrouxamento monetário, ou seja, medidas do Governo para fazer o dinheiro circular na economia e estimular o consumo na crise. O auxílio emergencial e cortes nas taxas de juros, por exemplo, são algumas delas.
“Acredito que pelos próximos dois anos ainda teremos juros baixos tanto aqui, quanto no exterior, e uma deflação razoável”, diz o executivo. “Devemos ver o desapontamento do investidor, mas isso vai depender de onde ele vai aplicar o dinheiro.”
Na comparação entre países, o mais otimista em relação ao retorno nos próximos anos é o EUA, com uma expectativas média de 15,4%, seguido pela Indonésia (14,8 ) e Argentina (14,6%). O Brasil está na 7ª posição do ranking.
Por outro lado, os investidores mais pessimistas são os japoneses, que esperam 5,9% de retorno anual. Suíça (6,9%) e Itália (7,9%) também estão entre os menos confiantes. A explicação para este cenário é simples: os investidores cujos países viveram um bom momento nos últimos anos estão mais otimistas. Já os que fazem parte das nações com histórico de taxa de juros nas mínimas, e que não tiveram grandes saltos em relação à economia, estão mais realistas.
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“Nos últimos anos, o desempenho do mercado nos EUA e na Indonésia foi muito forte. O Japão, no entanto, tem juros baixos há muito tempo e não tem performado tão bem recentemente”, diz Celano. Para o especialista, os investidores têm a tendência de basear a rentabilidade futura nos rendimentos que tiveram no passado – o que não é aconselhável. Essa situação é mostrada de forma clara no estudo: cerca de 80% dos entrevistados afirmam basear suas previsões em retornos anteriores.
Coronavírus modifica carteiras
O levantamento também mostra que a maioria (79%) dos investidores brasileiros fez alterações na carteira durante o auge do impacto da crise no mercado, entre fevereiro e março de 2020. Desses, 27% migraram para investimentos que possuem risco mais baixo e 16% para riscos mais altos.
O cenário se repete em escala global, com 28% migrando boa parte dos investimentos para aplicações de baixo risco e 20% no caminho contrário, em busca de proteção. Para Celano, é natural que em um momento de crise haja maior aversão à aplicações mais arrojadas, mas que a saída não está necessariamente em diminuir o nível de risco.
“A melhor estratégia é ter um portfólio mais equilibrado no longo prazo, com exposição em moedas fortes, como ouro. A chave é ter uma carteira diversificada”, diz. “Não é necessário migrar para aplicações de baixo risco para isso.”