Bruno Benassi, analista de ativos na Monte Bravo, explica que um dos pontos determinantes para os ganhos do Ibovespa em abril foi o fato de que o índice estava negociando a múltiplos baixos em relação à média histórica – ou seja, a percepção é de que a Bolsa brasileira estava “barata”. “Comparando com os níveis em que o IBOV negociou em momentos de estresse semelhante, esse foi um ponto de entrada interessante para o investidor”, afirma.
Outro fator que favoreceu a Bolsa local foi o sentimento de que o Brasil foi um dos vencedores da política tarifária anunciada por Donald Trump, presidente dos Estados Unidos. No começo de abril, o republicano estabeleceu uma taxa mínima de 10% a todos os parceiros comerciais do país, além de tarifas recíprocas mais altas a outros países.
O Brasil foi enquadrado justamente nessa taxa mínima de 10%, ao lado de nações como Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Chile, Colômbia, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Irã, Panamá, Paraguai, Reino Unido, Turquia, Ucrânia e Uruguai.
“A América Latina como um todo foi pouco tributada em relação a outras regiões e agora pode ganhar novos mercados consumidores – ou até se tornar polo de investimento de algumas indústrias impactadas por tarifas maiores. Pode ocorrer uma realocação do capital que antes ia para o Sudeste Asiático para os países latinos”, diz Benassi.
Após o anúncio das tarifas, os desdobramentos da guerra comercial também contribuíram para melhorar o humor do mercado brasileiro. Uma semana depois da apresentação do tarifaço, Trump disse que interromperia a implementação de suas taxas recíprocas por 90 dias, citando novas negociações com parceiros comerciais. A tarifa mínima de 10%, porém, continuou em vigor.
Diante do recuo do presidente americano, o Ibovespa chegou a saltar 3,12% no dia 9 de abril, com nenhuma ação encerrando o pregão no vermelho. Em Nova York, Nasdaq disparou 12,16% na sessão, enquanto Dow Jones e S&P 500 avançaram 7,87% e 9,52%, respectivamente.
Ao anunciar a pausa nas tarifas recíprocas, Trump aumentou as taxas aplicadas sobre a China – medida que foi prontamente retaliada pelo gigante asiático. Nos últimos dias, no entanto, sinais de um possível alívio nas tensões entre as duas potências deram um novo gás ao Ibovespa. Segundo a Bloomberg, o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, teria afirmado em uma cúpula de investidores a portas fechadas que o impasse tarifário com a China é “insustentável”, acrescentando que um acordo com o país seria possível.
Já na última sexta-feira (2), o Ministério do Comércio do país asiático informou, em comunicado, que avalia a possibilidade de abrir negociações sobre tarifas com os Estados Unidos. Para que o diálogo seja aberto, Washington tem de “mostrar sinceridade”, estar preparado para corrigir “práticas equivocadas” e cancelar as tarifas unilaterais, segundo a pasta.
De acordo com Rubens Cittadin, operador de renda variável da Manchester Investimentos, a diminuição das tensões tarifárias entre as duas maiores economias do mundo tem estimulado a entrada do fluxo de capital estrangeiro ao Brasil. “Esse tem sido um dos principais gatilhos para destravar valor nos emergentes. O fluxo volta a se inclinar para ativos de risco, de onde havia saído com as tensões comerciais no começo do mês”, explica.
Expectativas de juros estáveis também ajudam o Ibov
Além das questões relacionadas à guerra comercial, um fator interno também ajuda a explicar a recente alta do Ibovespa. “O mercado acreditava que o Banco Central iria subir a Selic para um patamar mais alto neste ano. Com a expectativa de as elevações serem menores, as empresas mais impactadas por juros altos passaram a avançar na Bolsa”, diz Bruce Barbosa, sócio-fundador da Nord Investimentos.
Na última edição do Boletim Focus, a projeção para a Selic no fim de 2025 permaneceu em 15% pela 16ª semana seguida, sugerindo que os juros terão de subir 0,75 ponto porcentual acima do nível atual, de 14,25%.
Para Benassi, da Monte Bravo, o Comitê de Política Monetária (Copom) deve elevar a Selic na reunião da próxima quarta-feira (7). A partir daí, a expectativa é de que a taxa permaneça estável nas reuniões seguintes, até que o debate sobre o início do ciclo de cortes volte à pauta.
“Acredito que essa mudança no ciclo da política monetária – com o fim das altas de juros, um período de estabilidade e o início das discussões sobre possíveis cortes – também ajuda a explicar, em parte, o movimento de alta do Ibovespa”, afirma o analista de ativos.
Até onde o Ibovespa pode subir?
Especialistas enxergam que a valorização do índice não deve parar por aqui. Flávio Conde, analista da Levante Ideias de Investimento, acredita que, se for anunciado um acordo entre China e Estados Unidos na disputa comercial, o Ibov pode dar uma nova esticada e alcançar os 138 mil pontos, renovando sua máxima histórica.
Tudo vai depender, no entanto, dos termos desse acordo. Por enquanto, na visão de Conde, o setor agrícola brasileiro foi o que mais se beneficiou com as tarifas, já que as medidas incentivaram a China a ampliar as compras de alimentos do Brasil. “A continuidade desse movimento vai depender do tipo de acordo que for firmado entre o país asiático e os EUA”, afirma.
Caso a negociação avance, o analista espera que também ocorram algumas mudanças nas taxas de 25% sobre a importação de aço e alumínio, o que pode beneficiar tanto o setor de siderurgia quanto o de mineração no Brasil. O mesmo deve acontecer com a taxa de 25% sobre carros estrangeiros, que também afeta empresas locais de peças e autopeças.
Barbosa, da Nord Investimentos, acredita, no entanto, que uma valorização mais expressiva do Ibovespa dependeria não só de questões externas, como também de mudanças no cenário doméstico. “A Bolsa brasileira só deve ganhar tração e voltar para um nível melhor quando tivermos uma política econômica com menos gastos fiscais”, destaca.
Vale investir na Bolsa brasileira agora?
Para quem já tem ações, Conde, da Levante, recomenda manter os investimentos em Bolsa. “Já passamos do período difícil, então o investidor pessoa física agora tem motivos para comemorar: resistiu à queda do mercado e saiu como um dos grandes vencedores, provando que está maduro”, afirma.
O analista também destaca que as expectativas para o próximo ano são positivas, com a possibilidade de queda da Selic e de mudança de presidência no Brasil. “Com uma troca de governo, há uma boa chance de redução dos gastos públicos, o que pode ajudar a diminuir a dívida, o risco-país e as taxas de juros. Tudo isso cria um ambiente bastante favorável para a Bolsa”, diz.
Cittadin, da Manchester Investimentos, concorda que o momento é positivo para manter posições em Bolsa. “O preço sobre lucro (P/L) do Ibovespa ainda está bem atrativo. Entretanto, para aqueles que estão posicionados em setores que não foram tão afetados ultimamente, como o de proteínas, vale certa realização de lucros.”
Bruno Cotrim, economista da casa de análise Top Gain, também aconselha o investidor a ficar atento aos ativos que mantém na carteira. “Ações que vêm se valorizando desde o fim do ano passado podem representar uma boa oportunidade para o investidor realizar parte dos lucros e realocar recursos em papéis que ainda estão descontados”, avalia.
Para quem ainda não investe em ações, o momento pode ser favorável para começar. “A Bolsa é um investimento de longo prazo. A pessoa não deve ficar tentando comprar e vender de acordo com o que acha que o mercado vai fazer no próximo mês. Quem faz isso perde dinheiro no decorrer do tempo”, destaca Barbosa, da Nord.
Hayson Silva, analista da Nova Futura Investimentos, reforça a recomendação, mas destaca a importância de manter a cautela no atual momento. “Como o Ibovespa está próximo da máxima histórica e o cenário externo é volátil, o ideal é entrar de forma gradual, com foco em empresas sólidas e mantendo reserva em caixa para aproveitar oportunidades em eventuais correções”, diz.