“A taxação reduz parte do apelo histórico das LCIs e LCAs, mas não elimina sua relevância para o investidor conservador”, diz Gabriel Santos, especialistas de investimentos de research e estratégia da empresa de soluções financeiras Bloxs. “Mesmo com um rendimento líquido menor, o investidor conservador tende a continuar vendo nessas letras uma opção de baixo risco”, complementa. O FGC garante aplicações de até R$ 250 mil por CPF e instituição.
Reação no Congresso
No final de setembro, o relator da MP 1303 na Câmara, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), propôs a taxação de 7,5% de Imposto de Renda (IR) — antes prevista em 5% — sobre os rendimentos de LCAs e LCI, como parte da proposta do governo em tributar aplicações financeiras e ativos virtuais.
A MP visa padronizar alíquotas para investimentos a partir de 2026, compensando a revogação do decreto sobre IOF (validado posteriormente pelo ministro Alexandre de Moraes do STF) e garantindo receitas para o Orçamento de 2026. Projeções do Ministério da Fazenda estimam R$ 10,5 bilhões em 2025 e R$ 20,8 bilhões em 2026 com essa taxação.
Após apresentação do parecer de Zarattini, houve forte reação dos setores do agronegócio e imobiliário, argumentando que a medida teria forte impacto no crédito privado. A votação do parecer terminou sendo adiada algumas vezes, estava prevista para ser apreciada nesta quinta (2) e o Congresso adiou para o dia 7 de outubro a votação da Medida Provisória, um dia antes dela perder a validade. O governo já admite abrir mão dessa taxação para viabilizar a aprovação da MP.
Encarecimento do crédito, compensação para o investidor
O economista e consultor financeiro André Mirsky confirma que a tributação reduz o apelo das letras de crédito, fazendo com que os bancos precisem pagar mais para captar, o que elevaria o custo para os setores produtivos. “O impacto será mais forte em bancos de menor porte e nas linhas de crédito voltadas ao imobiliário residencial e agronegócio de médio porte”, diz o especialista.
Mirsky lembra que as menores empresas dependem mais deste tipo de instrumento para financiar seus projetos. “Grandes players podem compensar com outras fontes de captação, mas o crédito no varejo tende a ficar mais caro.”
Para o investidor, isso quer dizer que a mordida do imposto pode ser compensada por rentabilidades um pouco melhores. “Os bancos terão de oferecer taxas maiores para convencer investidores a comprar seus papéis já tributados”, observa Jeff Patzlaff, planejador financeiro e especialista em investimentos, que também prevê uma reação no mercado secundário. “Títulos existentes, emitidos até dezembro de 2025, ainda isentos, poderão subir de preço, por serem mais valiosos por permanecerem sem tributação futura.”
Diferenças para CRIs, CRAs e debêntures
Gabriel Santos, da Bloxs, acredita, no entanto, que a repercussão nas taxas será moderada, o suficiente para equilibrara percepção de risco e retorno, preservando o apelo das LCIs e LCAs junto ao público conservador, que gosta da proteção do FGC. Na sua visão, muito embora a rentabilidade, ao final tende a cair, o investidor que procura as letras de crédito muitas vezes valorizam a segurança frente a uma diferença de rentabilidade.
“LCIs e LCAs contam com FGC, enquanto Certificados de Recebíveis Imobiliário e do Agronegócio (CRIs, CRAs) e debêntures não possuem essa proteção e dependem da qualidade do lastro ou da saúde financeira do emissor”, afirma. “Não é só a rentabilidade que importa, mas também o perfil de risco e prazo de cada ativo”, acrescenta. Para ele, o investidor deve avaliar o conjunto da aplicação em termos de liquidez, garantias, tributação e alinhamento com objetivos futuros.
LCIs e LCAs são emitidas por bancos, que recolhem recursos de investidores para financiar setores imobiliário e do agronegócio. Por serem depósitos bancários, contam com a proteção do FGC. Já CRIs, CRAs e debêntures são títulos de crédito emitidos por securitizadoras ou empresas, sem vínculo direto com depósitos. Por isso, não têm cobertura do FGC. O risco recai no lastro (recebíveis, fluxo de caixa) ou na saúde financeira da empresa emissora.
Por essa razão, os especialista acreditam que, apesar de despertar uma tendência de migração para CRIs, CRAs e debêntures incentivadas — que seguirão isentos —, não deverá haver uma fuga massiva para essas alternativas. “Esses ativos têm risco maior, menor liquidez e exigem mais conhecimento técnico”, comenta André Mirsky.
Foco na rentabilidade líquida
Uma maior demanda por papeis de empresas também poderá pressionar preços e reduzir suas taxas de retorno. Com isso, o foco do investidor passa a ser a rentabilidade líquida, descontando impostos e taxas, que podem ser calculadas através de simuladores bancários. “Em muitos casos, um CDB com IR pode render mais do que uma LCI/LCA com baixa taxa nominal, por isso, a decisão deve ser sempre baseada no retorno líquido e na estratégia de longo prazo”, alerta André Mirsky.
Jeff Patzlaff dá um exemplo de como comparar as rentabilidades líquidas. “Se um CDB paga 110% do CDI, e seu prazo de vencimento sugere um imposto de 17,5%, ele vai ter uma rentabilidade líquida de 13,6% ao ano”, diz. “Se uma LCA isenta oferece 100% do CDI, então a rentabilidade dela líquida é de 14,90%.”