O pano de fundo é a expectativa de que a Selic comece a cair a partir do fim do primeiro trimestre de 2026, o que tem impulsionado os preços das cotas e renovado o apetite por risco em um segmento que havia sofrido com o ambiente de juros altos no ano passado.
Segundo levantamento da DataBay, entre os fundos que compõem o IFIX, o desempenho médio foi robusto, com dezenas de FIIs acumulando mais de 20% de valorização no ano. Os dez maiores retornos, no entanto, destoam: variam de 27% a 43%, com destaque para HCTR11 (+43,4%), RBRL11 (+42,2%) e BLMG11 (+41,2%). Em seguida aparecem PATL11, BROF11, VILG11, MANA11, AZPL11, MCRE11 e HSML11, todos com ganhos expressivos e acima de 27%.
Apesar da performance, trata-se de um movimento de correção de preços e não de euforia. A média de P/B (Price to Book ou Preço por Valor Patrimonial – P/VP) entre os campeões é de apenas 0,75x, indicando que mesmo após a alta o mercado ainda precifica um desconto de cerca de 25% em relação ao valor patrimonial desses fundos. Essa recomposição mostra que a valorização foi, em grande parte, fruto da redução dos exageros de 2024, quando muitos FIIs negociavam muito abaixo de seus fundamentos.
Os dados também ajudam a identificar um padrão: a recuperação foi liderada por fundos multiestratégia, tijolo e papel, categorias que reúnem ativos de qualidade e boa diversificação. Já os fundos de desenvolvimento imobiliário, mais arriscados por natureza, também reagiram bem. Por dependerem de projetos em execução e sem geração de renda recorrente, estão sujeitos a maior incerteza sobre resultados, ainda que a baixa liquidez das cotas reduza a oscilação aparente dos preços. Em média, o retorno do Top 10 ficou em 34,1%, caindo para 33,1% quando se exclui o HCTR11, um dos casos mais peculiares do ano.
Apesar da alta expressiva de 43,4%, o desempenho do HCTR11 (Hectare CE FII) precisa ser interpretado com cuidado. O fundo segue negociado com P/VP de apenas 0,21x, reflexo de estresse na carteira de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e de questionamentos sobre governança.
Em 2024 e início de 2025, o HCTR11 enfrentou atrasos em relatórios, suspensão de dividendos e críticas sobre conflitos de interesse em operações estruturadas. Ou seja, a recente valorização reflete apenas uma reprecificação de um ativo descontado, não um avanço operacional consistente. Trata-se de um fundo de risco elevado, que não representa o padrão médio do setor.
O impacto da Selic nos fundos imobiliários
A reabertura do mercado para tijolos ficou evidente nos números setoriais. Os fundos classificados como Tijolo Híbrido – Gestão Definida tiveram alta média de 28,7%, seguidos pelos de Tijolo Desenvolvimento – Gestão Ativa, com 24,1%, e Tijolo Renda – Gestão Definida, com 19,8%.
Os fundos de papel, mais defensivos, cresceram cerca de 16,8%, sustentados por rendimentos elevados em um cenário de juros ainda altos. O investidor parece apostar, portanto, que o ciclo de queda da Selic poderá revalorizar imóveis e comprimir cap rates (taxa de capitalização), impulsionando os fundos de tijolo a partir de 2026.
Quando a taxa básica recua, o custo de oportunidade diminui e o mercado passa a aceitar retornos menores sobre o patrimônio imobiliário, elevando os preços dos ativos. Essa expectativa de valorização futura ajuda a impulsionar os fundos de tijolo, especialmente aqueles com imóveis de qualidade e contratos longos, que tendem a ser mais sensíveis à variação dos juros.
No campo dos rendimentos, os maiores dividend yields (rendimento de dividendos) também chamam atenção, mas exigem cuidado na interpretação. Fundos como GZIT11, BPML11, RZAK11, VGRI11 e KORE11 aparecem entre os principais pagadores do ano, com yields entre 16% e 19% ao ano. Esse número, no entanto, deve ser lido com cautela: quanto menor o preço da cota, maior tende a ser o yield (rendimento), o que pode mascarar fragilidades operacionais. É fundamental observar a origem da renda se vem de contratos sólidos ou de eventos pontuais, antes de concluir que se trata de um bom pagador.
O comportamento recente também ajuda a comparar a realidade dos fundos com as projeções de casas de análise. Em setembro, o Itaú BBA divulgou uma lista de “melhores FIIs para investir visando lucro”, e parte deles aparece de fato entre os de melhor desempenho no acumulado do ano.
Outros, porém, ficaram de fora, mostrando que o mercado ainda é muito sensível ao cenário macro e ao timing de entrada. Em um ciclo de transição como o atual, o mérito tem sido de quem consegue ler corretamente a virada dos juros e o reposicionamento dos investidores.
Com o horizonte de juros em queda, 2026 pode marcar a consolidação da virada dos FIIs. Os fundos de tijolo, hoje com descontos expressivos, tendem a se beneficiar da melhora das expectativas econômicas e da retomada do crédito imobiliário. Fundos de papel continuarão relevantes pela renda mensal, mas o maior potencial de valorização deverá vir do real estate físico.
Para o investidor, o desafio será equilibrar qualidade de gestão, liquidez e risco de crédito, sem cair na armadilha de yields inflados.,
O ano de 2025 mostra, em resumo, que o mercado de fundos imobiliários reencontrou tração, mas exige discernimento. A reprecificação foi clara, mas ainda não é o fim da história: muitos fundos continuam negociando abaixo do valor patrimonial, e a seletividade segue como palavra de ordem. A queda esperada da Selic abre espaço para ganhos adicionais, mas o investidor precisará continuar separando o que é oportunidade real do que é apenas reflexo de ativos estressados.
*Colaboraram no artigo Guilherme Carter, que é economista e especialista em finanças, com carreira dedicada à análise de mercados e inovação em investimentos. Mestre pela FGV-EESP, é professor de Finanças na FGV e coordenador dos programas de Finanças da FBNF. Também é Managing Director da DataBay, fintech de inteligência de dados para o mercado de capitais, e presença constante em debates na mídia sobre economia, renda fixa e investimentos.