Brasileiros dizem saber de finanças, mas 3 em cada 4 erram o básico, mostra pesquisa; entenda o efeito Dunning-Kruger
Pesquisa Santander & Ipsos mostra que, apesar da confiança, população global ainda tem lacunas sobre conceitos básicos de finanças — enquanto cresce o desejo por educação financeira
Pesquisa global do Santander com a Ipsos UK mostra que brasileiros lideram o interesse por educação financeira, mas ainda enfrentam grandes lacunas em conceitos básicos. (Foto: Adobe Stock)
A Pesquisa Global de Educação Financeira 2025, conduzida pelo Santander(SANB11) em parceria com a Ipsos UK, revela um paradoxo inquietante: embora 73% dos brasileiros declarem confiança na gestão do próprio dinheiro, a maioria não domina conceitos básicos de economia, um sinal evidente do Efeito Dunning-Kruger, quando as pessoas acreditam saber mais do que realmente sabem.
O estudo ouviu 19.906 pessoas em 10 países da Europa e das Américas (2.028 delas no Brasil) para mapear como a população aprende sobre dinheiro, toma decisões e percebe a importância da alfabetização financeira. Os resultados revelam um cenário consistente de que existe um interesse global crescente por educação financeira, mas o acesso ainda é limitado. O relatório global do banco mostra que “as pessoas tendem a acreditar que sabem mais sobre finanças do que realmente sabem”.
Embora 73% dos brasileiros e 72% da média global afirmem ter confiança na gestão do próprio dinheiro, a pesquisa mostra que o nível real de entendimento é bem mais baixo. Esse descompasso, explica a pesquisa, é típico do chamado Efeito Dunning-Kruger, quando o indivíduo superestima suas habilidades por não reconhecer as próprias limitações de conhecimento.
A sondagem trouxe duas perguntas conceituais simples, pensadas para medir o nível básico de compreensão econômica da população. A primeira tratava de inflação: “Se a taxa anual de inflação cai pela metade, mas permanece acima de zero, o que acontece com o custo de bens e serviços?”. A resposta correta – de que os preços continuam subindo, apenas em um ritmo mais lento – foi identificada por somente 32% dos entrevistados no mundo. No Brasil, o índice de erro chegou a 73%, revelando uma fragilidade significativa na compreensão de como a inflação afeta o cotidiano.
A segunda pergunta dizia respeito aos juros: “Quanto haveria na conta após aplicar US$ 100 a uma taxa de 2% ao ano?”. Embora a resposta pareça intuitiva – mais de US$ 100 – o resultado mostrou dificuldades generalizadas. Entre os brasileiros, 67% erraram, percentual superior à média global de 48%.
O relatório observa que essa fragilidade não é um fenômeno estritamente brasileiro. Em todas as jurisdições analisadas, os entrevistados demonstraram dificuldades para responder corretamente a questões envolvendo conceitos econômicos básicos.
Educação financeira é desejo global
A falta de acesso a conteúdos de finanças pessoais aparece como um ponto crítico: 84% das pessoas no mundo gostariam de ter aprendido educação financeira na escola, dado que sobe para 91% no Brasil.
“A educação financeira ocupa o segundo lugar entre as disciplinas que a população gostaria que fossem ensinadas nas escolas, superando matérias tradicionais como História e Ciências”, afirma o banco.
A presidente global do Santander, Ana Botín, defende a educação como fomentadora de uma sociedade livre e próspera. “A educação financeira não é um tema técnico, nem secundário: é uma ferramenta essencial para o progresso”, explica.
O que o mundo quer aprender sobre dinheiro
Entre os temas de maior interesse, os padrões se repetem entre países:
Investimentos: 63% (67% no Brasil);
Poupança: 61% (67% no Brasil);
Impostos: 51%;
Orçamento doméstico: 52% (53% no Brasil).
O relatório explica que essa demanda tende a refletir vulnerabilidades reais. Em países latino-americanos, por exemplo, a dificuldade para acumular reservas faz crescer o interesse por poupança. No Brasil, a última Pesquisa de Orçamentos Familiares mostrou que apenas cerca de um quinto das famílias conseguem poupar, e a taxa média de poupança doméstica é de 1,8% da renda disponível.
No Reino Unido, por outro lado, o assunto mais desejado é previdência: 48% sentem que não entendem como funcionam os fundos para a aposentadoria. Já nos EUA, onde 62% da população investe em ações, investimento foi o tema mais desejado.
Brasil se destaca como potência digital
Um dos pontos mais marcantes da pesquisa é o protagonismo brasileiro na digitalização financeira. O Brasil foi o único país onde a confiança no uso de ferramentas digitais para gerir o dinheiro se igualou aos métodos tradicionais: 59% dos brasileiros usam ferramentas digitais semanalmente para acompanhar suas finanças e apenas 13% nunca usam.
“O Brasil aparece como um dos mercados mais avançados na adoção de tecnologias financeiras, impulsionado pelo uso massivo do Pix, utilizado por 87% da população”, escreveu o banco.
Desejo de autonomia e vulnerabilidades persistentes
No Brasil, a maioria dos entrevistados afirma ter algum controle do próprio orçamento: 84% dizem monitorar seus gastos, um índice acima da média global, de 79%. Ainda assim, essa atenção não se traduz, necessariamente, em segurança financeira. Apenas 47% conseguem poupar o suficiente para se manter por três meses em caso de necessidade, evidenciando uma lacuna importante entre intenção e prática.
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A pesquisa mostra também um esforço, ainda limitado, de busca por conhecimento. Somente 28% dos brasileiros já fizeram algum curso de educação financeira, embora esse número seja superior à média global de 20%.
Para o CEO do Santander Brasil, Mario Leão, os dados revelam uma oportunidade clara de avanço. Ele destaca que a educação financeira é tanto um desejo quanto uma necessidade da maior parte da sociedade e afirma que o banco tem responsabilidade nesse processo. Segundo ele, a instituição tem condições de mobilizar agentes públicos e privados para ampliar o conhecimento financeiro da população.
Quem deve ensinar educação financeira?
Há consenso entre os entrevistados:
Escolas: 91%;
Pais: 91%;
Bancos: 71% (91% na Argentina);
Governo: 97% acreditam que deve ter papel ativo.
Além dos benefícios individuais, o estudo aponta implicações macroeconômicas relevantes. A Confederação da Indústria Britânica, citada no documento, estima que elevar o nível de alfabetização financeira poderia adicionar 6,98 bilhões de libras esterlinas por ano à economia do Reino Unido.
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) também destaca que populações com maior conhecimento financeiro têm maior resiliência a crises, menor propensão ao endividamento e menos risco de vulnerabilidades como fraudes.