Ibovespa oscila mais em anos eleitorais – e 2026 pode ser pior, dizem especialistas
Dados da Economatica mostram que a volatilidade sobe com as eleições; polarização política e incerteza em relação ao fiscal vão fazer peso, principalmente no segundo semestre
Presidente Lula (PT) lidera as pesquisas de intenção de voto ate aqui; no mercado, reeleição preocupa investidores. Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
O ano de 2026 ainda nem começou e as atenções de investidores já estão em Brasília. Ainda há vários fatores jogando a favor dos investimentos locais – início do ciclo de corte de juros nos Estados Unidos e possibilidade de que o mesmo aconteça no Brasil ainda no primeiro trimestre do ano que vem; maior entrada de capital estrangeiro e uma Bolsa que segue descontada. Mas aos poucos a euforia de 2025 deve dar lugar à incerteza graças às eleições presidenciais marcadas para outubro.
Um levantamento da Economatica mostra que a volatilidade média do mercado costuma ser maior em anos de eleições. O mercado reduz o apetite a risco até ter visibilidade do cenário e reage – para cima ou para baixo –à medida que vão ficando claras as candidaturas, agendas econômicas e chances de vitória.
Os anos eleitorais tendem a ser mais voláteis, mas não necessariamente negativos. Em 2022, quando o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceu a disputa – a mais polarizada na história recente – do então presidente Jair Bolsonaro (PL), o mercado chacoalhou bastante. Mas acabou encerrando aquele ano com alta de 4,69%. Em 2018, na disputa presidencial anterior que elegeu Bolsonaro, o Ibovespa teve uma alta de 15,02%.
Os dados da Economatica mostram que, na última década, a volatilidade anual das duas disputas eleitorais só fica atrás de 2020, ano de eclosão da pandemia da covid-19; e de 2016, ano do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
É consenso no mercado que 2026 tem tudo para repetir a mesma fórmula e ser um ano de volatilidade elevada, após uma janela desde 2024 de volatilidade baixa.
As eleições de 2026 caminham para ser mais uma disputa bastante polarizada. As pesquisas de intenção de voto divulgadas nos últimos meses mostram um eleitorado dividido entre o atual presidente Lula, único nome forte da esquerda nas simulações, e outros muitos nomes da direita.
Isso mostra que, ainda que o tema já esteja movimentando os investimentos, a pauta ainda está em um estágio inicial. Os pré-candidatos sequer estão definidos e qualquer surpresa pode gerar uma nova onda de volatilidade.
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Basta olhar o que aconteceu no início deste mês. Em 5 de dezembro, o Ibovespa derreteu 4,3%, seu pior desempenho diário desde 2021, com a notícia de que o senador Flávio Bolsonaro (PL) pode ser o representante do ex-presidente Bolsonaro, seu pai, agora preso e inelegível, à disputa eleitoral de 2026.
A notícia caiu como uma bomba no mercado financeiro, que vinha há algum tempo se apoiando na expectativa de que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), seria o candidato da direita nas eleições. Na Faria Lima, o executivo é visto como um nome com maior potencial para vencer o presidente Lula.
Para Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, o “Flávio Day” é uma amostra da volatilidadeque pode afetar investidores em 2026. “Seria diferente, por exemplo, se de um lado fosse o Camilo Santana, do PT, contra o governador Ratinho Jr. ou o Tarcísio. Se fosse esse cenário, a volatilidade poderia ser menos”, diz. “Mas o que vemos a cada quatro anos, e isso aconteceu nos últimos anos eleitorais, são candidatos puxando a polarização e não indo para o centro. Isso faz com que o mercado financeiro sempre trace cenários bem antagônicos do que aconteceria na economia se um ou outro vencesse.”
Não são necessariamente os nomes que importam, explicam os especialistas. O problema está na forma como cada um vê a agenda econômica, mais especificamente, a fiscal. As apostas do mercado na alternância de poder têm a ver com a esperança de que a eleição da direita traga uma política de reformas e cortes de gastos. Para muitos economistas, isso é necessário para controlar o ritmo de crescimento da dívida pública, o que ajudaria a ancorar as expectativas de inflação, reduziria as taxas de juros e, com isso, o próprio custo da dívida. É um ciclo.
“No ambiente altamente polarizado, a visão da maior parte dos agentes econômicos é de que haverá uma disputa entre pautas econômicas opostas. Uma mais fiscalmente responsável, que ajudará na queda dos juros, e outra fiscalmente pródiga e inflacionária”, explica Bruno Perri, economista-chefe, estrategista de investimentos e sócio-fundador da Forum Investimentos. “É um prato cheio para a especulação.”
Como isso impacta as projeções de investimento
A incerteza em relação às eleições tem impactado as projeções do mercado para o próximo ano. No geral, especialistas apontam que o primeiro semestre de 2026 tem tudo para dar continuidade ao movimento positivo visto em 2025. No segundo, no entanto, há maior incerteza.
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“O Brasil tem oportunidades de investimento atraentes e a renda variável se destaca como a classe de ativos mais promissora, com fundamentos sólidos, melhora nas expectativas de lucros e renovado interesse de investidores estrangeiros. Mas a implementação de um programa crível de consolidação fiscal será essencial para sustentar o momentum positivo além do ciclo eleitoral”, diz o UBS em relatório. Veja com detalhes aqui.
Essa incerteza dificulta as projeções. Por exemplo: a estimativa do banco para a Selic é de 12,5% ao final de 2026. Mas a instituição reconhece que, a depender da discussão fiscal, os juros poderiam ir abaixo de 12%.
A Ágora Investimentos trabalha com três cenários para a renda variável em 2026, a depender das eleições. O entendimento é que o cenário global e a perspectiva de queda de juros no Brasil e nos EUA ainda devem manter o momento favorável nos primeiros meses do ano. Depois, a volatilidade política é quem vai ditar os rumos — não a vitória de um candidato A ou B, mas a chance de, quem quer que seja eleito, realizar um ajuste nas contas públicas no início de 2027.
“O ajuste fiscal é fundamental para reduzir a percepção de risco e a taxa de desconto para os valuations. Nosso juro real de longo prazo está ao redor de 7,5%, o que não nos parece sustentável”, destaca a Ágora em relatório. “Trabalhamos com três cenários hipotéticos sobre o ajuste fiscal e, consequentemente, sobre os níveis de juro e o impacto na precificação do Ibovespa.”
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Em um cenário de “ajuste fiscal importante”, a taxa de desconto (os juros) convergiria para 12,5%. Nessa premissa, o Ibovespa poderia bater 241 mil pontos no fim de 2026; um cenário a que a corretora atribui 50% de probabilidade.
Se o ajuste fiscal for mínimo, os juros e a Bolsa se manteriam próximos dos patamares atuais de 14,2% e 158 mil pontos, respectivamente. Já no pior – e menos provável – cenário, sem nenhuma proposta para encarar o problema fiscal, a Ágora vê uma “contínua deterioração das contas públicas”, que poderia elevar os juros para 16,3% e o Ibovespa a 103 mil pontos.
Com os três cenários hipotéticos na mesa, a corretora faz uma projeção intermediária: a pontuação justa do Ibovespa ao final de 2026 seria de 192 mil pontos.
A EQI também mantém o otimismo graças a uma combinação de preço atraente nas ações e início do ciclo de cortes de juros. A projeção para o Ibovespa é de 174 mil pontos ao final do próximo ano. Mas o risco eleitoral pode fazer a corretora revisar as estimativas em meados de 2026.
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A visão é que o mercado deve reagir (e cobrar) principalmente às propostas de enfrentamento do dilema fiscal à medida que o processo eleitoral ganhar mais visibilidade, com candidatos e pautas econômicas definidas. “Caso o presidente eleito não consiga endereçar adequadamente essas questões, entendemos que as expectativas deverão ser revistas, tornando o cenário consideravelmente mais adverso — com revisões negativas nas projeções de lucro das empresas, aumento do custo de capital e das taxas de juros de longo prazo, além de possíveis efeitos depreciativos sobre a moeda”, diz a EQI.