O Brasil vem, há alguns anos, passando por reformas econômicas e ajustes durante diversos governos. O caminho nem sempre foi linear, muitas vezes foi tortuoso. Mas, a dura penas, diversos avanços e conquistas foram atingidos.
Hoje temos reservas internacionais que dão conforto no ambiente externo, um câmbio flutuante que funciona como amortecedor automático para choques externos, um sistema de metas de inflação que conseguiu controlar os preços galopantes do passado e taxas de juros mais baixas.
Contudo, existe ainda uma enorme fragilidade, no âmbito fiscal, das contas públicas, que vinha sendo endereçada ao longo dos últimos meses. Uma Reforma da Previdência foi aprovada, trazendo algum alívio a este campo, porém não endereçando totalmente as fragilidades de nossas contas públicas.
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Outras reformas eram (e são necessárias) e estas vinham sendo estruturadas pelo Governo e negociadas junto ao Congresso. A pandemia, que assolou o mundo no início do ano, contudo, interrompeu abruptamente este processo.
O Governo foi obrigado, e com toda a razão, a criar uma rede de proteção social para que o País e a sociedade atravessassem este desafio de maneira um pouco menos profunda, dado que a crise era inevitável.
Por um lado, sempre me coloquei publicamente a favor das medidas. Elas era – e são – fundamentais para navegarmos essa turbulência. Todavia, sabíamos que o País precisava de uma perspectiva de ajuste, uma vez passado o auge da pandemia e da crise.
Um país com contas públicas frágeis pode ser obrigado a conviver com efeitos colaterais desastrosos em sua economia: menos crescimento, mais desemprego, taxas de juros mais elevadas, taxa de câmbio mais depreciada, empobrecimento da população, e assim sucessivamente.
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Nas últimas semanas, a despeito da boa sinalização do governo com a o encaminhamento da Reforma Tributária, vejo sinais preocupantes no ambiente político em tentar utilizar a pandemia como “desculpa” ou como um “caminho” mais fácil para aumentar gastos, reduzir receitas e piorar as contas públicas do País.
Reforço que a atuação do governo na pandemia era necessária, fundamental e inadiável. A rede de proteção social que foi criada era indispensável para que a economia e a sociedade atravessassem esta crise de maneira um pouco mais suave e menos danosa.
Contudo, é de conhecimento público que o quadro fiscal brasileiro era frágil e necessitava de reformas estruturais para voltar ao caminho sustentável no longo prazo.
Sou da opinião de que o mercado daria (ou dará) o benefício da dúvida ao Governo e ao Congresso enquanto houver esperanças de que, acabada a pandemia, voltaremos a ter uma postura de austeridade, além de voltar a discutir e aprovar reformas econômicas.
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Uma vez perdidas essas esperanças, a situação do País é demasiadamente frágil, tanto em termos absolutos, como em termos relativos – se comparado aos nossos pares emergentes. Isso pode trazer uma pressão não desprezível (e negativa) aos ativos locais.
Talvez, o movimento que vimos nos últimos dias seja uma prova do que pode estar por vir caso esse rumo não seja ajustado. Nos últimos dias, vimos forte depreciação cambial, um desempenho relativo do Ibovespa mais negativo e alguma pressão altista na curva de juros.
Um país com contas públicas frágeis leva a uma economia frágil, e isso pode ter impactos relevantes e negativos sobre qualquer portfólio alocado em ativos no Brasil.
Continuo bastante otimista com as perspectivas que o Brasil pode apresentar, contanto que as reformas econômicas sejam retomadas.
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Neste momento, talvez, este seja um dos temas mais importantes para determinar a direção estrutural do País e de seus ativos. Caso a austeridade fiscal seja abandonada de maneira estrutural, e não apenas pontual, poderemos conviver com uma mudança substancial de cenário.
Não é a minha intensão adotar uma postura negativa ou alarmista neste momento. Diversos avanços foram conquistados pelo Brasil nos últimos anos (talvez na última década), mas precisamos estar cientes dos riscos ainda existentes em um país cujos fundamentos ainda demandam reformas estruturais e que pode estar caminhando para uma rota de mais desequilíbrios fiscais.
Esse caminho ainda não foi escolhido. Ainda tenho a esperança de que a racionalidade econômica será mantida; mas precisamos estar atentos e preparados para ajustar as velas caso os ventos mudem de direção.