Paulo Guedes, ministro da Economia: sua presença no governo mantém a confiança dos investidores no Brasil. (Adriano Machado/ Reuters)
Nesta semana, um relatório do banco Goldman Sachs sacudiu o mercado brasileiro com uma nova onda de otimismo. Esse otimismo se refletiu na Bovespa, que mostrou sólido e surpreendente crescimento ao longo dos últimos dias, embora o relatório tenha pontuado que as ações de empresas brasileiras foram fortemente afetadas – foram os ativos de pior desempenho em dólar entre os mercados emergentes – e ainda que apresentamos uma queda de 48% desde janeiro, agravada pela depreciação do real. Essa conjunção de fatores, certamente se deixou influenciar pelas recorrentes crises políticas encapsuladas dentro da super crise da covid-19.
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O pessimismo em relação ao Brasil tem uma base institucional forte e não está, necessariamente, centrado na qualidade e na oportunidade que alguns ativos representam. Dentro da lógica binária que impera hoje, somos induzidos a fazer uma leitura de que o investidor estrangeiro está otimista ou pessimista em relação ao país. Porém, diferentes graus de pessimismo podem gerar uma sensação de oportunidade ou de resguardo.
O otimismo em relação a um mercado engloba inúmeras possibilidades e variações de investimentos (hedge, renda variável a curto prazo, investimentos estruturantes de longo prazo etc.). O pessimismo, dentro de suas variações de intensidade, também pode render oportunidades.
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Afinal, a crise política recorrente no Brasil ainda se mantem dentro de uma institucionalidade incomum entre outros mercados emergentes. A expectativa de uma tragédia institucional e de um tsunami avassalador que culminaria em um impeachment do presidente Bolsonaro é o cenário paralisante do pessimismo mais hardcore.
À medida que esse cenário não se concretiza, mesmo com pessimismos localizados e específicos, uma sensação de “normalização” do comportamento errático do governo se espalha. Isso estimula uma visão menos destrutiva do caos político brasileiro e a compreensão de que, mesmo com confrontação política, uma ruptura institucional não irá ocorrer.
O Goldman Sachs aposta nesse “pessimismo manejável” para recomendar a compra de posições de mais longo prazo na Bovespa, dentro da expectativa de 90 mil pontos. Categorizando ativos brasileiros como “candidatos ideais para a recuperação”, o Goldman aposta que o cenário institucional ruim não se converterá em péssimo ou trágico. Naturalmente, há uma grande dose de subjetividade entre o que é péssimo para alguns e razoável para outros. Nesse caso, a possibilidade de “comprar barato e vender caro” é a aposta dessa leitura do Goldman.
Três fatores importantes são ressaltados:
baixa participação de investimento externo,
significativo ciclo de relaxamento monetário e
baixas margens de ganhos das ações parecem já estar precificados.
Logo, o que resta para uma depreciação ainda maior, já que as incertezas em relação ao ambiente político permanecem? A resposta estaria no desenrolar catastrófico dessas incertezas. Dentre várias, cito (não necessariamente em ordem de importância):
Saída do Ministro da Economia Paulo Guedes. A saída de Paulo Guedes é tratada como impactante, não necessariamente por um apreço absoluto do mercado para com ele, mas pela acentuação da incerteza sobre qual rumo a economia teria com um outro ministro. Hoje criticam menos as ideias do ministério e mais a sua capacidade de execução. Outro nome geraria um reboot de confiança sobre ideias e capacidade de entrega.
Depressão Econômica. Desemprego fora do controle, falências de empresas e derretimento de confiança são indicadores de uma batalha quase perdida. Dados do Caged em abril mostram 1,5 milhão de demissões e 600 mil contratações. Levando em consideração que a covid-19 se manterá forte até agosto, esse dado preocupou o estrangeiro de forma mais aguda que o investidor brasileiro, que esperava números piores. Pessimismo manejável versus pessimismo catastrófico.
A não confirmação do catastrófico. E não especificamente uma melhora na conjuntura como um todo, fará com que os ativos se valorizem.
Narrativa parlamentar de reformas em 2021 (mesmo sendo secundária como urgência perante as ações necessárias para a contenção da crise e a manutenção da economia). Importante ressaltar que a demonstração de confiança em aprovar reformas convence mais o investidor quando parte de lideranças parlamentares do que do Ministério da Economia.
Avanços em alguns projetos de lei específicos. Tais como a do Saneamento, SEaC (Serviço de acesso Condicionado) etc.
O risco político no Brasil ainda não bem precificado pelos investidores
A velocidade da geração de fatos negativos no ambiente político é tão intensa que para alguns investidores passou a ser normal. No entanto, novos fatos negativos (que são uma tendência) geram um acúmulo que, mesmo normalizado entre investidores brasileiros, pode significar um limite para o estrangeiro, principalmente se outro mercado emergente se mostrar mais atraente.
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O risco político não parece estar bem precificado por investidores no Brasil e no exterior. A precificação de algo subjetivo como a política é bem difícil, por isso analistas políticos tentam auxiliar nessa leitura. As predileções pessoais e o cruzamento de aceitação (alguém concorda com ações A e B do governo e passa a olhar positivamente para as ações C e D, mesmo que não façam sentido e representem risco) aumentam a subjetividade e embaçam a visão de futuro.
A alocação de investidores brasileiros na Bolsa, dado os juros baixos, peso dos bancos e recuperação de commodities (entre outras variáveis) continuará ocorrendo. Não irá se traduzir, obrigatoriamente, na mesma visão que o estrangeiro tem da Bolsa.
O Goldman Sachs realmente transmitiu confiança para o investidor de curto prazo – horizonte de 3 meses e fundos hedge. É uma recomendação de alocação de curto prazo (horizonte de 3 meses) com risco cambial limitado. Para o de longo prazo, mirando o Brasil nos próximos 10, 20 anos, o buraco é mais embaixo.
O clima de confiança não substituirá as análises e expectativas estruturais de longo prazo. A “tara” em reformas vem desse tipo de investidor que busca traduzir os próximos 10 anos em uma planilha de Excel. Para estes, a usina geradora de crises e incertezas que se instalou em Brasília gera apreensão, pois sabem que quanto mais profunda são as crises, mais emotivos, impulsivos e irracionais os governos latino-americanos tendem a ser.
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O Brasil já foi a exceção à regra diversas vezes, mas em análises de investimentos de longo prazo há pouco espaço para interpretações otimistas por meio das análises de curto prazo. Atraímos bastante investimento quando o mundo vivia um otimismo econômico sem precedentes, crescemos quando a China fez do Brasil um supermercado de commodities. Agora, para nos recuperarmos, dependemos das nossas próprias ações, disciplina de cronograma, eficiência, transparência, diálogo e claras políticas de Estado. Aí é que mora o perigo.