- Até pouco tempo atrás, os debates da reforma tributária giravam em torno das discussões sobre o consumo e renda
- O Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) é de competência dos Estados e do Distrito Federal
- Muitos Estados têm aproveitado a “oportunidade” para aumentarem as alíquotas do imposto até o limite de 8%
Até pouco tempo atrás, os debates da reforma tributária giravam em torno das discussões sobre o consumo (instituição da Contribuição sobre Bens e Serviços, do Imposto sobre Bens e Serviços e do Imposto Seletivo) e renda (tributação dos lucros e dividendos, extinção do JCP, mudança na tributação das offshores e dos fundos de investimentos).
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Com a edição da Emenda Constitucional (EC) nº 123/2023, no entanto, os holofotes foram deslocados para um outro tributo: o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), de competência dos Estados e do Distrito Federal.
A principal mudança foi o estabelecimento da obrigatoriedade de as alíquotas do ITCMD serem progressivas em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação, ou seja, de aumentarem à medida que cresce a base de cálculo, sistemática que teve sua constitucionalidade referendada pelo STF (RE 562.045 – Tema 21 da Repercussão Geral) antes mesmo da reforma tributária.
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Além de promoverem a alteração das suas legislações para estabelecerem a progressividade das alíquotas do ITCMD, conforme o novo regime jurídico constitucional, muitos Estados também têm aproveitado a “oportunidade” para aumentarem as alíquotas do imposto até o limite de 8% autorizado pela Resolução nº 9/1992 do Senado Federal.
No Estado de São Paulo, por exemplo, o Projeto de Lei nº 07/2024 estabelece que a alíquota do ITCMD, que hoje é de 4%, passará a ser progressiva, com percentuais de 2% a 8%, considerando o valor dos bens envolvidos.
Diante desse cenário de alterações na legislação tributária e a consequente elevação na carga fiscal incidente sobre as doações e heranças – ainda mais considerando que tramita no Senado Federal o Projeto de Resolução nº 57/2019, que aumenta a alíquota máxima do ITCMD para 16%) – tem-se verificado, de um lado, uma corrida dos contribuintes para a implementação de planejamentos patrimoniais e sucessórios, e, de outro, um crescente movimento fiscalizatório por parte dos Estados em busca de incremento na arrecadação.
Nesse embate entre fisco e contribuinte, um dos temas mais controvertidos diz respeito à base de cálculo do ITCMD incidente na transferência de participações societárias não negociadas no mercado.
Com fundamento nos artigos 38 e 148 do CTN, os Estados têm defendido a possibilidade de arbitramento da base de cálculo do ITCMD pelo valor venal (percepção de valor do mercado) das participações societárias transferidas.
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No entanto, no caso de participações societárias que não possuam valor de mercado, ou seja, que não tenham sido objeto de negociação no mercado de ações, deve ser considerado o seu valor patrimonial, isto é, o valor apurado em balanço patrimonial específico levantado no momento da transferência das participações societárias.
De fato, sob a ótica específica da estruturação dos planejamentos patrimoniais e sucessórios, o cálculo do ITCMD sobre o valor patrimonial é o mais correto a ser aplicado, pois reflete o patrimônio líquido da empresa. Avaliar participações societárias pelo valor de mercado extrapola o conceito contábil de valor patrimonial.
Nesse sentido, o Estado de São Paulo possui regra específica sobre o tema. Nos termos do artigo 14, § 3º, da Lei Estadual nº 10.705/2000, artigo 17, § 3º, do Decreto nº 46.655/2002 e item 11.2.2.b, do Anexo VIII, da Portaria CAT nº 15/2003, no caso de bens ou direitos que não possuam valor de mercado, ou seja, que não tenham sido objeto de negociação nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores à ocorrência do fato gerador do ITCMD, deve ser considerado o seu valor patrimonial.
A despeito disso, em 2021, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, por meio da Resposta à Consulta Tributária nº 24.429, determinou o uso do valor patrimonial real das participações societárias para o cálculo do ITCMD. Considerando o numeroso contencioso sobre a matéria, tudo indica que tal entendimento vem sendo mantido pelas autoridades fazendárias.
No entanto, atualmente, a questão se encontra pacificada no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que manifesta entendimento favorável aos contribuintes, adotando como base de cálculo o valor patrimonial contábil das participações societárias transmitidas, tal qual descrito no balanço da empresa .
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E, considerando a impossibilidade de o Superior Tribunal de Justiça analisar eventual violação à legislação estadual, a exemplo da Lei nº 10.705/2000 (vide REsp nº 1.744.718/SP), tudo indica que as decisões favoráveis proferidas pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo serão mantidas pelas instâncias superiores.
Assim, ainda que o posicionamento das autoridades administrativas possa representar um risco de autuação objetivando a cobrança do ITCMD sobre o valor de mercado das participações societárias transmitidas, o Poder Judiciário é firme no sentido contrário, adotando o valor patrimonial contábil como base de cálculo do imposto.
*Ednaldo Rodrigues de Almeida Filho é advogado do Candido Martins Advogados e possui 13 anos de experiência na atuação nas áreas consultiva (consultoria regular, planejamento tributário e operações de M&A) e contenciosa (litígios administrativos e judiciais), representando interesses de clientes corporativos dos mais diversos setores econômicos, de âmbito local e internacional. Possui bacharel e doutorado em Direito pela Faculdade de Direito do Recife (Universidade Federal de Pernambuco – UFPE).