A investidora independente

Luciana Seabra é analista e planejadora financeira certificada (CNPI e CFP®), especialista em fundos e previdência. Fundou a Indê Investimentos, que tem como princípio a ausência de vínculo com corretoras, gestoras ou bancos. Foi premiada pela CVM pelo seu trabalho de educação financeira a investidores. Está nas redes sociais como @seabraluciana, no Instagram e no YouTube, e @luciana_seabra, no Twitter

Luciana Seabra

Se você não tem uma bola de cristal, não se mexa

'Market timing' é exercício de futurologia, e investidores sérios evitam isso

'Market timing' é tentativa de acertar o momento de mercado pra comprar ou vender ações; seguir política de longo prazo é mais efetivo. Foto: Envato
  • A proposta que clientes têm recebido hoje é reduzir a fatia em fundos de ações ou até zerá-la para atravessar o período eleitoral
  • Não há qualquer exercício de futurologia ou tentativa de acertar o momento de mercado pra comprar ou vender (o tal do market timing) nessa decisão, apenas o de seguir os alvos da política de longo prazo
  • Deveríamos estar fazendo exatamente o oposto, ou seja, repondo a fatia em Bols

“Investidores sérios evitam o market timing“, escreve David Swensen, a maior referência em alocação em fundos do mundo. Entenda-se por market timing, ainda nas palavras dele, “uma aposta de curto prazo contra os alvos da política de longo prazo”. Já explico.

Parece óbvio aderir aos ensinamentos de quem pegou os fundos da Universidade Yale em 1985 com US$ 1,3 bilhão e conseguiu fazê-los ultrapassar US$ 30 bilhões três décadas depois com retorno médio anual de 12,4%.

O fato é que vejo muita gente – do varejo à gestão de fortunas – prescrevendo market timing.

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A proposta que clientes têm recebido hoje é reduzir a fatia em fundos de ações ou até zerá-la para atravessar o período eleitoral.

Pior ainda é quando ela vem acompanhada de uma recomendação para aumentar a parcela em fundos de crédito com base no retorno de 2021 – que, dificilmente, vai se repetir, dado que refletiu uma recuperação em relação ao estresse sem precedentes de 2020.

Ter bons resultados com market timing, diz Swensen, “exige que se esteja certo, no curto prazo, sobre fatores impossíveis de prever” – em outras palavras, exige ter uma bola de cristal.

Seguindo Swensen, deveríamos estar fazendo exatamente o oposto, ou seja, repondo a fatia em Bolsa.

Minha alocação em bons fundos de ações é de 30% – então cabe a mim investir para retomar essa parcela, que encolheu com o estresse recente.

Não há qualquer exercício de futurologia ou tentativa de acertar o momento de mercado pra comprar ou vender (o tal do market timing) nessa decisão, apenas o de seguir os alvos da política de longo prazo, como ensina Swensen.

O caminho mais sensato seria montar uma carteira de fundos de ações bem selecionados para o longo prazo – recomendamos um horizonte mínimo de cinco anos. Os ajustes seriam feitos apenas para voltar aos percentuais da alocação estrutural, sem qualquer relação com o que se passa na economia, na política ou na conversa do bar.

Decidimos testar essa hipótese com os 17 fundos de ações aprovados em nossas análises quantitativas e qualitativas com histórico de pelo menos cinco anos. Deles, apenas dois não superaram o Ibovespa nesse período.

Fizemos dois testes. No primeiro, avaliamos o resultado do investidor azarado: aquele que, por ir e vir, perdeu logo o melhor semestre do fundo em questão. Nesse caso, por ficar de fora por apenas seis meses, trocando o fundo por um investimento em CDI, essas pessoas perderiam para o Ibovespa em 13 dos 17 produtos.

Ou seja: se você quer dar uma saidinha do fundo e voltar daqui a pouco, tenha certeza de que sua bola de cristal está bem encerada. Perder um bom semestre faz total diferença.

No segundo teste, buscamos simular uma situação parecida com a recente, dado que muitas pessoas estão resgatando de fundos de ações com base em seu desempenho no segundo semestre de 2021 – um dos piores da história para muitos deles.

Nesse caso, calculamos o retorno de quem decidiu sair do fundo logo após seu pior semestre. Parece sensato, né? O fundo teve um semestre horrível, você resgata e fica no CDI no semestre seguinte.

Nesse caso, o desempenho do investidor foi pior do que o Ibovespa em seis dos fundos estudados na janela de cinco anos, além dos dois que já não tinham batido o referencial.

Em todos, com exceção de um, o investidor teria deixado dinheiro na mesa. Ou seja, sair correndo na sequência do período de maior estresse foi um erro.

Não tem mágica. Esses estudos só refletem um fato: o mercado é cíclico e somos péssimos em adivinhar o futuro. O mais sensato – e prático, diga-se de passagem – é parar com o market timing.

Defina qual percentual quer ter em fundos de ações, monte uma boa carteira, volte à fatia original quando ela encolher ou crescer e repita isso por pelo menos cinco anos. Simples assim.