O olhar do mercado internacional

Thiago de Aragão é diretor de estratégia da Arko Advice e assessora diretamente dezenas de fundos estrangeiros sobre investimentos no Brasil e Argentina. Sociólogo, mestre em Relações Internacionais pela SAIS Johns Hopkins University e Pesquisador Sênior do Center Strategic and International Studies de Washington DC, Thiago vive entre Washington DC, Nova York e Brasília.
Twitter: @ThiagoGdeAragao

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Thiago de Aragão

Quem vai pagar a conta da crescente tensão entre China e EUA?

Entenda como os embates entre as duas potências podem causar turbulências econômicas em todo o mundo

Um embate entre China e EUA traz consequências ruins para o mundo. Foto: Rustamxakim/Shutterstock
  • Um conflito entre EUA e China comprometeria os acordos dos dois países para desenvolvimento de combustível verde, além de pesquisas aeroespaciais
  • Acordos comerciais importantes firmados entre EUA e China também seriam rompidos, o que prejudica os países menores, que dependem das duas potências para estabilidade, segurança e economia
  • A instabilidade entre EUA e China fortalece a Rússia, que pode reconquistar sua influência no Leste Europeu

O abate de um suposto balão de espionagem chinês pelos Estados Unidos tem pressionado ainda mais a já tensa relação entre essas duas nações. A tecnologia é um dos principais pontos de discórdia, com ambos os lados acusando-se mutuamente de espionagem tecnológica e roubo de propriedade intelectual. Este incidente é apenas o mais recente de muitos que têm pressionado as relações entre os EUA e a China.

Os EUA afirmam que a China continua a roubar tecnologia e propriedade intelectual americanas, o que resultou em bilhões de dólares em perdas para as empresas americanas. E como resposta, os EUA impuseram tarifas às importações chinesas e sancionaram as principais empresas chinesas de tecnologia, como a Huawei. A China negou estas alegações e acusou os EUA de usar a tecnologia para manter sua hegemonia global.

Apesar desta tensão, ainda há muitas áreas onde a China e os EUA cooperam quando se trata de tecnologia. Por exemplo, os dois países trabalham juntos no desenvolvimento de novas tecnologias de energia verde e compartilham certos dados sobre missões de exploração espacial.

Este comportamento cooperativo indica que ambos compreendem o quanto têm a ganhar com o trabalho conjunto em termos de progresso tecnológico.

Em última análise, as tensões entre a China e os EUA continuarão a aumentar se os dois lados não tomarem medidas para se engajar em um diálogo mais construtivo sobre suas respectivas agendas tecnológicas. A comunidade internacional precisa que ambas as nações se unam a fim de assegurar prosperidade mútua através do avanço tecnológico e não do azedume devido a diferenças sobre supostas atividades de espionagem ou reclamações econômicas.

As tensões entre Pequim e Washington DC têm o potencial de criar resultados negativos consideráveis, não apenas para os dois países envolvidos, mas também para o mundo inteiro. Uma das principais questões é que isso poderia levar a um aumento da expansão militar e da armamentização, com ambos os lados tentando construir seus respectivos arsenais, criando uma perigosa corrida armamentista global. Isso poderia resultar em um aumento da atividade militar em regiões disputadas ou através das fronteiras, aumentando os conflitos e potencialmente levando à guerra.

A rivalidade crescente entre Pequim e Washington DC também poderia levar a mais turbulências econômicas em todo o mundo. Ambos os países são atores importantes na economia global, portanto qualquer deterioração nas relações poderia perturbar os acordos comerciais existentes e causar tumultos nos mercados internacionais. Muitas economias menores dependem dessas potências maiores para suas estabilidade e segurança; se a tensão aumentar entre elas, isso pode ter um impacto profundo nas economias de todo o mundo.

A Rússia pode ser um dos maiores beneficiários das tensões entre Pequim e Washington DC, uma vez que eles poderiam tirar proveito da situação, fortalecendo suas próprias alianças e retirando o foco de cima de si (por mais que isso seja virtualmente impossível enquanto a guerra na Ucrânia prosseguir). Isso poderia possibilitar que a Rússia se reorganizasse e fortalecesse seus interesses no Leste Europeu, o que não seria benéfico nem para a China nem para os EUA. Inclusive não haveria benefícios para a paz e a estabilidade global.

Outra consequência potencial desta tensão é que ela pode desencorajar a cooperação em questões importantes como a mudança climática, onde a colaboração entre dois dos maiores poluidores é desesperadamente necessária se quisermos limitar seus efeitos em nosso planeta. A mudança climática exige uma ação coletiva de todas as nações ao redor do mundo, portanto, qualquer desacordo ou falta de cooperação entre duas grandes potências dificultará severamente nossas chances de encontrar uma solução eficaz.

Finalmente, o aumento das tensões entre Pequim e Washington DC pode causar uma maior polarização dentro de ambos os países à medida que os adeptos da linha dura se tornam mais arraigados e aqueles com opiniões moderadas são silenciados ou ignorados pela retórica nacionalista dos líderes políticos. Isto pode tornar ambos os países cada vez menos tolerantes a diferentes visões, o que pode levar à agitação civil ou à convulsão social dentro da sociedade, causando ainda mais perturbações em escala global.