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Comportamento

O segredo dos proprietários de imóveis para facilitar a herança e diminuir os impostos

Reforma tributária também pode interferir no planejamento sucessório e na decisão de transmitir patrimônio

O segredo dos proprietários de imóveis para facilitar a herança e diminuir os impostos
Imagem: Adobe Stock

Histórias de brigas em família por causa de herança, sobretudo de imóveis, são comuns e muitas vezes vão parar no tribunal. Além de todo o desgaste comum nesse tipo de situação, filhos, cônjuges e parentes acabam tendo que pagar os custos com advogados, inventário e partilha de bens. Para evitar transtornos, especialistas em sucessões dizem que o recomendado é transmitir, ainda em vida, o patrimônio acumulado ao longo dos anos aos seus familiares. É o que vem sendo chamado de planejamento sucessório para transmissão de imóveis.

Em 2013, um grave acidente de carro fez o tenente André Mariano Silva, de 49 anos, procurar um advogado para regulamentar a transferência patrimonial para seus dois filhos, à época menores de idade. Para isso, o inventário precisou ser judicial e passar pela supervisão e acompanhamento do Ministério Público. “Quando acordei do coma induzido, eu só fazia chorar. Pensei em como eles ficariam sem o meu apoio financeiro. E, por serem menores de idade, talvez outros parentes pudessem se aproveitar da situação”, diz.

Embora não exista um momento ideal para iniciar um planejamento sucessório, especialistas explicam que a antecipação pode ser uma grande aliada nesse processo. A ideia é que, quanto mais cedo uma pessoa começar a elaborar uma estratégia eficiente, maior será o tempo disponível para que a família compreenda as propostas e para que os profissionais envolvidos analisem detalhadamente a documentação necessária e executem o trabalho com precisão.

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“Entendo que esse assunto tem que fazer parte do planejamento de vida, a documentação dos bens tem que estar regularizada, as pessoas envolvidas têm que ter ciência do planejamento e da vontade do proprietário para que não passem pelo efeito ‘surpresa’, o que muitas vezes vem acompanhado de prejuízo, por falta de planejamento”, conta a advogada e corretora de imóveis, Simone Campagnoli.

Mas um entrave social atrapalha que o planejamento sucessório seja uma prática comum nas famílias: o tabu sobre a morte. “Vivemos numa sociedade que prefere não falar sobre ela. Encaram a morte como um assunto pesado e até desnecessário. Isso é até compreensível porque envolve medo, tristeza e perda. Vale lembrar que muita gente acha, inclusive, que a morte é um assunto íntimo. E, por isso, deve ser evitado”, analisa a doutora em sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), Simone Ribeiro.

Entretanto, Campagnoli defende um diálogo aberto e transparente entre os membros da família sobre o planejamento para evitar dúvidas e mal-entendidos no futuro. “Todo planejamento e organização nesse assunto poderá evitar despesas e custos que já não são pequenos de se tornarem muito altos, o que, na maioria das vezes, acaba inviabilizando a abertura ou o encerramento dos inventários”, explica.

Na mesma linha de pensamento, a advogada e especialista em direito de família e sucessões, Marina Teixeira Monteiro, diz que, muitas vezes, o patrimônio a ser deixado por herança não diz respeito somente à questão financeira. “Está relacionado ao legado, nome e história da família, e um planejamento bem alicerçado e respaldado juridicamente, e que leve, também, em consideração esses valores, pode evitar que a sucessão se transforme em uma infindável disputa familiar”, afirma.

Cercada de documentos registrados no cartório, a professora universitária aposentada Rosamaria de Castro, de 76 anos, já dividiu os bens que ela vai deixar para filhos e netos. Ao todo, segundo ela, são dois apartamentos na zona sul de São Paulo e uma casa de campo em Petrópolis, no Rio de Janeiro. “Quando a gente envelhece, é sempre uma alegria acordar e estar viva por mais um dia. Mas isso não será para sempre. Por isso, nos últimos anos, depois de refletir tanto sobre a morte, com uma certa consciência, decidi deixar tudo organizado ainda em vida”, diz.

Planejamento sucessório: dicas de como fazer

Antes de iniciar a elaboração de um planejamento sucessório é fundamental considerar diversos aspectos, como a localização do imóvel, valor de mercado, a situação registral e eventuais dívidas ou ônus sobre os bens, aconselha a advogada e especialista em direito de família e sucessões, Marina Teixeira Monteiro. “Um levantamento patrimonial detalhado não só facilita o planejamento sucessório, mas também contribui para uma transição mais tranquila e ordenada, beneficiando todos os envolvidos”, pontua.

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A presença de um advogado especializado em sucessão é importante para evitar disputas familiares durante o processo de partilha de bens. Esse profissional atua não apenas nas questões legais, mas também na orientação sobre a divisão de imóveis e na redação de documentos claros e precisos, como testamentos e contratos de doação. 

Além disso, o advogado realiza análises e planejamentos fiscais da sucessão e cuida da regularização de documentos e imóveis, quando necessário. Conheça as três etapas fundamentais de um planejamento sucessório eficiente:

  • Levantamento do patrimônio familiar: o primeiro passo é realizar um levantamento minucioso de todos os bens da família. Isso inclui identificar a localização dos bens, seu valor de mercado, situação registral e possíveis dívidas ou ônus sobre eles;
  • Identificação dos futuros herdeiros: envolve verificar a existência de herdeiros necessários – aqueles que, conforme a lei, devem receber uma parte da herança. Além disso, é importante considerar se há cônjuge ou companheiro e qual é o regime de bens da união;
  • Escolha da melhor estrutura sucessória: com essas informações, a família pode avaliar qual a melhor forma de estruturar a sucessão. Hoje em dia, existem diversas possibilidades, como a elaboração de um testamento, a criação de uma holding familiar, a realização de doações, entre outras opções.

Quais são os documentos importantes para transmissão de bens?

Para um planejamento sucessório eficiente, é necessário reunir documentos como a declaração de imposto de renda pessoa física (IRPF) do titular do patrimônio e de seu cônjuge ou companheiro(a), acompanhada da cópia da certidão de casamento ou contrato de união estável. Além disso, devem ser indicados os bens não incluídos na declaração de IRPF, com a data de aquisição e o valor de mercado, incluindo participações societárias.

Informações sobre a destinação dos imóveis (locação, compra e venda ou uso próprio) e o valor da locação também são importantes. Os contratos sociais das sociedades das quais o titular faz parte e o último balanço patrimonial devem ser incluídos. Também são necessárias informações sobre o estado civil dos beneficiários, com indicação do grau de parentesco. Para casados, é preciso indicar o regime de bens; em caso de união estável, desde quando existe e se há pacto escrito; para viúvos ou divorciados, a situação da partilha deve ser detalhada.

Independentemente da relação, deve-se indicar os filhos do titular, destacando os menores e suas idades. Além disso, é necessário incluir o espelho do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), a escritura ou ônus reais dos imóveis e, por fim, o último testamento, caso exista.

Leia mais: 5 estratégias para evitar briga na família por causa de herança; confira

Quanto custa fazer um planejamento sucessório?

Os custos envolvidos no planejamento sucessório podem variar com base na estratégia escolhida para transferir bens imóveis. Segundo os especialistas, atualmente existem duas abordagens principais: o planejamento sucessório em vida, que envolve ações como doações (com ou sem reserva de usufruto) e a criação de holdings familiares para a gestão dos bens, e o planejamento pós-morte, que inclui testamentos e inventários.

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Ao calcular os custos, é importante incluir impostos aplicáveis, como o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), cujas alíquotas variam de 2% a 8% sobre o valor dos bens doados ou transmitidos por inventário. Também devem ser consideradas taxas de cartório, possíveis avaliações de imóveis, custas judiciais, honorários advocatícios e despesas para regularizar imóveis.

Como diminuir a carga tributária da transmissão de bens?

No caso específico de planejamento sucessório, diversos fatores podem influenciar na redução da carga tributária, especialmente dependendo da maneira escolhida para transmitir o patrimônio, segundo especialistas. Por exemplo, doações feitas em vida podem ter uma alíquota de Imposto sobre ITCMD mais baixa em comparação com transmissões após a morte. Além disso, a advogada e especialista em direito de família e sucessões, Marina Teixeira Monteiro, diz que a criação de holdings familiares não só oferece proteção patrimonial como simplifica a gestão dos bens.

“A escolha ou alteração do regime de bens do casal para comunhão universal, cuja meação alcança um patrimônio maior e normalmente não está sujeita à tributação de transmissão, ou ainda, a contratação de um seguro de vida pode ser uma estratégia para prover recursos financeiros que possam compensar a carga tributária sobre a herança dos bens imóveis. Também é indispensável atentar para as regras de isenções e deduções fiscais, especialmente em relação ao ITCMD, que variam de estado para estado”, ensina.

Mas a advogada e corretora de imóveis, Simone Campagnoli complementa que esses assuntos requerem estudos específicos. “Para decidir qual melhor estratégia, será necessário realizar um estudo da situação real e a decisão dependerá da situação do patrimônio, número de herdeiros. Cada caso é um caso, mas, com boa análise profissional e antecipação, com certeza é possível a redução da carga tributária”, completa.

Reforma tributária: o que pode mudar no imposto sobre herança de imóveis?

A reforma tributária (PEC 45/2019), debatida no Brasil ao longo de três décadas, foi aprovada pelo Congresso em dezembro do ano passado. Uma das mudanças trazidas pelo texto é a proposta de tornar progressivo o imposto sobre heranças ou doações, conhecido como ITCMD ou ITCD, em dez estados brasileiros.

Atualmente, a maioria dos estados já aplica alíquotas progressivas, onde os impostos aumentam conforme o tamanho do patrimônio transmitido. No entanto, em dez estados, como Minas Gerais e São Paulo, as alíquotas ainda são fixas. Com a implementação da reforma, esses estados serão obrigados a ajustar suas alíquotas para cumprir a nova legislação nacional, que visa maior progressividade na tributação sobre a transmissão de patrimônios mais valiosos em todo o País.

O ITCMD é um tributo estadual que incide sobre o valor de venda (valor venal) de bens ou direitos, como imóveis, veículos, ações e dinheiro, quando são transferidos a herdeiros por meio de doações em vida ou em caso de falecimento.

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Atualmente, o imposto sobre herança possui uma alíquota máxima limitada a 8%, estabelecida pelo Senado Federal. Contudo, há uma proposta em discussão que busca aumentar essa alíquota para até 16%. Essa medida tem provocado debates sobre seus impactos econômicos e sociais, especialmente no contexto do planejamento sucessório e na transmissão de patrimônio entre gerações.

O economista Rodrigo Carvalho diz que não há certeza sobre qual será o impacto exato da reforma tributária na transmissão de heranças, particularmente no que diz respeito à transferência de imóveis. “A expectativa é que a obrigatoriedade das alíquotas progressivas de ITCMD resulte em um aumento nos custos para a transferência de bens, caso a nova legislação seja aprovada”, explica.

Para ele, essa mudança pode ter implicações no planejamento sucessório e na decisão de transmitir patrimônio. “As alíquotas mais altas podem influenciar as estratégias de gestão de ativos e a divisão do patrimônio familiar”, projeta.

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