Comportamento

O que aprendemos sobre a economia em 2022 com o TikTok

Alguns memes e momentos mais pitorescos do TikTok no ano de 2022 podem nos ensinar muito este ano

O que aprendemos sobre a economia em 2022 com o TikTok
Foto: Olivier Douliery/AFP
  • Embora os dados do governo possam nos dizer que o mundo está mudando depressa, as tendências da internet exemplificam como as pessoas estão respondendo ao novo
  • Os mercados financeiros devem continuar no limite em 2023: a inflação está desacelerando, mas continua alta. Resumindo, os memes permanecerão cruéis
  • O lado bom é que teremos as tendências nas redes sociais para nos auxiliar a interpretar os dados e, vez por outra, para nos ajudar a encontrar o seu lado mais leve

A taxa de desemprego ficou em 3,7% durante meses. Mas foi a famosa “desistência silenciosa” do TikTok e os pedidos de demissão informados em tempo real pelo Twitter que explicaram de verdade o que estava acontecendo no mercado de trabalho dos Estados Unidos em 2022, um momento de renovação do poder dos trabalhadores e uma reviravolta surpreendente.

Embora os dados do governo digam que o mundo está mudando depressa três anos depois do início da pandemia, as tendências da internet – as que fizeram sucesso e os aplicativos nos quais passamos a confiar – exemplificam como as pessoas estão respondendo a um novo, e em constante mudança, normal.

Os negronis sbagliatos alcançaram a fama e um lugar nos menus de drinks, deixando claro que as pessoas estavam prontas para voltar a gastar em happy hours extravagantes. Os feeds do Instagram ficaram repletos de fotos de praias e de montanhas enquanto as “viagens de vingança” bombavam. Aprendemos de forma conjunta o que significa “mudança de vibe”, enquanto percebemos que a economia estava passando por uma.

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Aqui está um resumo de alguns dos memes e momentos mais pitorescos do ano – e o que eles anunciam para 2023.

“Break My Soul”

Entre a alta inflação e anos de constantes mudanças no trabalho – incluindo demissões causadas pela pandemia, episódios de esgotamento no trbalho remoto e, mais recentemente, um retorno lento ao escritório – o status quo econômico parecia algo cada vez pior para muitos norte-americanos em 2022.

Beyoncé foi a trilha sonora dessa insatisfação ao lançar “Break My Soul”, um sucesso instantâneo nos apps de tocadores de música. A letra da canção diz “And I just quit my job, I’m gonna find new drive (E acabei de me demitir, vou encontrar uma nova motivação, em tradução livre), levando a internet a se questionar se a Queen B estava encorajando todos a participarem da “Grande Renúncia”.

Na verdade, as pessoas estavam se sentindo tão confusas em relação ao trabalho em 2022 que recorreram a novas expressões para descrever o sentimento. O TikTok nos deu a “desistência silenciosa” (Quiet quitting), uma tendência segundo a qual os trabalhadores fazem o mínimo no emprego. Depois veio a “career cushioning”, que se refere a preparar discretamente um plano B para sua vida profissional enquanto você ainda está em seu trabalho atual.

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Ao mesmo tempo, os empregadores anunciaram o “acúmulo de trabalhadores”, no qual as empresas evitam demitir pessoas depois de elas passarem por maus bocados durante vários meses em que o número de vagas ultrapassava e muito o de candidatos. Os dados sobre o emprego deixam claro que o mercado de trabalho estava desequilibrado, mas foram as conversas nas redes sociais que revelaram o quanto.

“A impressora de dinheiro dá um jeito”

O Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) reverteu dois anos de taxas de juros extremamente baixas em 2022, elevando os custos de empréstimos no ritmo mais rápido em décadas em uma tentativa de controlar a escalada da inflação. Os preços reais demoraram a reagir, mas o Reddit não.

Jerome Powell, o presidente do Fed, apareceu em memes com a frase “a impressora de dinheiro dá um jeito”, nos quais ele era retratado imprimindo dinheiro sem parar. Em 2022, os memes receberam uma atualização – com o Shrek. Os memes atuais comparam Powell ao personagem do filme de 2001 de Lord Farquaad, que ficou conhecido pela frase: “Alguns de vocês podem morrer, mas este é um sacrifício que estou disposto a fazer”.

A rabugice nos fóruns de discussão do Reddit surgiu quando as ações do Fed custaram dinheiro a muitos investidores. Criptomoedas famosas despencaram e os preços dos ativos no geral entraram em queda, com as ações caindo cerca de 20% em comparação com o início de 2022.

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Os mercados financeiros devem continuar no limite em 2023: a inflação está desacelerando, mas continua alta, e o Fed está prestes a aumentar as taxas pelo menos um pouco mais para controlá-la. Resumindo, os memes provavelmente permanecerão cruéis.

Tábuas de manteiga temperada

O TikTok passou parte de 2022 louco por tábuas de manteiga: uma base do ingrediente coberta por flores, sal gourmet, mel ou outras especiarias. Era uma reação atrasada às modas de baixo teor de gordura ou ausência de qualquer gordura das décadas passadas? Uma prova de que os influenciadores conseguem nos obrigar a fazer qualquer coisa? De uma coisa temos certeza: não era barato.

Isso porque os preços dos alimentos – e principalmente dos produtos lácteos – subiram bastante no ano passado. Os preços da manteiga e da margarina estavam 34% mais altos em novembro do que 12 meses antes. No geral, os alimentos subiram 10,6%.

Mas como a popularidade duradoura das tábuas de manteiga ressaltou, as pessoas compram alimentos mesmo quando eles estão ficando mais caros. Aliás, embora os varejistas tenham informado que alguns consumidores de baixa-renda começaram a pisar no freio nas compras discricionárias e a dar prioridade aos itens essenciais, os gastos em geral têm sido bastante resilientes apesar de um ano e meio de aumentos de preços rápidos e meses de mudanças nas taxas do Fed.

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Por ora, a inflação continua sendo impressionante e não se limita ao corredor de laticínios. Um índice de preços conhecido continua a ficar 7,1% acima de seu nível há um ano, muito mais rápido do que o ritmo anual típico de 2%.

Barbiecore

Os norte-americanos continuaram a fazer compras em 2022, mas os itens adquiridos estão passando por uma mudança silenciosa. No início da pandemia eram produtos como sofás e roupas, mas agora estão lentamente voltando a gastar com serviços.

As redes sociais popularizaram modas espalhafatosas em 2022, entre elas o “Barbiecore” (muito rosa, em homenagem à boneca e ao filme a ser lançado sobre ela) e o “avant apocalypse”, tendência que se inspira em uma visão distópica do futuro.

Mas outra grande tendência do ano – comprar roupas usadas, #thrifted (de segunda mão) – talvez espelhe com mais precisão a mudança da força da economia do ano. As vendas de lojas de roupas estão desacelerando, mostram dados oficiais, e caindo completamente se subtrair a inflação do vestuário.

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Tem uma reserva?

Conforme o mundo reabria e os norte-americanos voltavam a gastar com experiências. As mesas em restaurantes, em particular, tornaram-se um item disputado. A disponibilidade de mesas livres caiu 14% em comparação com 2019, enquanto as com reservas on-line aumentaram 24%, de acordo com dados do aplicativo de reservas de mesa OpenTable.

Os números confirmaram o que os moradores de Nova Iorque e de outras cidades podiam dizer (e acabaram contando por meio de várias críticas pela imprensa): foi uma batalha conseguir uma mesa em 2022, pois a escassez de garçons coincidiu com uma demanda maior por refeições fora de casa.

Os dados do OpenTable mostram que sobretudo o happy hour disparou em 2022. As pessoas estão jantando mais cedo e depois de anos sem tomar um drink com os colegas de trabalho esta é a temporada dos coquetéis superfaturados. É mais um motivo para os negronis feitos com espumante no lugar do gim, e popularizados por um vídeo promocional para o seriado “A Casa do Dragão” na conta da HBO no TikTok, serem uma febre.

Tudo lotado

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Acontece que as pessoas sentiram falta da praia tanto quanto daquele martini às 18 horas. Uma prova disso foi a “viagem de vingança”.

Os turistas compensaram em massa as viagens atrasadas pela pandemia em 2022 e à medida que se lançavam em grandes aventuras o tráfego aéreo recuperou-se, aproximando-se dos níveis de 2019. As receitas do setor hoteleiro se recuperaram totalmente.

Ao mesmo tempo, alguns setores relacionados com o de viagens passaram por dificuldades com equipes muito reduzidas. O emprego no setor de acomodação está em apenas 83% de seu nível em fevereiro de 2020. No geral, o emprego no setor de transporte aéreo cresceu, mas os grupos da indústria queixam-se da escassez de profissionais em áreas fundamentais, como a de controle do tráfego aéreo.

Enquanto os hotéis e as companhias aéreas lutavam para operar com a capacidade total, as tarifas dos quartos e das passagens disparavam e transtornos maiores se tornavam comuns. As reclamações dos serviços de viagens aéreas estavam mais de 380% acima do nível de 2019 em setembro, de acordo com o Departamento dos Transportes dos EUA.

A incompatibilidade evidenciou que partes fundamentais da economia norte-americana estão passando por dificuldades para alcançar um novo equilíbrio depois do rebuliço provocado pela pandemia, mesmo que as pessoas queiram entrar no #modoférias.

Onda de casamentos

Em alguns casos, as tendências impulsionadas pela pandemia coincidem com as tendências demográficas – e nada mostrou isso melhor do que as inúmeras fotos de casamento que preencheram os feeds do Instagram em 2022. Depois de anos com pouquíssimas cerimônias devido à pandemia, 2022 foi provavelmente o ano com o maior número de casamentos desde 1997, com base em dados e previsões compilados pelo Wedding Report, uma publicação que acompanha o setor.

O salto, resultado da combinação entre as cerimônias postergadas por conta da pandemia e um grande grupo de millennials em idade de casamento, foi percebido pelos locais para eventos e fornecedores com agendas lotadas. Também suscitou dúvidas quanto ao efeito cascata na economia: será que esses casais terão filhos, elevando o número de nascimentos, que já aumentou ligeiramente em 2021? Vão comprar casas? Talvez saibamos essas respostas em breve.

Grandmillennial

As gerações mais jovens dos EUA não estão apenas se casando. Estão formando suas próprias famílias e comprando casas em maior número desde o início da pandemia. No processo, elas ajudaram a alimentar uma forte demanda por imóveis e popularizaram tendências de decoração de interiores – incluindo a “grandmillennial”, também chamada carinhosamente de “granny chic” (vovó chique) no Pinterest, na qual os jovens reaproveitam papel de parede floral e lâmpadas antigas para um visual aconchegante, mas atualizado.

Entretanto, muitos millennials, que têm entre 26 a 41 anos e estão nos principais anos de compra de casas, podem estar perdendo a chance de se tornarem influenciadores imobiliários. Conforme o Fed elevava as taxas de juros para conter a rápida inflação em 2022, uma onda de candidatos a donos de imóveis começou a descobrir que a combinação de custos hipotecários maiores e preços altos das casas significava não poder comprar.

As vendas de imóveis novos diminuíram consideravelmente. Espera-se que as taxas do Fed continuem a subir em 2023, o que poderia representar um caminho duro pela frente para uma geração que luta para comprar a primeira casa. E depois de um ano com mudanças econômicas sérias e grandes ajustamentos políticos, não se sabe ao certo o que está por vir: uma recessão? Uma desaceleração benéfica da inflação?

O lado bom é que teremos as tendências nas redes sociais para nos auxiliar a interpretar os dados e, vez por outra, para nos ajudar a encontrar o seu lado mais leve. Citando “corn kid”, apelido dado a uma criança superfã do legume que viralizou no TikTok em 2022: “não consigo imaginar uma coisa mais bonita”.

*Tradução de Romina Cácia

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