Comportamento

Opinião: Não pense nas notícias na hora de investir

Não é um bom conselho para a vida. Mas ignorar o que acontece é aceitável quando se trata de investir

Opinião: Não pense nas notícias na hora de investir
A imersão total no noticiário e o isolamento dele são modos de agir bastante diferentes - Foto: Envato Elements
  • É impossível ignorar o noticiário se você é um profissional de finanças que precisa ponderar com frequência os mercados
  • A imersão total no noticiário e o isolamento dele são modos de agir bastante diferentes. Mantê-los em compartimentos mentais separados pode ser difícil, para dizer o mínimo.
  • Então, como criar um bom plano? Você precisará descobrir isso sozinho ou com a ajuda de um consultor de confiança

Jeff Sommer, The New York Times – Quanto pior forem as notícias, menos você deve pensar nelas.

Não, este não é um bom conselho para a vida. Mas ignorar os atuais acontecimentos é uma estratégia aceitável quando se trata de investir.

Para deixar claro, não estou recomendando que ninguém ignore a invasão brutal da Ucrânia pela Rússia. Seria terrivelmente cruel ignorar o sofrimento dos ucranianos, apenas porque a realidade é tão preocupante. Se você sente que pode fazer algo para melhorar de alguma forma a vida de alguém na Ucrânia – ou de um parente ou vizinho que recebeu más notícias – faça isso com certeza.

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E, claro, é impossível ignorar o noticiário se você é um profissional de finanças que precisa ponderar com frequência os mercados – ou um repórter que escreve sobre ambos os temas, como eu.

Mas eu também sou um trabalhador que economizou dinheiro para pagar a faculdade do filho, uma casa e a aposentadoria, e cheguei à conclusão de que as notícias não devem afetar o que faço como investidor.

Na verdade, quando estou no meu “modo investidor”, tento me desconectar do barulho do mundo e me concentrar apenas em meus compromissos de longo prazo para poder investir em ações e títulos, os quais eu mantenho a baixo custo, de modo geral, em fundos passivos diversificados.

Peço desculpas pela confusão

A imersão total no noticiário e o isolamento dele são modos de agir bastante diferentes. Mantê-los em compartimentos mentais separados pode ser difícil, para dizer o mínimo. Alguns leitores perspicazes notaram que pareço estar mais preocupado que o habitual com a situação do mundo, e dizem que essas inquietudes estão se infiltrando aos poucos em minhas colunas a respeito de investimentos.

Peço desculpas por isso.

Em minha vida, se não em todas as minhas colunas, tento manter esses compartimentos separados e herméticos. Tampouco estou sozinho nessa estratégia.

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Trata-se de uma lição dada por economistas de destaque, entre eles Richard H. Thaler, professor da Universidade de Chicago que ganhou o Prêmio Nobel de Economia em 2017 por seu trabalho pioneiro em economia comportamental.

“Às vezes você tem que simplesmente desligar o noticiário”, disse ele em uma conversa por telefone. “Não dê atenção a isso.”

Thaler, que é um dos autores do livro “Nudge: Como tomar melhores decisões sobre saúde, dinheiro e felicidade” e interpretou a si mesmo no filme “A Grande Aposta”, é uma das maiores autoridades do mundo em como os humanos se comportam ao tomar decisões financeiras. Eu o conheci durante os anos em que ele escreveu suas colunas (Economic View) para o New York Times e liguei para ele.

Queria ajudar os leitores que deixei confusos e perguntei qual conselho ele daria.

Uma história sobre o timing do mercado

“Você pode contar a seguinte história”, disse Thaler. “Fui entrevistado por um desses canais de notícias financeiras em um de seus programas matinais, e me perguntaram: ‘O que as pessoas devem fazer na próxima vez que os mercados ficarem muito voláteis?’. E eu respondi que meu conselho seria mudar de canal e assistir à ESPN.”

Essa não é a melhor coisa para se dizer a jornalistas que cobrem o mercado financeiro, eu disse. “Verdade”, ele respondeu. “Eles chamaram imediatamente um comercial.”

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Mas, ao mesmo tempo que estava brincando, ele também falava sério, disse.

Acompanhe o noticiário, é claro, e deixe suas emoções fluírem. Mas não permita que elas afetem suas decisões de investimento, disse ele. Para isso, tenha calma e siga um plano. Se você não tem um bom plano, então construa um friamente.

“Minha questão é, sabemos que qualquer movimento repentino de investidores individuais sem dúvidas não tem mais probabilidade de estar certo do que errado”, disse Thaler. “Na verdade, é mais provável que estejam errados do que certos, porque nosso instinto é vender quando os mercados caem e comprar quando sobem – e comprar na alta e vender na baixa não é uma boa estratégia.”

As notícias neste momento são preocupantes. Mas é um bom momento para vender – ou ir contra a maré e procurar pechinchas? É difícil dizer e, embora existam muitas opiniões por aí, ninguém sabe de verdade.

É por isso que é impossível entrar e sair dos mercados financeiros – o tal “timing do mercado”, como diz o jargão – ser bom de forma contínua e por longos períodos, mostram muitas pesquisas acadêmicas.

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“Apenas siga seu plano”, disse Thaler. “Isso não é o mesmo que ‘Compre quando os preços estão baixos’. Significa seguir seu plano e não pensar que você é um gênio e pode ganhar do mercado. Porque você provavelmente não pode.” Então, como criar um bom plano? Você precisará descobrir isso sozinho ou com a ajuda de um consultor de confiança, mas aqui estão alguns elementos básicos.

Comece com uma reserva de emergência

Primeiro, guarde dinheiro suficiente para o caso de uma emergência. Assim que você tiver guardado algum dinheiro para sobreviver em uma conta corrente ou poupança, disse Thaler, considere comprar títulos de inflação.

Você talvez não escute falar deles em um banco ou em uma corretora: eles não podem ganhar dinheiro com os títulos, que são emitidos diretamente pelo Tesouro. No momento, os títulos estão pagando juros de 7,12% nos Estados Unidos. Isso não é um erro de digitação. Eles têm desvantagens, mas não são grandes.

“Esses títulos são perfeitos para esse propósito porque são muito seguros e, no caso de uma emergência real, você pode liquidá-los”, disse ele.

Aposte em fundos passivos de baixo custo

Quando estiver realmente pronto para investir, aplique em fundos passivos de baixo custo como seus principais investimentos. A maioria das pessoas deve planejar investir por décadas, mesmo se você estiver se aposentando, disse Thaler.

“As pessoas na faixa dos 60 anos hoje em dia têm muitos anos de expectativa de vida”, afirmou.

Estou na casa dos 60 anos e apostando na minha longevidade, invisto com regularidade na bolsa de valores, assim como em títulos. Também estou seguindo uma recomendação que apareceu em uma coluna de Thaler em 2011: fazer o que for preciso para atrasar a aposentadoria até os 70 anos. “Esperar é o melhor investimento que você pode fazer”, ele me lembrou.

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Ter melhores resultados que o padrão do mercado de forma contínua escolhendo ações ou títulos individuais é raro, sobretudo depois dos descontos com encargos. Não é impossível: Warren Buffett fez isso durante anos, mas até mesmo seus retornos foram perdendo força, e esse grande investidor recomenda manter um fundo passivo do S&P 500 e títulos do Tesouro como principais investimentos para a aposentadoria.

Apesar das guerras e dos conflitos econômicos, os mercados são globais agora. Portanto, manter fundos globais de ações e títulos é provavelmente a melhor estratégia.

Alocação de Ativos e Risco

Descobrir quanto manter em ações e em títulos é o próximo passo. Não existe uma resposta única para todos.

Sem risco, sem retorno é um velho ditado no setor de investimentos. Historicamente, as ações têm dado mais retorno que os títulos porque há mais risco em possuí-las.

O histórico de retornos não oferece garantias para o futuro, mas pode servir de guia. O site da Vanguard publica os retornos de nove carteiras de títulos e ações com base em fundos passivos dos EUA e eles são esclarecedores.

De 1926 a 2020, por exemplo, o pior ano para o índice de ações S&P 500 foi 1931, quando perdeu 43,1%; o melhor foi 1982, quando ganhou 54,2%. O pior ano para a carteira com apenas títulos foi 1969, quando caiu 8,1%; o melhor também foi 1982, com ganho de 45,5%.

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Uma combinação de ações e títulos ficaria em algum lugar entre esses extremos. Minha carteira é de cerca de 60% de ações e 40% de títulos. Encontre uma alocação de ativos que funcione para você.

Se a atual queda de ações já está perturbando seu sono, talvez você tenha ações demais. Mas tente não deixar as notícias lhe afetarem. Você está investindo pensando no longo prazo. Não venda apenas quando estiver preocupado ou compre só quando o mercado estiver em alta. Isso não é um plano. É um problema. “Faça algo divertido”, disse Thaler. Fique longe do noticiário.

Como jornalista, isso não funciona para mim. Mas, como investidor, sim. Tiro breves férias das notícias. Vou sair para correr agora. //TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

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