O fator que derrubou o dólar no 1º semestre e faz o C6 ver câmbio a R$ 5,50 até o fim do ano
Para Felipe Salles, economista-chefe do banco, tendência global de enfraquecimento do dólar parece estrutural, ajudando real a "ignorar" fatores internos
Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank. (Foto: Divulgação/C6 Bank)
Prever a trajetória do câmbio é uma das tarefas mais ingratas para as equipes de economia, ainda que as projeções para o dólar ao final de determinado período sejam muito populares. Em 2024, quando a moeda americana chegou a surpreendentes R$ 6,28 no auge do estresse com a condução da política fiscal do governo, as estimativas do início do ano, em torno de R$ 5, pareciam vindas de outra realidade. E eram – parte do movimento visto em dezembro hoje é tido como um exagero de mercado, mas foi uma surpresa suficiente para fazer com que boa parte dos agentes econômicos errassem feio nas estimativas.
Quem chegou mais perto dos R$ 6,18 a que a moeda americana encerrou o ano foi o C6 Bank, que vinha desde meados do ano passado defendendo que havia motivos para fazer a cotação ultrapassar os R$ 6 pela primeira vez na história; lá atrás, uma projeção vista como pessimista. O banco recebeu este mês o prêmio Prêmio Broadcast Projeções, que considera o índice de acerto das estimativas anuais feitas pelas casas para indicadores como IPCA, taxa Selic, além de Produto Interno Bruto (PIB), balança comercial e outros.
No câmbio, o modelo de projeções do C6 é construído a partir de três variáveis principais: o dólar global, o diferencial de taxa de juros entre o Brasil e os Estados Unidos, e o risco fiscal. Mas apenas um deles tem sido o grande responsável pelos movimentos recentes; seja a alta de 2024, seja a desvalorização forte registrada neste primeiro semestre de 2025.
O dólar à vista acumula uma queda de 12% contra o real, saindo de R$ 6,18 para R$ 5,43 na segunda-feira (30), no fechamento do semestre. E é o exterior que tem ditado o bom momento da moeda brasileira, explica Felipe Salles, economista-chefe do C6 em entrevista ao E-Investidor. “O risco fiscal é relevante, a questão é como medimos para capturar isso nos modelos. Nenhuma métrica é perfeita”, diz. “E o diferencial de juros está tendo menos importância na determinação da moeda, porque boa parte da nossa dívida interna é pós-fixada. Quando aumentamos a taxa Selic, encarecemos a dívida, o que piora o fiscal.”
Com as duas pontas do tripé puxando o câmbio para direções distintas, é a trajetória de desvalorização global do dólar que explica o primeiro semestre de 2025.
O real é a terceira moeda que mais se valorizou no mundo em 2025, atrás apenas do rublo russo e da coroa sueca, segundo dados da Elos Ayta Consultoria. Mas um outro indicador reforça o ponto do C6, de que este não é um movimento relacionado ao Brasil: o índice DXY, que mede a performance do dólar contra outras seis divisas fortes, cai quase 10% e está no menor patamar desde 2022.
O que mudou em relação ao último ano, quando a economia ainda resiliente dos Estados Unidos jogava a favor de um dólar mais forte globalmente, foi o choque causado pelo pacote de tarifas anunciado pelo presidente americano Donald Trump ao longo de todo o semestre. O entendimento é que o choque tarifário vai reduzir o ritmo de crescimento econômico por lá – não o suficiente para levar a maior economia do mundo a uma recessão, o que também seria negativo para emergentes pois gera aversão a risco, mas o suficiente para gerar um fluxo de realocação de capital global.
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Nessa, o Brasil sai beneficiado. “Após as tarifas, rapidamente notamos que a economia americana não ia ser mais forte. A dúvida era se seria fraca ou muito fraca; dois mundos completamente diferentes no que diz respeito a moedas de países emergentes”, afirma Salles.
Agora que os primeiros indicadores econômicos começam a refletir isso, a C6 acredita que a perda de força do dólar pode ser um movimento estrutural, fruto desse enfraquecimento da economia dos EUA. E que deve continuar a ser o fator determinante para o real no curto prazo, independentemente dos fatores domésticos, como já aconteceu neste primeiro semestre. “Em janeiro, o câmbio devolveu o exagero visto em dezembro. Tirando essa correção, o resto do movimento foi praticamente todo externo. Contra o euro, o real mexeu muito pouco”, destaca o economista-chefe do banco.
Dólar em patamar ‘justo’
A queda da cotação do dólar ao longo do semestre fez com que muitos bancos e corretoras começassem a mexer nos modelos de projeção para o fim do ano. Como mostramos aqui, players que antes apostavam em um câmbio a R$ 6 ao final de 2025 agora já esperam por patamares entre R$ 5,70 e R$ 5,80.
O próprio Boletim Focus ilustra isso: em janeiro, a mediana para o câmbio em dezembro era de R$ 6,00. Na edição do fim do semestre, publicada em 30 de junho, era de R$ 5,70.
O C6 também revisou suas estimativas em meados de maio, quando, segundo Salles, a “poeira abaixou” após o “Liberation Day”, como ficou conhecido o dia em que foram anunciadas as tarifas recíprocas dos EUA e o mercado entrou em pânico. Na ocasião, o banco reduziu de R$ 6,30 para R$ 6,00 a projeção para o dólar ao final de 2025, mas voltou a mexer no modelo para incluir essa tendência de desvalorização global da moeda americana, que parece ter vindo para ficar. Agora, a estimativa é de R$ 5,50.
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“A tendência do dólar vai ser de desvalorização frente às principais moedas globais. Um ritmo menor do que vimos no semestre, mas deve continuar”, diz Salles.
O movimento do exterior deve continuar à frente em termos de relevância dos outros dois pilares que impactam as projeções de câmbio, ainda que o verdadeiro calcanhar de Aquiles do real possa fazer a moeda ter certo repique até o fim do ano. O lado fiscal. “Pode gerar ruído, volatilidade, ao mesmo tempo em que o cenário já está mais ou menos dado e é suficiente para pressionar o real. Um câmbio pouco acima dos valores atuais até o fim do ano parece razoável nos nossos modelos.”