

A sangria dos mercados continua, mas os tombos nesta semana foram mais moderados. É muita informação para o investidor pessoa física digerir: tarifas finalmente aplicadas pelo governo Trump, retaliações, a eterna queda de braço com a China, tentativas de negociação, a pressão por um congelamento de tarifas por 90 dias — e até fake news que deram 10 minutos de alívio aos mercados.
O problema é que ninguém sabe mais se amanhã o mercado vai subir ou cair, se é hora de aproveitar as pechinchas da Bolsa ou se refugiar em ativos mais seguros.
Nesse cenário, os chamados portos seguros ganham destaque. Ações boas pagadoras de dividendos tendem a sofrer menos com crises e oscilações e o tarifaço de Trump não será exceção. Mas isso quer dizer que a festa acabou? Não há mais ações baratas entre as perenes?
A resposta é: ainda há oportunidades. Mesmo nos setores tradicionais, como BESST (bancos, elétricas, seguros, saneamento e telecomunicações), existem papéis com desconto — boas chances de garantir dividendos no futuro e proteger sua carteira da volatilidade.
Oportunidades também surgem entre as empresas de commodities — mineradoras, petroleiras e siderúrgicas — que oferecem bons dividendos com desconto, embora com um pouco mais de risco.
Talvez seja a hora de comprar ao som dos canhões. Para facilitar a sua escolha, conversamos com sete casas de análise e corretoras, que apontaram ações com múltiplos ainda atrativos, baixo impacto das tarifas de Trump e potencial de dividendos sólidos.
Por que dividendos são porto seguro?
Regis Chinchila, head de research da Terra Investimentos, explica que, mesmo com a volatilidade causada pelas tarifas de Trump e temores de recessão global, empresas que pagam dividendos tendem a sofrer menos por terem modelos de negócios estáveis e resilientes.
“Setores como energia elétrica, telecomunicações e bancos, que possuem fluxos de caixa mais previsíveis e fortes, tendem a ser menos sensíveis às flutuações de curto prazo”, comenta o analista.
Chinchila também destaca que o pagamento constante de dividendos oferece retorno mesmo em momentos de instabilidade, o que atrai investidores em busca de segurança.
A resiliência desses setores se deve à receita recorrente, menor exposição a exportações e, no caso das elétricas e telecomunicações, à atuação focada no mercado interno. Já os bancos se apoiam na gestão cautelosa e na forte demanda interna por crédito.
Por isso, as empresas BESST não estão entre as mais descontadas da bolsa, mas ainda apresentam espaço para valorização e dividend yields (retorno em dividendos) atraentes. Um levantamento de Einar Rivero, sócio-fundador da Elos Ayta Consultoria, mostra que, em 4 de abril, algumas dessas companhias atingiram o menor preço sobre valor patrimonial (P/VPA) dos últimos 5 anos — como Cemig (CMIG4), com 1,65, Banrisul (BRSR6), 0,42, e Isa Energia (ISAE4), 0,74.
Mas o investidor também encontra oportunidades fora dos setores perenes. Ações de commodities, conhecidas pelos bons proventos, estão com P/VPA nas mínimas e apresentaram crescimento no dividend yield nos últimos dias. Embora mais expostas à guerra comercial, não tiveram seus fundamentos comprometidos.
Entre as ações mais descontadas até 4 de abril, analistas apontam PetroReconcavo (RECV3), com P/VPA de 0,99, Vale (VALE3), de 1,09, e Gerdau (GGBR4), de 0,53, como papéis com descontos relevantes.
Ações de dividendos boas e baratas
Consultamos analistas para saber onde ainda é possível encontrar ações baratas, que paguem bons dividendos e ajudem a proteger a carteira em meio à volatilidade do tarifaço e à possível desaceleração global. O levantamento aponta 19 ações com potencial de entregar dividend yield de até 13% em 2025.
Os analistas também indicaram o preço máximo recomendado para compra, garantindo não só um bom retorno em dividendos, mas também potencial de valorização.
A lista inclui papéis dos setores BESST e de commodities como petróleo, siderurgia e mineração — com destaque para a queda acumulada desde o impacto das tarifas de Trump até 7 de abril. Veja abaixo:
As perenes mais indicadas diante do tarifaço
Algumas ações se destacam pela resiliência ao tarifaço e à volatilidade. É o caso da transmissora Isa Energia, que pode entregar um dividend yield de até 9% em 2025.
Victor Bueno, sócio e analista da Nord Research, afirma que a empresa tem impacto zero das tarifas de Trump. Com receita previsível, contratos de 30 anos corrigidos pela inflação, baixo endividamento e plano de expansão, ela consegue crescer e ainda remunerar o investidor. “Transmissoras são as que melhores surfam crises”, comenta.
Bruno Oliveira, analista do Vida de Acionista, diz que a questão da RBSE (Rede Básica Existente, uma indenização à transmissora), que poderia reduzir receitas a partir de 2028, já foi resolvida. “Teremos uma compensação total do fim dos componentes da RBSE, então o investidor não vai ter nenhum solavanco, nenhuma queda desproporcional”, afirma.
Segundo ele, com ações a R$ 22, o yield estimado é próximo de 9%. Outros analistas indicam comprar até R$ 27. Apesar de a Isa Energia pagar dividendos uma vez por ano, em 2025 ela parcelou em três vezes — o que, segundo Oliveira, não deve virar regra.
Nos bancos, os destaques são Banco do Brasil (BBAS3) e Itaú (ITUB3; ITUB4). Marcos Saravalle, analista e sócio-fundador da MSX Invest, aponta que essas instituições têm baixa sensibilidade ao tarifaço e estão bem provisionadas. “Não esperamos expansão do crédito, mas também nenhuma desaceleração”, diz.
O Banco do Brasil se destaca pelo desconto atrativo e alto dividend yield, de até 12% em 2025, e oito pagamentos recorrentes. “Está abaixo do seu preço justo, tem baixa inadimplência e é um ótimo refúgio em tempos de volatilidade”, avalia Chinchila, da Terra.
Milton Rabelo, analista da VG Research, lembra que o banco carrega risco estatal e exposição ao agronegócio, ficando ligado à volatilidade das commodities, mas está descontado e é interessante para quem pensa em dividendos no longo prazo. O preço teto de entrada, segundo ele, é até R$ 35.
Também aparecem entre as mais resilientes e descontadas Telefônica Brasil (VIVT3) e Engie (EGIE3).
Nas commodities também há oportunidades
As petroleiras vêm acumulando perdas nas cotações com a forte queda do petróleo Brent, negociado perto de US$ 64. Petrobras (PETR4) e Petrorecôncavo (RECV3) estão entre as mais afetadas. Segundo Lucas Lima, analista-chefe da VG Research, o recuo da commodity reflete temores sobre a demanda global do petróleo, após o tarifaço de Trump, e o aumento da produção anunciado pela Opep+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados), que surpreendeu o mercado.
Ainda assim, enquanto o Brent se mantiver em US$ 65 ou mais, as duas companhias devem continuar gerando caixa robusto e pagando dividendos elevados — DY de 13% para Petrobras (PETR4) e 10% para Petrorecôncavo. “Temos preferência pela Petrobras devido à sua política estabelecida de proventos. A PetroRecôncavo pode mudar ao longo do ano sua estratégia para crescimento, podendo reduzir de forma relevante os dividendos”, destaca Lima.
- Leia mais: As ações internacionais que podem te proteger do abalo do tarifaço e pagar dividendos, segundo a XP
O cenário só se tornaria preocupante com o Brent abaixo de US$ 60. Por ora, o analista vê a queda das ações como uma boa oportunidade de compra, mas recomenda limitar a exposição: até 15% da carteira, com 10% em Petrobras e 5% em Petrorecôncavo.
Outro destaque é a CSN Mineração (CMIN3). Oliveira, do Vida de Acionista, ressalta a estrutura sólida da empresa, com dívida líquida negativa de R$ 4,64 bilhões, pagamento de mais de 100% do lucro em dividendos em alguns anos, e sem comprometer crescimento. O minério de ferro se mantém acima dos US$ 100 por tonelada, sustentando os resultados, somado ao dólar elevado. “É uma empresa que oferece proteção natural, com receitas em dólar e custos em reais”, diz ele.
Para 2025, a expectativa é de dividend yield de 10% — com dividendo líquido estimado em R$ 0,55 por ação, se comprada até R$ 5,50. “Caso fique mais cara, o dividendo tende a ser menor”, completa o analista.
Outros portos seguros baratos
Levantamento de Fábio Sobreira, sócio e analista da Rocha Opções de Investimentos, para o E-investidor revela que existem outras ações de setores perenes que podem ser consideradas baratas e que têm entregado dividendos interessantes acima de 6%, com potencial de continuar mantendo elevadas remunerações. É possível ver que a queda dos papéis também não foi muito forte em abril.
Ele utilizou alguns indicadores como a variação diante da média de dividend yield de 5 anos. Nesse caso, quanto maior a variação melhor – significa que a companhia está pagando dividendos acima da média. Também apresentou o poder de lucro, ou seja o poder da empresa pagar dividendos em 2025 se distribuir 100% do seu lucro, e algumas superam até a própria Selic. Por último, citou a variação do preço sobre valor patrimonial (P/VPA) comparado à média de 5 anos – neste caso, quanto menor e mais negativa a queda, significa que a empresa está mais barata.
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