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- Grandes nomes como Banco do Brasil (BBAS3), Itaú Unibanco (ITUB4), Vale (VALE3), Petrobras (PETR4), Magazine Luiza (MGLU3) e Lojas Renner (LREN3) enfrentaram desvalorizações
- Setores como proteínas (JBS - JBSS3) e papel e celulose (Suzano - SUZB3) figuraram entre os destaques positivos
- Em 2025, o agronegócio e setores exportadores devem manter desempenho estável, apesar das restrições no acesso ao crédito
O Ibovespa encerra 2024 com uma queda acumulada de 10,36%, oscilando na faixas dos 120 mil pontos até esta segunda-feira (30). Hoje, a principal referência da B3 finalizou a sessão em valorização de 0,01%, aos 120.283,40 pontos. O resultado reflete um ano cercado de altos e baixos para o mercado de ações no Brasil. Apesar de muitas empresas reportarem lucros, os números ficaram abaixo das expectativas, enquanto o cenário futuro permaneceu incerto, pesando sobre o principal índice da Bolsa.
Nomes de peso como Banco do Brasil (BBAS3), Itaú Unibanco (ITUB4), Bradesco (BBDC4), Vale (VALE3), Petrobras (PETR4) oscilaram, companhias do varejo a exemplo de Magazine Luiza (MGLU3), Lojas Renner (LREN3) e Casas Bahia (BHIA3) viram ações em queda. No setor de saúde Grupo Notre Dame Intermédica (GNDI3), Hapvida (HAPV3) e as de aviação Gol (GOLL4) e Azul (AZUL4) também sofreram desvalorizações. Apenas setores como o de proteínas – JBS (JBSS3), Marfrig (MRFG3) e BRF (BRFS3) – e papel e celulose Suzano (SUZB3), Klabin (KLBN3) figuraram entre os destaques positivos.
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Entre junho e agosto, o Ibovespa chegou a disparar impulsionado por expectativas de melhora no cenário fiscal, queda da inflação e cortes na taxa básica de juros, a Selic, hoje na marca de 12,25%. A euforia do mercado deu lugar à cautela à medida que o ano avançou. A inflação acima da meta e a possibilidade de a Selic retornar ao patamar de 14,25% em março de 2025, o maior desde 2016, afastaram investidores. O mercado também demonstrou preocupação com o risco fiscal crescente, evidenciado pelo pacote fiscal de R$ 70 bilhões, que trouxe mais dúvidas do que confiança.
Com a virada para 2025, os analistas indicam um panorama de ajustes econômicos. Embora, segundo projeções, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deva desacelerar, há esperança de que um controle fiscal mais forte, expectativas inflacionárias ancoradas e taxas de juros estabilizadas possam atrair novamente o olhar de investidores para o Brasil. Para o curto prazo, conforme os especialistas, a recomendação é de cautela: manter recursos alocados em renda fixa com liquidez e evitar movimentos especulativos até que o cenário macroeconômico se torne mais previsível.
- Saiba mais: Do risco fiscal à alta do dólar: as ações da Bolsa que resistiram às reviravoltas de 2024
Meta fiscal, cenário global e dólar alto: o que mexeu com o Ibovespa em 2024
No primeiro semestre, o mercado foi impulsionado pela expectativa de cortes nos juros nos Estados Unidos e pela boa recepção à indicação de Gabriel Galípolo como presidente do Banco Central (BC). Segundo Rafael Lage, analista da CM Capital, Galípolo transmitiu confiança ao mostrar que não cederia a pressões políticas em suas decisões, enquanto a política monetária adotada pelo BC conseguiu ancorar as expectativas inflacionárias. A percepção de que a inflação estava sob controle e a confiança em medidas de austeridade fiscal também ajudaram a sustentar o otimismo no período.
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No entanto, o cenário começou a mudar no segundo semestre. Lage explica que, apesar de o mercado ter iniciado o período esperançoso com sinais do governo sobre um maior rigor fiscal, o otimismo foi minado por eventos internos e externos. A economia chinesa mostrou sinais de forte desaceleração, enquanto conflitos internacionais adicionaram incertezas ao cenário global. Internamente, a deterioração fiscal dissipou a confiança dos investidores. O pacote fiscal anunciado pelo governo, que deveria gerar economia na ordem de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos, foi considerado insuficiente para enfrentar os desafios estruturais do país. A percepção de descontrole nas contas públicas afastou investidores e elevou a aversão ao risco em relação aos ativos brasileiros.
Desde 2014, o Brasil enfrenta dificuldades estruturais em equilibrar as contas públicas, resultando em um déficit fiscal recorrente. Ao longo da última década, lembra Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, avanços pontuais foram registrados em reformas e ajustes, mas o progresso foi insuficiente para estabilizar as finanças do país. Em 2023, as fragilidades ficaram ainda mais evidentes, refletindo problemas históricos e novos fatores. “A pressão fiscal intensificou-se com os precatórios [dívidas judiciais do governo que precisam ser pagas], somada à ausência de medidas mais potentes de contenção de gastos. A desconfiança dos mercados cresceu com a percepção de que o governo não prioriza uma política fiscal mais austera, o que tem dificultado alcançar superávits e manter a estabilidade econômica”, explica Cruz.
Outro reflexo importante da fragilidade fiscal foi a disparada do dólar, que alcançou níveis preocupantes ao longo do ano, chegando a ser comercializado a R$ 6,26 em 18 de dezembro. Rubens Cittadin, operador de renda variável da Manchester Investimentos, associa o movimento à falta de confiança do mercado na capacidade do governo em implementar medidas concretas para controlar a dívida pública. O operador de renda variável acrescenta que fatores externos também contribuíram para o fortalecimento do dólar, como a sinalização do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) de que manteria os juros elevados por mais tempo, atraindo capital para os títulos do Tesouro dos Estados Unidos. A combinação de riscos fiscais domésticos e a busca por segurança no mercado internacional intensificou a valorização da moeda americana.
Nesse sentido, a meta de inflação de 3% no Brasil tem sido amplamente questionada por sua adequação às condições econômicas do país. Críticos argumentam que, em um cenário de volatilidade cambial e pressões inflacionárias constantes, a rigidez dessa meta pode ser contraproducente, dificultando o crescimento econômico e o acesso ao crédito. De acordo com Cruz, apesar da oportunidade de fomentar um debate sobre sua viabilidade, o Banco Central manteve-se neutro, evitando revisar o modelo atual.
O que esperar do Ibovespa em 2025
As perspectivas do Ibovespa para 2025 são de continuidade de uma série de dificuldades. Cittadin acredita que o início do ano será marcado por juros elevados e manutenção do pessimismo no mercado, o que pode manter o dólar valorizado. “As expectativas ainda não são de alta, visto que será um ano que antecede as eleições de 2026. Espera-se muito estresse no mercado a respeito das questões fiscais e políticas brasileiras, ainda mais quando se pensa num fim de ciclo de alta de juros da Selic em 15%, o que pode pressionar muito os valuations das empresas, afetando o índice como um todo”, explica.
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Já Paula Zogbi, gerente de research e head de conteúdo da Nomad, avalia que o cenário fiscal e os juros altos continuarão pressionando os ativos de risco domésticos, gerando volatilidade. Nesse contexto, ela recomenda uma postura estratégica, com uma parcela relevante do portfólio dolarizada, para proteger os investimentos e aproveitar oportunidades em mercados globais. Entre as alternativas, ela cita a renda fixa americana, que deve continuar atraente com a manutenção dos juros elevados, e setores como inteligência artificial, que continuam promissores nos Estados Unidos.
Embora o cenário pareça cercado de entraves, Zogbi enxerga oportunidades em políticas econômicas que podem ser adotadas pelo governo Trump, caso confirmadas, incluindo estímulos à indústria e menor tributação corporativa. No Brasil, os especialistas acreditam que uma eventual melhora no cenário fiscal ou político poderia servir como catalisador para a recuperação do mercado, mas reforçam que, no curto prazo, os riscos permanecem elevados. “Podemos ter surpresas positivas com os setores mais perenes da economia, como os que se destacam pela forte geração de caixa, tais como as empresas do setor elétrico, saneamento, minérios e até mesmo financeiro”, elenca Cittadin.
Em contrapartida, o planejador financeiro e especialista em mercado de capitais, Idean Alves, afirma que no próximo ano o mercado espera um crescimento menor e resultados corporativos mais modestos, mas com avanços importantes a ponto de o investidor começar a enxergar sinais de recuperação e oportunidades para apostar no Brasil a longo prazo. “Janeiro deve seguir em compasso de cautela, troca de governo americano, aumento de mais 1% na Selic ao que tudo indica, fiscal ainda gerando ruído. O melhor seria aguardar para entender o desenho do ano, ao invés de pegar a montanha-russa na primeira parada. Ter caixa na renda fixa com liquidez vai trazer segurança ao investidor, rentabilidade, e capacidade de realocação, melhor do que dar um all in [investir todo o capital] e virar torcedor”, diz.
O agronegócio deve apresentar um desempenho estável no Ibovespa, com previsões de safra positiva segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Os especialistas projetam que os frigoríficos devem se beneficiar de novos acordos comerciais e da crescente demanda externa, o que pode impulsionar o crescimento do setor. Além disso, as seguradoras podem continuar a usar os juros elevados para atingir suas metas atuariais, resultando em melhores resultados financeiros.
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Da mesma forma, fundos de pensão devem ter um desempenho mais consistente, já que suas metas frequentemente estão atreladas à Selic alta. Setores voltados para exportação devem continuar a contribuir para o desempenho econômico. No entanto, o acesso ao crédito deverá permanecer limitado, especialmente para setores que dependem fortemente de financiamento, afetando empresas mais dependentes de capital externo.