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Investimentos em cannabis: as opções e riscos de um mercado bilionário

Estudos indicam que o mercado global dos produtos à base de cannabis pode atingir US$ 61 bilhões até 2026

Investimentos em cannabis: as opções e riscos de um mercado bilionário
Brasileiros podem investir no mercado de cannabis por meio de ações no exterior ou aplicando em fundos de índice ou multimercados. (Foto: Envato Elements)
  • Um levantamento feito pela Stake a pedido do E-Investidor mostra que, das 29 empresas do setor de cannabis listadas nas bolsas de valores dos Estados Unidos, apenas uma tem um desempenho positivo em 2022
  • Além das dificuldades em avançar a legislação que regula o setor, o aperto na política monetária nos EUA tem penalizado as ações em bolsa, especialmente as de empresas de crescimento como as de cannabis
  • Mas os especialistas do mercado seguem firmes e otimistas quanto ao potencial da indústria e desses investimentos

Falar de maconha no Brasil pode acender uma discussão polarizada que, muitas vezes, não leva a lugar nenhum. Entre os favoráveis à legalização irrestrita da cannabis e os que a consideram uma “erva do demônio”, a indústria tem conseguido caminhar a passos lentos e oferecer novas soluções farmacêuticas e têxteis feitas a partir da substância.

A comunidade científica, por exemplo, tem se dedicado a comprovar como as substâncias CBD e THC, extraídas da planta, podem ajudar no tratamento de patologias, como epilepsia, demência, fibromialgia, parkinson e até depressão. Em função do potencial médico, isso tem atraído as atenções de empresários em diversos países e elevado o número de companhias com intenção de investir nesse mercado.

A maioria busca estabelecer os modelos de negócio a partir de diferentes usos da cannabis e, assim, aproveitar de um potencial de investimentos bilionário que se mostra maior ano após ano. Segundo dados da consultoria especializada BDSA, o mercado global dos produtos à base de cannabis pode atingir US$ 61 bilhões até 2026.

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Apesar dos entraves de legislação que cerceiam o setor, mesmo no Brasil, um país onde o cultivo e comercialização de cannabis é proibido, já existem opções de investimento disponíveis nas prateleiras. Os brasileiros interessados podem fazer aportes de duas maneiras: aplicando em fundos de investimento ou diretamente nas empresas listadas em bolsas de valores estrangeiras, por meio de ETFs (Exchange Traded Fund).

No Brasil, existem três fundos específicos do setor de cannabis disponíveis. O Trend Cannabis, da XP, investe de maneira passiva no MJ, um dos mais famosos ETF listados nos Estados Unidos. Para investir, a aplicação mínima é de R$ 100 e é cobrada uma taxa de administração de 0,5% ao ano.

Já na Vitreo, duas opções de gestão ativa estão disponíveis ao investidor: o fundo Cannabis Ativo e o Canabidiol. Nos dois é possível comprar cotas por R$ 100, mas as taxas de administração são diferentes, 0,72% ao ano em um e 0,9% em outro, respectivamente.

Luiz Cesta, sócio e head de análise da plataforma de streaming focada no mercado financeiro Monett, explica que os fundos são uma das maneiras mais simples de realizar esse tipo de investimento, mas que existem algumas diferenças entre as opções que o investidor precisa levar em conta. “Existe também a possibilidade de investir diretamente nas empresas no exterior, por meio de ETF. O mais interessante é que, por mais que estejam dentro do mesmo ecossistema de cannabis, existem diversos modelos de negócio para investir”, diz.

Apenas um no positivo

Um levantamento feito pela Stake a pedido do E-Investidor mostra que, das 29 empresas do setor de cannabis listadas nas bolsas de valores dos Estados Unidos, apenas uma tem retorno positivo em 2022: a Marrone Bio Innovations, com alta acumulada de 25,97% até a sexta-feira (13).

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Do lado negativo, é possível ver empresas com mais de 70% de queda acumulada no ano. Nos ETFs, a mesma coisa. Os dois ativos mais famosos, o YOLO e o MJ, têm rentabilidade negativa de 49,3% e 36,5% respectivamente.

Rodrigo Lima, analista de investimentos e editor de conteúdo da Stake, explica que os movimentos de grande desvalorização são comuns no setor. Com exceção de gatilhos capazes de provocar saltos no valor dos ativos, ele destaca que a tendência é que a maioria siga com um desempenho negativo.

“É um ambiente extremamente regulado e ainda em fase inicial”, diz. “A descoberta de usos medicinais viáveis e lucrativos é de uma dificuldade ímpar. Basta lembrar que de todas as drogas que passam na primeira fase de testes do FDA [a Anvisa dos EUA], menos de 10% chega às prateleiras das farmácias e hospitais.”

Existia no mercado uma expectativa de que, com a eleição do democrata Joe Biden à presidência dos Estados Unidos, seriam aprovadas legislações que regulassem – ao contrário de impedir – o desenvolvimento do setor. Mas isso ainda não aconteceu.

Por lá, dois principais projetos de lei aguardam aprovação no Senado americano: o Secure and Fair Enforcement Act (SAFE Banking Act) e o Marijuana Opportunity Reinvestment and Expungement Act (MORE Act). Um tira as amarras que impedem as empresas do setor de integrarem completamente ao sistema financeiro; enquanto o outro vai para o lado da liberação do uso, propondo retirar a cannabis da lei de substâncias controladas no país.

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“Um pedaço dessa má vontade do mercado tem relação com a expectativa de que isso já teria sido aprovado com o Biden na Casa Branca”, afirma George Wachsmann, CIO e sócio fundador da Vitreo.

Além das dificuldades específicas do setor, outra parte do desempenho ruim dos ativos de empresas de cannabis segue uma tendência que afeta a renda variável como um todo.

Desde o início de 2022, uma onda de aversão ao risco causada por diferentes fatores macroeconômicos tomou os mercados, pressionando o desempenho das ações. Nos Estados Unidos, o cenário de investimentos tem exigido ainda mais cautela frente a alterações na política monetária do país, que está subindo os juros em uma tentativa de conter a maior inflação em mais de quarenta anos.

O ambiente de alta nos juros prejudica especialmente as empresas de crescimento como as ligadas à cannabis. “O aumento nas taxas de juros no mundo todo aumenta o custo do endividamento dessas companhias, que, ainda com baixa geração de caixa ou até mesmo sem nenhum produto viável, acabam sendo penalizadas pelo mercado”, diz Lima, analista da Stake.

Tratam-se, portanto, de dois gatilhos em paralelo. Se de um lado o avanço na legislação é fundamental para o crescimento das empresas focadas em cannabis, do outro, a recuperação do setor ainda depende de uma amenizada na incerteza macroeconômica. “Arrisco dizer que se a legislação fosse aprovada, veríamos uma valorização nas ações, mas o mercado está tão machucado com a questão dos juros que não sei se seria uma evolução significativa”, afirma Wachsmann. “Quando o mercado digerir essa alta nos juros, as ações do setor vão reagir mesmo sem a aprovação de uma legislação”, afirma.

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Como os fundos de investimentos brasileiros investem ou replicam as ações americanas, os desempenhos em 2022 também seguem no vermelho. Na XP, o Trend Cannabis cai 35,5% no ano e 64,5% no acumulado dos últimos 12 meses. Na Vitreo, o Canabidiol tem queda de 49,5% no ano e 65,8% em 12 meses; enquanto o Cannabis Ativo cai 49% e 62,6%, respectivamente.

Tese de investimento segue positiva

Olhando somente o desempenho dos ativos no último ano, o investimento em cannabis pode parecer uma roubada. Mas os especialistas seguem firmes e otimistas quanto ao potencial da indústria. A New Frontier Data, uma empresa de análise independente de dados, estima que o mercado de cannabis movimente cerca de US$ 45 bilhões somente nos Estados Unidos até 2025.

“Aos poucos isso vai se desenvolvendo na América do Norte, mas alguns continentes seguem praticamente fechados. O mercado asiático, o africano e até o europeu ainda engatinham em relação às regulamentações. Tem muito espaço para expansão”, pontua Cesta, da Monett.

À medida em que a ciência avança, deixando cada vez mais claro os benefícios da utilização dos canabinóides em diferentes funções, a tendência é que haja também uma pressão da própria população para a aprovação de leis que permitam o aproveitamento da substância. E isso também ajudaria o mercado a crescer exponencialmente.

“Nos EUA, já deixou de ser uma história que depende de um governo democrata ou republicano para avançar. A tese está mais robusta do que já era e isso não tem volta, a questão agora é ‘quando’, e não ‘se’”, diz o CIO da Vitreo, George Wachsmann.

Por causa disso, o momento de queda nos ativos pode ser, na verdade, uma oportunidade para quem acredita na tese dos investimentos em cannabis e quer comprar posições no setor a preços mais baixos. Wachsmann segue confiante: “Quem já entrou no setor, me dá a mão e confia que isso pode melhorar. Quem não entrou, é como se estivesse em liquidação. É um momento melhor ainda”, diz.

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Dada a volatilidade dos ativos, a recomendação é alocar apenas uma parte da carteira nesse setor e com foco no longo prazo. “O momento atual é um bom para se investir, não só nos fundos, mas nos ETFs lá fora dado os preços bastante atrativos”, afirma Cesta.

Brasil está muito atrás dos países desenvolvidos

Os brasileiros interessados nos investimentos em cannabis precisam recorrer aos fundos de investimentos ou ETFs, porque, no Brasil, o setor segue inteiramente proibido.

O mais próximo que chegamos de uma legislação mais flexível foi em 2021, quando o projeto de Lei 399/15 foi aprovado na comissão especial da Câmara dos Deputados que analisou o tema. O texto propunha uma regulamentação no plantio de cânhamo industrial para fins medicinais e a comercialização de medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta.

O cânhamo industrial é uma derivação da Cannabis Sativa com baixo teor de THC, a substância entorpecente do canabinóide, que costuma ser utilizado para todos os bens de saúde, higiene e beleza. O plantio já é legalizado em países como os Estados Unidos, Canadá e alguns europeus. Depois de aprovado na comissão especial, o PL 399/2015 ainda não entrou em votação no plenário.

Atualmente, a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) permite que consumidores brasileiros tenham acesso a medicamentos com base em canabinóides desde que sob prescrição médica. Antes, esses produtos eram importados diretamente pelos pacientes, mas, desde 2019, a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 327/2019 permite que farmácias e drogarias do País comercializem esses remédios.

“Já é um avanço em relação à situação anterior onde nem isso era possível”, diz José Bacellar, fundador e CEO da farmacêutica VerdeMed. A startup de cannabis medicinal foi a terceira a conseguir a autorização sanitária da Anvisa para comercializar produtos de CBD nas farmácias do País. A expectativa da empresa é que, somente em 2022, os medicamentos de cannabis comprados no Brasil por meio da RDC alcancem a casa de R$ 100 milhões.

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Apesar disso, para Bacellar, os entraves na legislação impedem que o setor se desenvolva para outras áreas de grande potencial, como produtos de bem-estar e beleza, afastando o País de todo o retorno econômico que essa indústria poderia gerar. O relatório “Impacto Econômico da Cannabis”, produzido pela Kaya Mind em junho de 2021, apontou que, somados, o uso medicinal, industrial e recreativo da cannabis poderia movimentar R$ 26,1 bilhões na economia do Brasil.

“O grande negócio da cannabis medicinal é quando se retira a necessidade da receita médica e a substância passa a ser tratada como um produto de saúde e bem-estar”, diz Bacellar. Para isso, é preciso derrubar alguns preconceitos que a discussão ainda carrega.

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