- A Opep+ anunciou no início de abril uma redução de 1 milhão de barris ao dia na sua produção de petróleo
- O movimento serve para manter os preços da commodity elevados, mas tem alguns efeitos colaterais como aumento dos combustíveis e pressão inflacionária
- Isso vai afetar a Vale, ainda que indiretamente? Explicamos o que precisa ficar no radar
No início do mês, no primeiro domingo de abril, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e Aliados (Opep+) anunciou mais um corte de cerca de um milhão de barris por dia na sua produção de petróleo. É a segunda decisão em um período de seis meses do cartel, que, em outubro do ano passado, já havia pausado a produção da commodity em dois milhões de barris por dia.
Leia também
O movimento da Opep+ visa a manutenção dos preços elevados do Brent do petróleo em um momento de desaceleração da economia global e possível redução da demanda. A notícia é boa para as empresas do setor, mas acende dois alertas no mercado: um gatilho a mais na inflação e o aumento dos custos para as companhias exportadoras.
Dois pontos que devem ficar no radar para quem tem as ações da mineradora Vale (VALE3) na carteira.
Publicidade
O primeiro cenário é uma implicação apenas indireta ao modelo de negócio da Vale. A China, além de ser a maior compradora de minério de ferro do mundo, também é uma das maiores importadoras de petróleo do planeta. Se a alta do petróleo levar a um aumento da inflação, pode acarretar em uma diminuição do consumo, freando o crescimento do país do qual a mineradora brasileira é muito dependente.
A questão é que ainda não dá para dizer se o novo corte de produção anunciado pela Opep+ será suficiente para fazer frente à perspectiva de desaceleração da economia global, que tende a botar um freio na elevação dos preços do petróleo.
“É relevante? É. Mas vai agravar a inflação da China? Teremos que ver muitos outros componentes próprios da dinâmica chinesa”, diz Ilan Arbetman, analista de equity research da Ativa.
Um dos principais componentes a que o analista se refere são os estímulos concedidos pelo governo chinês para reaquecer a economia do país em 2023 após o fim das restrições adotadas durante a pandemia da covid-19.
Publicidade
A perspectiva de reabertura da China faz as ação da Vale ser “figurinha repetida” nas carteiras recomendadas de corretoras neste início de ano, como contamos nesta reportagem. Um otimismo que ainda impera, mesmo após o novo choque da Opep+.
“Deve-se monitorar os índices de atividade chinês, como inflação, produção industrial e balança comercial, mas o mercado ainda está otimista com as ações da mineradora”, destaca André Fernandes, head de renda variável e sócio da A7 Capital. “É uma empresa bem consolidada no seu setor, com uma saúde financeira robusta e uma boa geradora de caixa, além de ser uma boa pagadora de dividendos.”
O segundo ponto, esse que pode ter um impacto mais direto não só na Vale, mas em todas as companhias brasileiras que dependem da exportação, é a possibilidade de alta do preço do combustível ocasionada pela restrição de oferta da Opep+. “O frete marítimo naturalmente vai subir porque o petróleo está mais caro, podendo elevar o custo all in da companhia” explica Renato Chanes, analista da Ágora Investimentos.
Para reverter esse cenário, a Vale precisaria melhorar a sua eficiência, dado que está localizada mais distante da China do que suas principais concorrentes – as australianas BHP e Rio Tinto – e por isso gasta mais com o frete do minério. O cenário, no entanto, não preocupa o analista da Ágora.
Publicidade
“Isso dá mais atenção da empresa ao controle de custos, mas a Vale já é, se não a mais, uma das mineradoras mais eficientes do mundo. Eu, sinceramente, não vejo impactos de ordem significativa”, destaca Chanes.
Na Ágora, a VALE3 é considerada “top pick” do setor, com recomendação de compra e preço-alvo de R$ 120 por ação.
Uma preocupação a mais
Ainda neste mês de abril, a Genial Investimentos publicou um relatório em que cortava o preço-alvo das ações da Vale de R$ 105 para R$ 89. Mas o motivo não tinha a ver com as discussões sobre preço de commodities e inflação.
Na visão da corretora, a mineradora deve passar por um aumento das provisões relacionadas aos rompimentos de barragem em Mariana e Brumadinho, ambas em Minas Gerais. Em 2015 e 2019, respectivamente, dois reservatórios da companhia se romperam, destruindo os municípios e deixando cerca de 290 mortos ao todo.
Leia também: Por que o mercado ainda ignora tragédias ambientais?
Publicidade
Desde então, a Vale foi obrigada a arcar com alguns acordos de reparação aos impactos ambientais e humanos causados pelos episódios. A ressalva da Genial é que a mineradora ainda aguarda uma decisão da Justiça que envolve a Fundação Renova – criada pela Vale em parceria com a BHP para intermediar a negociação com a Justiça –, o governo do Estado de Minas Gerais, o governo federal, o Ministério Público, o Tribunal de Contas do Estado e órgãos de fiscalização ambiental como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A expectativa inicial era de que a decisão saísse até dezembro de 2022, mas, até agora, não houve nenhum avanço. Isso preocupa a Genial que, no relatório, destaca que “notícia boa costuma sair rápido”.
O receio é de que a demora seja um sinal de que a Vale esteja com dificuldades de negociar um valor que seja próximo daquilo que ela inicialmente estava disposta a pagar, significando um aumento nas provisões da companhia.
A estimativa é de 21% a mais de gastos com acordos neste ano do que a corretora previa no relatório anterior, um montante que deve chegar a US$ 2,3 bilhões. Por isso, a recomendação da casa para VALE3 segue neutra.
Publicidade