Uma das razões para o otimismo com a empresa vem da evolução de seus resultados financeiros, um alento para o mercado. A Cogna encerrou o primeiro trimestre de 2025 com lucro líquido de R$ 95,1 milhões, revertendo, assim, o prejuízo de R$ 8,5 milhões apurado em igual intervalo do ano passado. A companhia também registrou alta de 1.486,1% na geração de caixa na comparação anual. O refinamento dos resultados da Kroton e da Saber, que mostra mais eficiência nas despesas operacionais, justifica os números.
Para Raphael Elage, analista da XP Investimentos, além dos bons frutos vistos neste ano, a ação da Cogna indicava desconto nos preços, o que acabou impulsionando o ativo. “O preço do papel também influenciou, pois a negociação no mercado estava barata em relação aos números entregues”, argumenta.
Os 3 fatores que determinam o futuro da Cogna
Mais Médicos III: impacto potencial nos lucros da Cogna
O primeiro fator vem da criação de novas turmas de medicina pelo programa Mais Médicos. A iniciativa visa elevar a média nacional para 3,3 médicos por mil habitantes. Para atingir essa meta, a medida busca ampliar as graduações disponíveis no País, formando mais profissionais. Universidades privadas participam desse processo e abrem novas vagas no mercado, beneficiando empresas do setor — já que se trata de um curso com baixa evasão e mensalidades médias elevadas, o que garante receitas mais previsíveis.
No início de abril, o CEO da Cogna, Roberto Valétrio, disse que a empresa fez oito inscrições no programa e espera conquistar pelo menos metade delas. (Veja detalhes aqui) Em nota enviada ao E-Investidor, a companhia afirma que aguarda a definição do Ministério da Educação (MEC), prevista para outubro de 2025, para ter uma visão mais clara sobre o impacto financeiro e operacional das inscrições.
Na visão dos analistas do BTG Pactual, caso a empresa arremate todas as vagas inscritas no Mais Médicos III, o seu preço justo pode ser alterado. “Essa incerteza setorial deve mexer com os papéis da empresa. Por isso, recomendamos que os investidores monitorem esse ponto”, relatam Samuel Alves e Yan Cesquim.
Gianluca Di Matina, da gestora Hike Capital, pressupõe que cada vaga do curso de medicina gere inicialmente uma receita incremental anual entre R$ 80 mil e R$ 120 mil, considerando mensalidades médias de R$ 12 mil a 15 mil. “Se a Cogna conquistar 500 vagas, isso pode significar R$ 40 a R$ 60 milhões por ano de receita líquida a mais para a empresa, elevando o lucro e o preço-alvo da ação COGN3”, estima.
Novo marco do EAD: desafio ou oportunidade para a Cogna?
A companhia também enfrenta um impasse em torno da nova norma dos cursos de ensino à distância (EAD). Entre as regras atualizadas, uma determina que os cursos de Medicina, Direito, Enfermagem, Odontologia e Psicologia deverão ser ofertados exclusivamente no formato presencial.
A XP Investimentos avalia que as empresas devem encarar o impasse entre elevar preços de mensalidades ou diminuir margem de lucro, embora o período de transição de três meses permita ajustes graduais. Questionada qual das duas opções escolherá, a Cogna pontuou que ainda não chegou a uma decisão, pois a companhia seguirá acompanhando as dinâmicas do mercado durante os 90 dias concedidos pelo MEC até a entrada em vigor das regras.
Para os analistas do Itaú BBA, o grupo educacional conseguirá fazer o repasse para o consumidor, gerando uma receita adicional de R$ 30 por aluno por mês nos cursos presenciais, representando cerca de 4% do ticket médio. Caso esse adicional não vire receita via repasse na mensalidade do aluno, o valor impactará a linha de custos da companhia, reduzindo a margem de lucro.
“Como a empresa tem se concentrado cada vez mais em oferecer cursos com maior LTV (Lifetime Value, estimativa da receita média que um consumidor gera ao longo do tempo como cliente), acreditamos que conseguirá repassar esse aumento por meio dos preços”, afirmam Vinicius Figueiredo, Lucca Generali Marquezini e Felipe Amancio, que assinam o relatório.
Gianluca Di Matina, especialista em investimentos da Hike Capital, lembra que alguns cursos presenciais, como medicina, têm mais demanda do que oferta de vagas, especialmente em regiões com formação médica escassa. “Nesse cenário, é razoável que a Cogna consiga repassar aumentos acima da inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), sem comprometer as matrículas ou a demanda. Assim, deve preservar ou até ampliar as margens”, aponta.
Fusão entre Cogna e Yduqs pode mudar o valor das ações
O mercado também trabalha com os rumores de uma potencial fusão entre a Cogna e a Yduqs. O E-Investidor questionou as duas empresas sobre o andamento das discussões. A Cogna não citou o assunto e afirmou que está aberta a fusões e aquisições no segundo semestre de 2025, com foco em áreas estratégicas, como inteligência artificial (IA). A Yduqs reforçou que não comenta rumores do mercado.
A XP diz que o investidor deve monitorar o possível negócio ao longo do ano. Caso ele se concretize, a sinergia viria da redução de despesas. “Estimamos uma economia de 30% das despesas gerais e administrativas combinadas, com potencial para criar aproximadamente R$ 4,6 bilhões em valor patrimonial para a Cogna e a Yduqs”, calcula Raphael Elage.
O BTG Pactual entende que a nova empresa advinda da fusão teria força para controlar os preços das mensalidades dos cursos no mercado educacional do País devido ao seu tamanho. “Apesar da justificativa positiva, acreditamos que essa potencial combinação enfrentaria vários desafios, como a aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e o mix mais complexo de negócios da Cogna, o que pode oferecer sinergias limitadas”, explicam Samuel Alves e Yan Cesquim.
Vale a pena comprar ações da Cogna agora?
Diante dos três fatores, a maioria dos bancos consultados pela reportagem indica que o investidor não deve comprar as ações neste momento. A recomendação neutra lidera por uma margem apertada de 4 especialistas contra 3. A cautela vem por parte de Itaú BBA, BTG Pactual, Citi e JPMorgan. “Vemos melhorias na empresa, mas acreditamos que ainda há dúvidas sobre a sustentabilidade dos resultados recentes. Isso porque muitos dos fatores que contribuíram para o desempenho podem não ser tão recorrentes, pois a Cogna deve enfrentar um cenário macroeconômico desafiador, com desaceleração da economia e inflação elevada”, argumentam os especialistas do BTG Pactual.
O banco de investimentos classifica o papel como neutro após estimar alta de 14,07% na comparação entre o preço-alvo de R$ 3 para o fim de 2025 e o fechamento de R$ 2,63 da quarta-feira (23). A estimativa de alta do BTG encontra-se abaixo do ativo considerado livre de risco do mercado, o Certificado de Depósito Interbancário (CDI), com rendimento atual de 14,9% ao ano.
A recomendação de compra vem dos analistas de Bradesco BBI, Goldman Sachs e XP Investimentos. As casas salientam que a indicação serve para o investidor com perfil mais arrojado, visto que os conservadores devem focar em ativos mais seguros. O Goldman Sachs diz que a ação vale a pena devido ao preço atual, que segue descontado e pode ser impulsionado pelos três fatores mencionados anteriormente.
“Acreditamos também que a ação ainda pode se beneficiar do momento positivo dos lucros e das tendências de desalavancagem (redução de dívidas) no restante do ano, o que nos mantém com recomendação de compra”, dizem os especialistas do Sachs. No levantamento, a XP é a corretora que possui a maior perspectiva de alta para a ação, de 59,70% para o fim de 2025. A projeção ocorre na relação entre o preço-alvo de R$ 4,20 e o último fechamento.
Essas estimativas díspares refletem a complexidade das três incertezas que cercam as ações da Cogna (COGN3): o Mais Médicos III, mudanças no EaD e a provável fusão com a Yduqs. Esses três pontos podem redefinir o valor do ativo na Bolsa, gerando lacunas que até podem deixar o brilho do papel no acumulado do ano ainda mais vistoso.