

Dois meses após a sua estreia na Bolsa, as ações da Automob (AMOB3) têm vivido intensos altos e baixos nos pregões. Os papéis frequentemente figuram entre as maiores quedas ou maiores valorizações do Ibovespa – às vezes, em um mesmo dia. O saldo final de 2025 até agora, no entanto, é negativo: uma perda de 23,53%, a segunda pior performance entre as empresas do índice da B3, na frente apenas das ações da BRF (BRFS3), que cedem 26,14% no período.
Na última sexta-feira (14), a Automob informou ao mercado que recebeu uma notificação da B3 sobre a cotação das suas ações, que vêm sendo negociadas abaixo de R$ 1 desde que estrearam na Bolsa brasileira, em dezembro de 2024. Diante disso, a companhia foi orientada a apresentar um plano para elevar o valor de seus papéis.
Em resposta à notificação, a empresa disse que pretende realizar uma reunião do Conselho de Administração até 25 de março para deliberar sobre a proposta de grupamento de ações, que consiste em “juntar” vários papéis em um só para aumentar o preço unitário. Empresas como Casas Bahia (BHIA3), Magazine Luiza (MGLU3) e Americanas (AMER3) chegaram a realizar essa operação nos últimos anos.
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Depois da reunião do Conselho, o plano será submetido à avaliação dos acionistas reunidos na Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária da companhia (AGOE), prevista para acontecer em 25 de abril. A empresa pondera, no entanto, que o cronograma tem caráter preliminar e, portanto, está sujeito a ajustes. A proporção do grupamento ainda deve ser definida.
Operando atualmente a R$ 0,26, as ações da Automob são as de menor valor do Ibovespa hoje, o que levanta dúvidas se os papéis poderão continuar listados no índice. Daniel Nogueira, coordenador de distribuição da InvestSmart XP, explica que empresas que negociam por 30 pregões consecutivos abaixo de R$ 1 são notificadas pela B3 e precisam deixar claro quais movimentos serão feitos para operar acima desse preço.
Algumas soluções possíveis são realizar o grupamento de ações ou então fazer recompras de ações, com o objetivo de reduzir o número de papéis disponíveis para elevar o valor dos ativos. “O prazo é de até 6 meses para regularização e, se esse não for o caso, a empresa pode ser rebaixada para segmentos menos exigentes da B3 ou até ter seu registro cancelado”, destaca Nogueira.
Vale lembrar que a empresa passou a integrar o Ibovespa devido à sua origem – ela nasceu de um rearranjo societário dos negócios da Vamos (VAMO3), que já fazia parte da principal referência da B3.
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A estreia da AMOB3 na Bolsa ocorreu em 16 de dezembro de 2024. A mudança operacional, contudo, foi anunciada no fim de setembro, visando deixar com a Vamos somente a locação de caminhões. Então, a atividade de comercialização de caminhões, ônibus, máquinas e equipamentos, assim como a parte de comercialização de veículos leves, peças, acessórios, financiamentos e corretagem de seguros, ficou sob a responsabilidade da Automob.
Com essa reestruturação, a empresa tornou-se a quarta companhia operacional listada da holding do setor de logística Simpar (SIMH3), juntando-se à JSL (JSLG3), Movida (MOVI3) e à própria Vamos.
Ações da Automob passam por forte volatilidade
Só na primeira semana de fevereiro, as ações AMOB3 tombaram 19,35%. No dia 10 deste mês, o pregão foi novamente de fortes emoções, com os papéis chegando a cair 4% no começo da sessão, mas depois fechando com uma valorização de 16%. Nesta quinta-feira (20), os papéis encerraram o pregão com recuo de 3,7%, a R$ 0,26.
Tamanha volatilidade tem uma explicação matemática, na visão de analistas. Cotados a menos de R$ 1, o ativo é classificado como penny stock, termo que define papéis cotados na casa dos centavos. Com isso, tende a sofrer grandes oscilações. “O preço nominalmente é pequeno, na casa dos 20 a 30 centavos, então qualquer variação de 1 ou 2 centavos já dá uma porcentagem muito alta”, explica Fábio Chiaparini, analista da Nova Futura Investimentos.
Devido ao valor baixo da ação, o fluxo diário de compradores e vendedores por si só pode mexer com a intensidade na cotação. “Isso ocorre não necessariamente motivado por algum fundamento”, afirma Nogueira, da InvestSmart XP, ressaltando que o último fato de destaque mais recente foi a contratação do novo diretor de Relações com Investidores (RI) da empresa, Antonio da Silva Barreto Junior.
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Outro problema que tem afetado as ações é a baixa liquidez. Chrystian Matias, analista da Levante Inside Corp, ressalta que os papéis tiveram uma média diária de negócios um pouco superior a R$ 6 milhões nos últimos 30 dias, um valor relativamente baixo. “Em mercados com volumes de negociação reduzidos, qualquer movimento mais expressivo de compra ou venda pode impactar o book de ofertas (ferramenta do mercado que apresenta todas as ofertas de um ativo), gerando pressões nos preços”, diz.
O fato de que a empresa estreou recentemente na Bolsa de Valores também complica a cotação dos papéis. Na avaliação de João Daronco, analista da Suno Research, a variação ocorre enquanto os investidores ainda estão tentando encontrar um certo equilíbrio na questão de preço. “Conforme as operações forem amadurecendo dentro da companhia, eu entendo que a tendência é que ocorra uma estabilização um pouco maior nessas cotações”, destaca.
O que faz as ações tombarem mais de 23% no ano?
Um dos pontos que pesa contra as ações da Automob é a alta de juros. Em sua reunião mas recente, o Comitê de Política Monetária (Copom) elevou a Selic para 13,25% ao ano e já sinalizou um novo aumento de 1 ponto percentual no encontro de março. “A empresa, além de ser muito alavancada, está dentro de um mercado que é bastante sensível à taxa de juros. Então, qualquer variação na Selic impacta bastante o preço das ações”, sinaliza Daronco, da Suno Research.
Os papéis da companhia têm seguido um caminho diferente dos ativos das demais empresas do grupo Simpar: enquanto a JSL avançou mais de 4% no ano, a Movida já registrou mais de 5% de valorização. A própria holding superou a Automob, com uma alta acima de 2,28% no acumulado do ano. A única que também tem queda em 2025 é a Vamos, mas em um patamar menor, de 1,89%.
Matias, da Levante Inside Corp, não enxerga grandes mudanças na dinâmica da indústria automotiva que justifiquem essa discrepância de desempenho. “Acreditamos que o movimento reflete uma correção do mercado, moderando o otimismo inicial após as primeiras altas em 2024. Desde a estreia, o desempenho dos papéis parece acompanhar um processo de assimilação por parte dos investidores e analistas, que vão se familiarizando com a tese”, afirma.
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O analista também acredita que queda das ações da Automob reflete um movimento de realocação por parte dos investidores. Agora que têm a liberdade de escolher entre manter os papéis VAMO3 e AMOB3 ou focar em apenas um deles, alguns podem estar se desfazendo da Automob.
“Havia investidores interessados exclusivamente no segmento de locação de veículos pesados e, com a possibilidade de concentrar suas posições nesse negócio menos volátil, muitos podem ter optado por vender as ações da Automob e manter apenas a Vamos em seus portfólios”, explica.
Vale se arriscar nas ações da Automob?
Os analistas são unânimes em dizer que os papéis da empresa trazem um grande risco. A Levante Inside Corp, por enquanto, opta por não cobrir as ações e, portanto, não apresenta uma posição definitiva sobre o papel. A casa entende, porém, que o seu setor de atuação envolve mais inseguranças do que o da Vamos.
“Destacamos que, sem dúvida, trata-se de uma tese de risco mais elevado. O segmento de concessionárias, que envolve a venda de bens de capital e automóveis, apresenta uma volatilidade intrínseca maior em comparação ao setor de locação de caminhões, por exemplo, que é sustentado por receitas mais previsíveis provenientes de contratos de longo prazo”, diz Matias.
Nogueira, da InvestSmart XP, entende que a empresa é muito nova para que seja emitido algum tipo de recomendação, afinal, existem poucos dados para análise e um histórico incipiente para aplicar modelos. Os resultados do quarto trimestre de 2025, a serem divulgados no fim de março, podem trazer mais clareza, mas ainda não o bastante. “Ninguém toma grandes decisões baseadas em um trimestre único de resultados, o risco é mais alto em teses de alocação que possuem menos dados históricos para analisar”, pontua.
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Já para Chiaparini, da Nova Futura Investimentos, não há vantagem em investir em um papel com liquidez tão baixa. O analista também alerta que, caso a ação caia abaixo de sua mínima histórica de R$ 0,24, ela pode iniciar uma tendência de desvalorização contínua. “Não vejo uma boa oportunidade de compra. Tem papel muito mais fácil para acessar e ganhar dinheiro do que assumir risco em um ativo como a Automob, que segue em queda”, finaliza.