Segundo comunicado publicado nesta quarta-feira (28), a empresa disse que obteve um financiamento Debtor-in-Possession Financing (DIP), que se refere a uma linha de financiamento para manter as operações da companhia durante o processo, de aproximadamente US$ 1,6 bilhão, obtido de parceiros financeiros, que será usado para refinanciar certas dívidas existentes e prover cerca de US$ 670 milhões em nova liquidez.
Ao final do processo de recuperação judicial da Azul, está prevista a amortização do DIP com os recursos de uma oferta de subscrição de ações de até US$ 650 milhões, com garantia firme dos referidos acionistas. Para Artur Horta, especialista em investimentos da GTF Capital, o principal fator que deve preocupar o investidor é a diluição na participação acionária da companhia.
Segundo ele, a Azul já passou por um processo de reestruturação com os credores no qual a posição acionária do investidor poderia ser diluída em até 95%. Todavia, esse processo deu errado e a diluição não se concretizou. “Com a entrada na recuperação judicial, isso tende a ficar pior, com a possibilidade para a diluição chegar a 99%”, disse Horta.
Essa diluição viria da oferta de subscrição de ações de até US$ 650 milhões, com a nova emissão de ativos, os minoritários teriam seu percentual de participação reduzido. Bruno Carlos de Souza, CEO da consultoria SOUZAMAAS, a diluição ainda depende dos termos finais da capitalização e dos valores efetivamente aportados, mas com base nos comunicados até agora, é razoável esperar uma diluição significativa.
“Se considerarmos o aporte potencial de até US$ 1 bilhão, somado à conversão de parte da dívida em ações, o cenário pode ser comparável ao que vimos na LATAM durante sua saída do Chapter 11, onde os acionistas minoritários ficaram com menos de 10% do capital total após a reestruturação”, estima Souza. Ou seja, cerca de 90% da participação acionária seria perdida.
Acilio Marinello, sócio fundador da Essentia Consulting, complementa que a média da diluição dos acionistas em empresas do setor aéreo em recuperação judicial é de 55% a 70%. Ele usa casos no mercado internacional para comparar com a empresa aérea brasileira. No exemplo mais drástico, a Avianca foi a que mais penalizou o minoritário. “A Avianca entrou com o processo e teve um dos piores desempenhos, com a diluição chegando a 80%. Ou seja, a empresa quase extinguiu a posição dos acionistas”, diz Marinello.
Fusão da Azul com a Gol está cancelada?
Os analistas dizem que fusão entre a Azul e Gol vai demorar mais que o estimado pelo mercado no começo do ano. Segundo Bruno Carlos de Souza, da consultoria Souzamaas, a fusão entre as empresas está congelada, pois a prioridade no momento é a saída da Gol da recuperação, que deve acontecer em junho e a melhora da Azul, que acabou de negociar sua entrada no processo de RJ.
“Uma fusão desse porte exigiria não só uma posição financeira mais estável das duas companhias, mas também a aprovação de órgãos reguladores, como o CADE e autoridades concorrenciais internacionais. Mesmo em um cenário otimista, dificilmente algo concreto aconteceria antes de 12 a 18 meses”, diz Souza.
Artur Horta, da GTF Capital, compartilha da mesma visão e estima que a fusão entre a Azul com a Gol deve demorar o mesmo tempo por causa dessa reestruturação da aérea. Marinello, da Essentia Consulting, afirma que a fusão pode caminhar para outro lado, principalmente após o aporte de até US$ 300 milhões por parte da United Airlines e da American Airlines.
“A entrada dessas empresas nesse momento abre possibilidade de compra da Azul pela United Airlines e American Airlines. Caso isso se concretize, a Gol pode se questionar sobre as vantagens de se juntar com uma empresa que terá como controladores duas empresas americanas. Então, o anúncio dessa entrada mostra uma possível mudança na rota da empresa”, diz Marinello.
Como a Azul chegou na recuperação judicial?
Os analistas dizem que a entrada da Azul na recuperação judicial não foi por acaso. A aérea passou por quatro anos muito delicados por causa da pandemia da Covid-19, o que gerou uma sequência de prejuízos bilionários. Em 2020, a companhia reportou prejuízo líquido de R$ 10,17 bilhões. Em 2021 o prejuízo foi de R$ 4,7 bilhões. No ano seguinte, R$ 1,37 bilhão. Em 2023 o número foi negativo em R$ 700,3 milhões. No ano passado, a empresa teve prejuízo de R$ 8,23 bilhões.
Os especialistas dizem que, para a empresa reverter essa situação, ela precisa de tempo e a saída da recuperação seria já um primeiro indício de melhora. Horta, da GTF Capital, diz que a empresa pagava R$ 50 milhões por ano em dívida em 2019. Em 2024, ela pagou R$ 1,6 bilhão em juros. Segundo ele, a empresa cresce em termos de faturamento e tem feito iniciativas para controlar custos.
“A Azul tem um bom resultado operacional com boas margens. O problema é a linha de despesas financeiras dos balanços. A aérea não tem tamanho para conseguir pagar a dívida adquirida por causa da pandemia. Então, por mais que ela tenha bons indicadores operacionais, ela não gera caixa suficiente para pagar esse juro bilionário no ano”, argumenta Horta.
Bruno Carlos de Souza, da Souzamaas, diz que a empresa também depende de outros fatores externos para voltar a dar lucro, como a estabilidade do dólar e dos preços do combustível, os quais são dois fatores que impactam os maiores custos da operação. “Há também a necessidade de recuperação da demanda doméstica e internacional, que permita repassar preços sem sacrificar a taxa de ocupação”, explica.
O que o investidor deve fazer com as ações da Azul?
Ou seja, mesmo com a saída da recuperação judicial da Azul, há uma longa viagem para a empresa fazer. Em outras palavras, a aérea depende da melhoria do cenário macroeconômico, tornando o papel arriscado e complicado. Justamente por causa disso, os analistas dizem que o melhor é para os investidores moderados e conservadores ficarem de fora do papel.
Marinello, da Essentia Consulting, diz o segmento é um ambiente de altíssima volatilidade e serve para pessoas que possuem um perfil muito arrojado e sempre com uma expectativa de ter ganhos a longo prazo. “Para ter ganhos especulativamente, de fazer day trade ou ganhos a curto prazo, é um ambiente extremamente volátil, muito difícil de você conseguir acertar o momento de entrar e sair com lucro”, diz Marinello ao indicar que investidores moderados e conservadores não devem comprar o ativo.
Souza, da consultoria Siuzamaas, diz que a ação está sendo negociada abaixo do seu valor patrimonial ajustado, o que pode fazer a pessoa pensar que o papel é uma boa opção. No entanto, entrar nesse momento só faz sentido se o foco for especulativo. Caso o investidor queira aportar para o longo prazo, ele deve estar atento à desvantagem da diluição e a volatilidade do mercado com o ativo.
Enquanto os especialistas anteriores dizem que a ação AZUL4 pode ser atraente para quem não possui receios de perder dinheiro (investidor arrojado), Horta diz que o papel não vale a pena nem para quem possui muito apetite ao risco. Segundo ele, a diluição do acionista que pode chegar a quase 100% será uma grande desvantagem para o minoritário.
“No cenário atual, teremos vários fundos de investimentos vendendo as ações da Azul, pois boa parte dos fundos passivos e ativos não pode investir em empresas que estão em recuperação judicial. No curto e médio prazo é impossível ter uma visibilidade do que será essa companhia e não temos perspectivas para a ação subir. Por isso, não investiria de forma alguma na Azul (AZUL4)”, conclui Horta.