

As ações da Casas Bahia (BHIA3) passaram por um março agitado. Além da divulgação do balanço trimestral da empresa, o mês também foi marcado pela entrada de um novo acionista relevante e por um salto de 289,06% nos papéis da varejista. Analistas, no entanto, ainda aconselham acompanhar com cautela os ativos, enquanto as grandes casas do mercado mantém recomendação neutra ou de venda.
A BHIA3 começou o mês cotada a R$ 2,65. Agora é negociada a R$ 10,31, mais do que o triplo do preço inicial. Uma peça-chave nesse movimento de valorização foi Rafael Ferri, fundador da GTF Capital, que atingiu uma posição de 5,11% na varejista.
Em entrevista ao E-Investidor, Ferri explicou que o investimento se baseou em um tripé de fatores: preço atrativo do papel, possível parada da alta de juros e aposta na recuperação da empresa. O investidor disse que segue comprando ações da companhia e pretende indicar um conselheiro na Assembleia Geral Ordinária de abril.
Analistas concordam que a entrada de Ferri impulsionou o movimento de alta das ações em março. “Essa movimentação foi muito importante. O mercado, ao ver um investidor pessoa física adquirindo 5% de uma empresa desse porte, ligada ao varejo, em um cenário de entrada de fluxo estrangeiro e possível fim do ciclo de alta de juros, naturalmente volta sua atenção para o papel”, afirma Bruno Cotrim, economista da casa de análise Top Gain.
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O entendimento é de que o investimento de Ferri aumentou o otimismo do mercado em relação à BHIA3. “Houve um efeito psicológico de FOMO – sigla para fear of missing out, que em português significa medo de ficar de fora. Esse fenômeno ocorre quando investidores, ao verem um movimento positivo impulsionado por uma figura relevante como Ferri, correm para comprar as ações na expectativa de uma valorização futura”, destaca Hayson Silva, analista da Nova Futura Investimentos.
A disparada de Casas Bahia pode ser explicada por um princípio econômico fundamental: a lei da oferta e demanda. Quando a procura por um papel aumenta, seu preço tende a subir. “Uma participação de 5,11% significa aproximadamente 4,85 milhões de papéis. Mesmo que o investidor já tivesse metade dessas ações na carteira, ele ainda precisou comprar 2,43 milhões de ações, que é aproximadamente o volume médio diário do momento da compra. Uma aquisição dessa magnitude, especialmente se realizada em um curto espaço de tempo, tende a gerar impacto no preço das ações devido à lei da oferta e demanda”, explica Inácio Alves, analista da Melver.
Outro fator que contribuiu para o salto de 289,06% foi a quantidade de ações alugadas da Casas Bahia, o que favoreceu um movimento conhecido como short squeeze. Ele ocorre quando investidores com posições vendidas (short) desfazem suas apostas na queda do papel e recompram a ação para zerar a posição. Isso provoca uma reação em cadeia: outras pessoas que estão na mesma situação, ao verem seus pares desistirem das posições, fazem o mesmo.
Rafael Ragazi, sócio e analista de ações da Nord Investimentos, afirma que, no começo de março, quase 25% das ações BHIA3 em circulação estavam alugadas. Agora essa fatia já caiu para cerca de 15%. “Isso significa que, a partir do começo do mês, começou a ter uma corrida dos vendidos recomprando suas ações para conseguir zerar a posição e diminuir as perdas”, diz.
O balanço do quarto trimestre
A Casas Bahia apresentou no quarto trimestre de 2024 um prejuízo líquido de R$ 452 milhões, o que representa uma melhora de 54,8% em relação ao prejuízo apurado um ano antes. A receita líquida foi de R$ 7,9 bilhões, crescimento de 7,6% ante o observado no mesmo período de 2023. Já o Ebitda ajustado (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) da empresa somou R$ 640 milhões no quarto trimestre do ano passado, alta anual de 300%.
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Em relatório, a Nord Investimentos comenta que o desempenho do e-commerce foi um dos pontos fracos, com queda anual de 10% no Volume Bruto de Mercadorias (GMV) vendido on-line diretamente pela própria empresa, conhecido como 1P (first-party). No entanto, a recuperação nas lojas físicas e no marketplace ajudou a impulsionar os resultados.
Do lado positivo, a XP Investimentos sinalizou que a rentabilidade foi novamente o destaque, com a margem bruta expandindo 320 pontos-base na comparação anual, refletindo a maior qualidade dos estoques, o mix de produtos e o aumento da penetração de serviços e soluções financeiras.
Na visão de Caroline Sanchez, analista da Levante Inside Corp, o balanço trouxe um sinal importante de que o plano de reestruturação da Casas Bahia iniciado em 2023 começou a mostrar resultados. “Precisamos ser realistas. O prejuízo foi grande, puxado por um custo financeiro alto, e a empresa continua bastante alavancada, o que pressiona o resultado líquido. A companhia ainda tem um caminho considerável pela frente.”
Vale investir nas ações da Casas Bahia?
Apesar da disparada em março, os analistas ouvidos pela reportagem recomendam cautela com as ações da Casas Bahia. “Se o movimento for exclusivamente um short squeeze, ele pode durar enquanto houver pressão de compra e falta de ações disponíveis para recompras. Contudo, a alta pode ser limitada, pois depende do volume de investidores dispostos a continuar comprando e da liquidez do mercado. Normalmente, esses movimentos se estabilizam rapidamente após uma correção”, diz Silva, da Nova Futura.
Sanchez, da Levante, diz que a tese apresenta um risco elevado, apesar de considerar que as ações ainda estão baratas. “Não é porque o papel está descontado que ele se tornou um investimento seguro. Vale lembrar que a varejista está passando por uma reestruturação que se estende há um certo tempo. É um tipo de case que exige paciência e estômago, porque a volatilidade vai continuar”, avalia.
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A analista lembra que a pausa no ciclo de alta da Selic pode ajudar a empresa, melhorando a oferta de crédito para o consumidor e reduzindo o custo de dívida da própria companhia. No entanto, ela acredita que o principal fator para favorecer o desempenho das ações será a capacidade da empresa de sustentar a recuperação operacional nos próximos trimestres. “O mercado parece estar um pouco mais otimista com a tese, mas a consistência da entrega ainda vai ser o fator-chave para definir se essa virada é sustentável ou se é só mais um rali técnico.”
Entre as grandes casas do mercado, Genial Investimentos e BB Investimentos têm recomendações de venda para as ações da varejista, com preços-alvo de R$ 4 e R$ 3,8, respectivamente. De acordo com a Genial, o grande desafio para 2025 permanece sendo a alta alavancagem financeira da empresa. Já o BB entende que o momento exige cautela e, para que suas premissas sejam revistas, as melhorias devem ser consistentes e refletir em lucro para companhia.
Já o BTG Pactual e a XP Investimentos têm recomendações neutras para Casas Bahia. O primeiro, que possui preço-alvo de R$ 3 para BHIA3, mantém essa visão devido à forte concorrência que a empresa enfrenta, com alta exposição a eletrônicos e eletrodomésticos, elevados custos de financiamento e desafios na monetização de créditos tributários.
A XP, por sua vez, tem preço-alvo de R$ 4 para Casas Bahia e acredita que a empresa ainda é pressionada pela alavancagem alta, mesmo tendo apresentado resultados mistos no quarto trimestre, com tendências de crescimento de receita e de rentabilidade.
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