O que este conteúdo fez por você?
- Pandemia do coronavírus acelerou mudança de costumes da sociedade, rumo ao comércio digital. Quem investiu nisso levou vantagem
- Empresas com atuação no mercado externo e receitas dolarizadas também se beneficiaram da desvalorização do real
- Operadoras de saúde com planos populares não tiveram a sinistralidade esperada e ainda podem ganhar novos clientes com a crise
O ano de 2020 entrará para a história como um ano de crise e muitas dificuldades. Apesar disso, algumas empresas vêm conseguindo enfrentar seus desafios e, além de fortalecidas, estão se tornando mais valiosas para o mercado.
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A pedido do E-Investidor, a Economatica fez um levantamento com as 30 empresas listadas na B3 que tiveram os maiores aumentos em seu valor de mercado na crise. Foram comparadas as avaliações de 31 de março, quando o efeito coronavírus já estava precificado, e as da última terça-feira, dia 26 de maio (veja o ranking mais abaixo).
O ranking gerado pelo confronto dos resultados desses dois meses traz algumas empresas que se destacaram. O Magazine Luiza, por exemplo, ultrapassou a marca de R$ 100 bilhões em valor de mercado. É a primeira vez que isso ocorre desde o ingresso da varejista na Bolsa brasileira, em 2011.
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O analista Henrique Esteter, da Guide Investimentos, explica que as empresas que sobressaíram na lista podem ser divididas em dois grupos: aquelas que ganharam valor por terem se recuperado de perdas, e as que passaram a ter uma nova forma de atuar, fazendo com que o investidor as enxergasse sob uma perspectiva diferente.
O primeiro grupo inclui Petrobrás, Vale e AmBev. “Elas estão no ranking não porque cresceram, mas porque sofreram grandes quedas em março. O mercado de petróleo perdeu completamente a lógica e teve negociações com valor negativo”, ele lembra. “O minério de ferro não caiu tanto, mas o papel da Vale chegou a R$ 34, e hoje está em cerca de R$ 50. A AmBev não teve uma retomada das vendas, até porque, com os bares ainda fechados as pessoas consomem menos bebida.”
No segundo grupo, estão empresas com significativa atuação em e-commerce, como B2W, Lojas Americanas, Via Varejo e a própria Magazine Luiza.
“A pandemia do coronavírus acelerou em 5 a 10 anos um processo de mudança de costumes da sociedade, no sentido de passar a consumir pela internet. Essas empresas já investiam no formato de marketplace e, com a mudança de cenário, passaram a ser avaliadas de forma diferente pelo mercado”, diz o analista.
Empresas com maior crescimento de valor de mercado durante a crise | |||||
Empresa | Segmento Bovespa | Valor de mercado em 31/03/20 (R$, em milhões) | Valor de mercado em 27/05/20 (R$, em milhões) | Variação | |
1 | Petrobras | Exploração refino e distribuição | 183.605 | 265.329 | 81.725 |
2 | Magaz Luiza | Eletrodomésticos | 63.139 | 109.081 | 45.942 |
3 | Vale | Minerais metálicos | 221.715 | 259.779 | 38.064 |
4 | B2W Digital | Produtos diversos | 25.115 | 49.184 | 24.069 |
5 | Ambev S/A | Cervejas e refrigerantes | 187.538 | 210.509 | 22.970 |
6 | B3 | Serviços financeiros diversos | 73.370 | 95.217 | 21.847 |
7 | Lojas Americ | Produtos diversos | 27.199 | 44.394 | 17.195 |
8 | Grupo Natura | Produtos de uso pessoal | 30.575 | 46.007 | 15.432 |
9 | Weg | Motores compressores e outros | 70.419 | 85.123 | 14.705 |
10 | Btgp Banco | Bancos | 43.914 | 56.023 | 12.110 |
11 | Intermedica | Serviços médico-hospitalares análises e diagnósticos | 27.114 | 37.632 | 10.518 |
12 | Sabesp | Água e saneamento | 26.732 | 36.663 | 9.931 |
13 | Localiza | Aluguel de carros | 19.737 | 29.343 | 9.606 |
14 | Hapvida | Serviços médico-hospitalares análises e diagnósticos | 31.503 | 40.864 | 9.362 |
15 | Viavarejo | Eletrodomésticos | 6.861 | 15.827 | 8.966 |
16 | Brasil | Bancos | 79.547 | 88.132 | 8.585 |
17 | Petrobras BR | Exploração refino e distribuição | 18.069 | 25.863 | 7.794 |
18 | CPFL Energia | Energia elétrica | 30.961 | 38.727 | 7.766 |
19 | Eletrobras | Energia elétrica | 38.045 | 45.615 | 7.570 |
20 | Braskem | Petroquímicos | 13.947 | 21.491 | 7.544 |
21 | BRF SA | Carnes e derivados | 12.249 | 18.873 | 6.624 |
22 | ItauUnibanco | Bancos | 220.403 | 226.750 | 6.347 |
23 | Bradesco | Bancos | 158.941 | 165.075 | 6.133 |
24 | CCR SA | Exploração de rodovias | 23.695 | 29.694 | 5.999 |
25 | Rumo S.A. | Transporte ferroviário | 30.635 | 36.559 | 5.924 |
26 | Ultrapar | Exploração refino e distribuição | 13.634 | 18.836 | 5.201 |
27 | Lojas Renner | Tecidos vestuário e calçados | 26.593 | 31.530 | 4.937 |
28 | Cosan | Exploração refino e distribuição | 21.012 | 25.902 | 4.890 |
29 | Gerdau | Siderurgia | 16.658 | 21.200 | 4.542 |
30 | Sul America | Seguradoras | 14.170 | 18.506 | 4.336 |
O e-commerce veio para ficar – sorte de quem investiu nele!
Não se trata de uma opinião isolada. Para o chefe de análises da Toro Investimentos, Rafael Panonko, o crescimento do e-commerce na pandemia mostra uma nova tendência do mercado. Ele aposta que o consumo do brasileiro vai decolar no meio digital.
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“É um comportamento que veio para ficar, e as empresas que estão dentro dessa tendência se destacam na lista”, ele comenta. “O Magalu investiu nisso lá atrás, e agora está colhendo os frutos. E outras empresas como Via Varejo e Renner também surfam nessa onda.”
No cenário anterior à pandemia, a maioria dos consumidores preferia ir à loja ou ao shopping e só comprava pela internet se a diferença de preço fosse muito atrativa. “Questões de logística, como o próprio prazo de entrega, pesavam contra a compra online. Mas isso está sendo vencido”, acredita Panonko.
Ele admite que não é fácil ter uma plataforma de e-commerce no Brasil, já que a logística acaba sendo um gargalo. “A primeira coisa que o consumidor vê é o prazo de entrega; se for de 45 dias, ele vai ao shopping. A empresa que tiver excelência na entrega, qualidade e preço vai possibilitar bons ganhos para o investidor.”
A head de equity research da Mauá Capital, Carolina Ujikawa, concorda que as empresas de e-commerce são as grandes vencedoras desta crise. E diz que ainda há muito espaço para crescimento nesse campo.
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“O e-commerce representa 20% do varejo nos EUA, quase 30% na China e apenas 7% no Brasil. Mas a penetração do mobile na nossa população é enorme, maior que em muitos países desenvolvidos”, ela ilustra.
Com a imposição do fechamento do comércio, quem já tinha uma operação digital bem azeitada foi menos prejudicado, caso de B2W, Via Varejo e da própria Magalu.
“A Lojas Americanas detém 62% de participação na B2W, então também se beneficiou com a alta do e-commerce”, observa José Francisco Cataldo, superintendente de research da Ágora Investimentos. “Além disso, os pontos de venda Americanas Express, assemelhados a lojas de conveniência, tiveram o funcionamento autorizado, o que ajudou a empresa a ir bem no período.”
O fenômeno Magazine Luiza
Entre todos os expoentes do comércio eletrônico, a trajetória das ações do Magazine Luiza chamou a atenção pela rápida recuperação. O papel iniciou a crise a R$ 56; em 18 de março, no auge do estresse do mercado, chegou a R$ 28. Hoje, não só recuperou como ultrapassou o valor pré-crise, chegando a R$ 68.
“Apesar de estar em um setor extremamente cíclico, que sofre com as restrições do isolamento, e ter uma rede forte de lojas físicas, ela mostrou força. Vimos como sua cultura e seu modo de se relacionar com o cliente têm poder”, comenta o analista Ilan Arbetman, da Ativa Investimentos. “Ela conseguiu transferir suas vendas físicas para o ambiente virtual muito rápido.”
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A operação digital, que responde por 55% das vendas da empresa, teve um crescimento de notáveis 73% no primeiro trimestre de 2020. Engana-se, porém, quem pensa que esse movimento começou a ser desenhado agora.
“Já são quatro anos seguidos crescendo nessas taxas: 59% em 2017, 65% em 2018, 50% em 2019 e 73% neste ano. É impressionante”, espanta-se Carolina.
A especialista da Mauá Capital destaca, ainda, atributos da cultura da empresa que teriam contribuído para o bom desempenho. “A própria Luiza Trajano tem uma compreensão muito boa da população brasileira, tem noção do que é não ter dinheiro e passar dificuldade. Eles foram rápidos em se conectar com o pequeno empreendedor, captaram esses caras e ofereceram taxas menores”, opina.
A Toro recomendou que seus clientes comprassem ações da Magalu no mês passado. Empresas similares em outros países já estavam vivendo um boom do e-commerce, e a corretora imaginou que isso se repetiria com a varejista brasileira, como de fato ocorreu. Mas, para esses mesmos clientes, hoje a sugestão é de troca.
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“O papel já teve mais de 70% de ganho e ainda gostamos dele. Mas agora estamos buscando outras empresas do mesmo segmento que têm maior upside (potencial de ganho), como Via Varejo, que vem mostrando boa gestão e terá resultados melhores”, diz Rafael Panonko. “É uma estratégia de diversificação para o investidor: reduzir a exposição a Magalu, colocar dinheiro no bolso e comprar outra empresa que não está nesse mesmo momento.”
Desvalorização do real favoreceu algumas empresas
Outras empresas bem situadas na lista da Economatica têm em comum alguma forma de exposição ao dólar. Elas foram favorecidas pela acentuada apreciação do dólar frente ao real nos últimos meses.
“As commodities performaram melhor pela questão de câmbio. Vale e Suzano foram bem por conta da exposição cambial e menor dependência do mercado doméstico”, explica Carolina. “Lá fora a reabertura da economia já começou, e a China é uma grande consumidora dessas commodities”.
“Mais de 85% da receita da Suzano vem do Exterior; na Klabin, são 45%”, diz Ilan Arbetman, da Ativa. “Papel & celulose é um setor do tipo ‘ame-o ou deixe-o’: ou o investidor adora, ou não quer saber dele. Enquanto a maioria dos outros setores sofreu com a crise, esse teve ações resilientes.”
Outras empresas também listadas entre as primeiras dez posições da lista são a Natura, de cosméticos, e a Weg, de motores e geradores. A ação da Natura, que chegou a bater R$ 50 antes da crise, caiu para R$ 24 com a pandemia, mas agora já passa de R$ 38.
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Além de não ter os empecilhos de lojas físicas, já que grande parte da comercialização é executada por revendedoras, o Grupo Natura hoje também engloba as marcas estrangeiras Avon, The Body Shop e Aesop. “A receita pode cair, mas, como tem um alto percentual dolarizado, o câmbio acaba favorecendo”, diz Carolina.
No caso da Weg, além da exposição cambial grande por vender para outros países, a especialista Mauá destaca a boa governança, que ajuda a vencer cenários de crise. “Ela se reinventou: dos motores de geladeira, foi para turbinas eólicas, depois para a indústria solar”, afirma.
Bancos não brilharam na lista
Ações de bancos sempre foram vistas como um porto seguro pelo investidor. Os papéis dos dois maiores bancos privados do País, Itaú e Bradesco, são as ações com maior peso na composição do Ibovespa. Apesar disso, o Itaú não teve valorização significativa no período e o Bradesco aparece em um distante 27º lugar. No top 10, aparece apenas o BTG, que não é um banco de varejo, mas de investimentos.
“A participação do setor no Ibovespa caiu de 23% para 18%. Essa perda de importância no principal índice da Bolsa é relevante”, frisa Arbetman, da Ativa.
Carolina Ujikawa diz que a performance mais tímida dos últimos dois anos tem a ver com o surgimento das fintechs, que causou preocupação nos investidores. “Elas foram vistas como ameaças para as taxas e spreads altos dos bancos”, ela explica. “A queda de quase 24% neste ano está dentro dessa visão mais estrutural. Os bancos não estão mais na moda.”
Para Henrique Esteter, da Guide, outra questão que deixa o investidor receoso são as “pautas-bomba” que tramitam no Senado e prejudicam essas instituições, como a questão da limitação da taxa de juros.
“O Banco do Brasil (13º na lista) deu uma arrancada aquela frase do (ministro da economia) Paulo Guedes na reunião ministerial de 22 de abril (“privatiza essa p…”). Se os bancos estivessem performando melhor, o próprio Ibovespa estaria em patamar superior aos 90 mil pontos”, afirma.
Rafael Panonko, da Toro, reconhece que o Ibovespa subiu e os bancos, não. Apesar desse descolamento, ele diz que os bancos continuam sendo uma boa oportunidade de investimento, principalmente os privados.
“Eles estão em trajetória crescente de lucratividade e terão bons resultados no longo prazo. Quem não tem bancos na carteira deve aproveitar esse momento em que eles estão descontados e comprar agora”, aconselha.
Operadoras de saúde que foram bem, mesmo com a saúde em crise
Quem também se saiu bem na lista elaborada pela Economatica foram as operadoras de saúde Intermédica (10º lugar) e Hapvida (12º lugar). A head de equity research da Mauá Capital explica que, em um primeiro momento, as duas empresas sofreram fortes quedas com o coronavírus, pois se esperava um alto nível de sinistralidade, trazendo prejuízos para as empresas. Mas isso não ocorreu.
“A quantidade de internações e a ocupação de UTIs estão abaixo do inicialmente imaginado. E o medo das pessoas de ir ao hospital e se contaminar está fazendo a sinistralidade cair mais ainda”, ela conta. “Muitos estão preferindo ficar em casa e até adiando cirurgias.”
Outro trunfo dessas empresas é o modelo de operação, que detém plano de saúde, serviço médico e hospital. Enquanto outros players do mercado vivem uma espécie de cabo de guerra, com o plano de saúde tentando reduzir os custos e o hospital querendo elevar a despesa do paciente, esse modelo unificado garante um bom controle de custos. Isso permite repassar a economia para segurado, que paga um tíquete abaixo da média do mercado.
“Muita gente vai migrar dos planos mais caros para o deles”, acredita Juliana. “A renda vai cair e haverá uma adequação do consumo, com escolha de prioridades. As pessoas vão cortar a roupa e o iogurte, mas farão um esforço para manter o plano de saúde e evitar cair no SUS.”