- Segundo a DOC Investimentos, escritório vinculado ao Banco BTG Pactual, há apenas nove companhias presentes no Ibovespa ligadas direta ou indiretamente ao agronegócio
- Os bancos representam o maior percentual da composição no principal índice da Bolsa
- Para especialistas, há grandes players que ainda se mantêm com capital fechado, mas a popularização dos Fiagros deve estimular a entrada dessas empresas na Bolsa
O agronegócio tem um peso importante na economia brasileira. Segundo dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Universidade de São Paulo (USP), o setor representa 27,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Apesar da relevância, o agro tem baixa participação no mundo dos investimentos.
Leia também
As companhias ligadas ao setor representam apenas 10,8% da composição do Ibovespa, enquanto os bancos lideram com quase 20% de representatividade no índice. No entanto, segundo especialistas, os fundos de investimento nas cadeias produtivas agroindustriais (Fiagros) devem facilitar a entrada do agronegócio no mercado financeiro e podem mudar esse cenário.
Na Bolsa de valores brasileira não há um setor específico para as companhias do agronegócio. Para chegar até o percentual de composição do principal índice da B3, a DOC Investimentos, escritório vinculado ao Banco BTG Pactual, selecionou as empresas presentes no Ibovespa, nas quais suas atividades estão direta ou indiretamente ligadas ao agronegócio.
Publicidade
Invista em oportunidades que combinam com seus objetivos. Faça seu cadastro na Ágora Investimentos
A partir desta avaliação, nove companhias foram selecionadas: JBS (JBSS3), BRF (BRFS3), Marfrig (MRFG3), SLC Agrícola (SLCE3), Cosan (CSAN3), Ambev (ABEV3), Klabin (KLBN11) e Suzano (SUZB3). Após esse processo, a plataforma TC/Economatica conseguiu dividir por segmentos a composição do índice. O resultado mostrou que o grupo representa cerca de 10,8% da composição do IBOV e fica atrás apenas dos setores de “exploração, refino e distribuição” e dos “bancos”, que correspondem a 15,24% e 19,6%, respectivamente.
As empresas do agronegócio presentes no Ibovespa:
Nome |
Retorno da ação no acumulado do ano
|
SLC Agricola (SLCE3) | 31,9% |
Minerva (BEEF3) | 23,9% |
JBS (JBSS3) | -11,4% |
Cosan (CSAN3) | -13,2% |
Ambev (ABEV3) | -15,3% |
Suzano (SUZB3) | -16,5% |
Klabin (KLBN11) | -19% |
Marfrig (MRFG3) | -40,2% |
BRF (BRFS3) | -44,8% |
Fonte: Geovano Ceratti, sócio da DOC Investimentos, e Broadcast/*Retorno do acumulado até o dia 20/06/2022 |
Para Felipe Paletta, sócio da Monett, plataforma de investimentos, apesar do setor ser o terceiro com maior representatividade, o percentual ainda é considerado baixo diante da importância do agronegócio para a economia brasileira. “Se a gente for olhar nos últimos 30 anos, o setor foi o único da economia brasileira que apresentou ganhos de produtividade e isso possibilitou uma certa resiliência do PIB brasileiro mesmo diante de tantas dificuldades”, avalia Paletta.
De acordo com os dados da Cepea, o PIB do agronegócio aumentou 8,36% no ano passado. O crescimento foi responsável por expandir a participação do setor no PIB brasileiro para 27,4%, a maior desde 2004 quando a sua representatividade era de 27,53%.
Mas uma das razões para a diferença entre a atuação do agronegócio na economia “real” e no mercado de capitais é que ainda há grandes empresas nacionais e internacionais, como a Cargill, com capital fechado. Segundo Geovano Ceratti, mestre em agronegócio pela Universidade Estadual do Kansas (KSU), nos Estados Unidos, e sócio da DOC Investimentos, esses players buscam outras formas de financiamento sem a necessidade de abrir capital.
Publicidade
A captação de recursos dessas empresas acontece por meio da emissão CRIs, CRAs, debêntures e até por meio de bancos internacionais. “São empresas que ainda não viram a vantagem de abrir capital porque ainda têm o interesse de manter o negócio dentro da família”, explica Ceratti.
No entanto, quando a taxa de juros no Brasil estava a 2% a.a, entre os anos de 2020 e 2021, algumas companhias decidiram seguir em frente em direção ao mercado financeiro e abriram capital na Bolsa de valores. Foi o caso da Boa Safra (SOJA3) que realizou a sua a Oferta Pública de Ações (IPO) no primeiro semestre do ano passado.
Segundo Marino Colpo, CEO da Boa Safra, na época de abertura de capital, o último IPO de uma empresa ligado ao agronegócio tinha acontecido há cerca de 13 anos, o que ilustra ainda mais a distância entre o setor e o mercado financeiro. “Quando fomos fazer o IPO, muitos gestores e bancos de investimentos disseram que o brasileiro e que a Bolsa não gostavam de agro”, relembra Colpo.
No entanto, de acordo com o CEO, com um ano de listagem na Bolsa, o número de acionistas pessoas físicas cresceu expressivamente. No período de lançamento das ações, a Boa Safra contava com 14 mil investidores pessoa física. Já no último mês de abril, esse número chegou ao patamar de 43 mil “sócios”.
Publicidade
“Isso me mostra que o investidor ao contrário do mercado tem um grande interesse pelo agronegócio. Acredito que se deve ao histórico de resiliência do setor (em épocas de crise). O investidor sabe da vantagem competitiva do agronegócio no mercado”, destaca Colpo.
Por isso, Ceratti acredita que a tendência é que novas companhias do setor sigam o mesmo caminho. “Só não está ocorrendo esse processo no atual momento em função da alta taxa de juros. Com a Selic a 13,25% ao ano, o investidor está preferindo investimentos de renda fixa”, avalia.
A importância dos Fiagros
Os fundos de investimento nas cadeias produtivas agroindustriais (Fiagros) tentam replicar o sucesso dos fundos imobiliário (FIIs) e foram disponibilizados em agosto do ano passado na B3. Além de ser mais uma opção de investimento, os analistas acreditam que os Fiagros podem contribuir para a entrada de novos players do agro no mercado de capitais.
Na avaliação de Mucio Mattos, sócio e head de crédito da Vectis, isso pode acontecer porque há uma a perspectiva de popularização dos fundos. Dessa forma, as empresas ligadas ao agronegócio terão acesso a uma estrutura de capital mais adequada para o seu ciclo de negócios. Essa característica vai permitir de forma mais sustentável o crescimento da empresa e, até mesmo, atingir um porte viável para a realização de um IPO.
No entanto, esse não é o único motivo. “Os Fiagros, em geral, nos seus processos de investimentos, devem demandar das empresas uma maior profissionalização e governança, o que por sua vez faz com que as mesmas ao longo do tempo estejam mais aptas a um processo de abertura de capital”, afirma Mattos.
Publicidade
Além disso, a dinâmica do setor será mais conhecida pelos investidores. “Os investidores passarão a conhecer melhor as empresas que serão selecionadas de forma criteriosa pelos gestores e que possuem maior propensão para abertura de capital no futuro”, destaca Mattos.
Como o produto ainda está em fase inicial, Colpo afirma que, neste primeiro momento, os Fiagros devem atender a necessidade de crédito que há dentro do setor. Mas com o amadurecimento e popularização entre os investidores, ele acredita que os fundos devem ser utilizados para o financiamento de outras necessidades do agronegócio. “O Fiagro deve iniciar muito forte no crédito. Hoje, o agricultor e a indústria demandam crédito. Mas em um segundo momento, os Fiagos devem vir muito forte em logística para o agro”, projeta Colpo.
É o caso do fundo híbrido composto por um Fiagro e um CRA lançado pela Boa Safra (SOJA3), em parceria com a Suno, no fim do último mês de abril. A previsão é que produto possa ter um montante inicial de investimento de R$ 100 milhões e rentabilidade de CDI + 3%. Com isso, o fundo deve facilitar o financiamento da compra da semente de soja para os produtores rurais e antecipar o capital de giro para a companhia.
“A gente quer financiar os nossos clientes por meio do Fiagro e os cotistas vão receber os juros da venda a prazo (de semente de sojas) aos nossos clientes”, explica Colpo. O início da venda das cotas aos investidores deve acontecer no início de agosto.
Publicidade