O que este conteúdo fez por você?
- Tesouro Nacional tem caixa suficiente para financiar despesas públicas por sete meses
- Tesouro empregou o equivalente a R$ 340 milhões para recomprar um terço dos títulos em oferta
- Leilões de recompra são raros e ocorrem em crises, como em 2016 no impeachment de Dilma Rousseff, e na pandemia em 2020
Depois do primeiro leilão de recompra de títulos públicos, realizado nesta quarta (18) pelo Tesouro Nacional, a fundadora da Nord Investimentos, Marília Fontes, diz que o governo vai precisar dar o braço a torcer, reconhecer que há um problema fiscal e resolver o problema brasileiro em até sete meses. “Vai acabar o caixa do Tesouro e, quando isso acontecer, não será possível mais financiar a máquina pública e o governo quebra”, diz.
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Os sete meses de caixa citados pela economista referem-se à reserva financeira do Tesouro Nacional, suficiente para financiar despesas públicas por esse período sem novos recursos. O dado é publicado no site do Tesouro, indicando o tempo estimado de autonomia financeira do governo.
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Depois do leilão desta quarta, no entanto, o prazo diminuiu. Isso porque o Tesouro empregou o equivalente a R$ 340 milhões para recomprar um terço dos títulos. Ou seja, ficou com um pouquinho menos de dinheiro no caixa. Essas centenas de milhões, na verdade, representam uma parte ínfima do caixa, mas a dívida pública brasileira tem vencimentos de muito curto prazo.
A reserva de liquidez da dívida pública é uma parte do caixa do Tesouro Nacional destinada exclusivamente ao pagamento da dívida e formada por recursos da emissão de títulos. Em outubro, essa reserva era de R$ 822,42 bilhões, montante suficiente para cobrir cerca de 6,86 meses de vencimentos da dívida pública interna, segundo o Relatório Mensal da Dívida (RMD) do Tesouro. Os meses de janeiro, março e abril de 2025 concentrarão vencimentos estimados em R$ 604,22 bilhões.
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Para quem está de fora, é bom levar a previsão de Marília Fontes a sério. Em junho ela previu que o Tesouro iria começar a fazer esse tipo de leilão, que só acontece em períodos de crise.
Leilões de recompra do Tesouro só ocorrem em crises
Dois meses antes de sua previsão, o governo havia dado o primeiro sinal forte de descaso com o problema fiscal ao enviar ao Congresso o projeto de lei (PLDO) que flexibilizou as metas do arcabouço. A segunda sinalização aconteceu no final de novembro, com o anúncio do pacote de contenção de gastos mal avaliado pelo mercado.
Leilões de recompra são raros e ocorrem em crises, como em 2016 no impeachment de Dilma Rousseff, e na pandemia em 2020. No leilão extraordinário desta semana, o Tesouro recusou a maioria das ofertas, com os investidores oferecendo seus título por um preço maior do que a instituição estaria disposta a pagar.
É um evento muito parecido com os leilões de venda de dólar realizados pelo Banco Central. “Os leilões têm como objetivo oferecer liquidez ao mercado”, resume Marília.
Ela dá o exemplo de uma empresa que precisa adquirir 50 mil lotes de dólar. Num mercado com baixa liquidez (pouca oferta), suas compras consecutivas aumentariam a cotação de forma descontrolada.
A lógica é similar para leilões de títulos públicos. “Um fundo que tem IPCA+ longo entra a mercado para vender os títulos, e estraga o mercado, porque a liquidez está muito baixa, e as taxas vão subindo muito rápido”, diz. Na lógica dos títulos públicos, o preço unitário do papel é inversamente proporcional à taxa. Ou seja, quanto menor o valor, maiores os juros.
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Marília explica que os esforços, tanto do Banco Central, queimando as reservas internacionais, como do Tesouro Nacional, e do caixa da União. São medidas paliativas que não fazem a cotação do dólar o dos juros caírem. Apenas evitam que o mercado fique sobrecarregado em momentos de estresse, proporcionando liquidez.
“A solução definitiva depende de um ajuste fiscal, que ataca a raiz do problema. Sem isso, a situação tende a piorar, mesmo com intervenções pontuais”, diz a especialista prevendo um novo leilão de recompra do Tesouro antes de acabar 2024.
A crise fiscal acontece porque o governo brasileiro gasta mais do que arrecada, criando o déficit. Por exemplo, se arrecada R$ 1 trilhão, mas gasta R$ 1,1 trilhão, ele busca cobrir a diferença com o caixa do Tesouro.
Essa redução na capacidade de pagar as dívidas aumenta o risco de quem empresa dinheiro para o governo, ou seja, quem compra títulos emitidos pelo Tesouro, fazendo esse mercado cobrar mais juros. Em março, a dívida bruta do Brasil subiu para 75,7% do Produto Interno Bruto (PIB), somando R$ 8,35 trilhões em março. “Se a gente gerasse 1% do PIB de superávit primário todo ano, a gente precisaria de 75 anos para pagar integralmente a dívida pública”, diz Marília, dando a medida do problema em décadas.
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